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IBM se reinventa para transformar o Brasil; entenda

Com receita global de US$ 61,9 bilhões, a gigante centenária de tecnologia aposta em Inteligência Artificial (IA), nuvem híbrida e computação quântica para crescer. Operação brasileira é destaque em soluções para instituições financeiras e varejo

Crédito: Silvia Zamboni

Marcelo Braga, presidente da IBM Brasil: "A era quântica está bem aqui e deve ser o somatório de tudo o que já vivemos e estamos vivendo, como nuvem e IA" (Crédito: Silvia Zamboni)

Por Leticia Franco

RESUMO

• Depois de uma trajetória dedicada ao hardware e mais tarde a serviços, a IBM entra numa nova era.
• A empresa norte-americana agora foca em nuvem híbrida e IA para alavancar o portfólio centrado em tecnologia e consultoria
• Brasil tem
papel importante nesse novo momento: IBM está à frente de mais de 400 projetos em nuvem e Inteligência Artificial para empresas nacionais do setor financeiro, varejo, indústrias e telecomunicações
• Área financeira é uma das que mais participam: IBM tem parcerias com BB, Bradesco e Itaú, entre outros players

 

Antes de mergulhar na nova era da IBM, uma das maiores empresas de tecnologia do mundo, é preciso fazer uma breve viagem no tempo. Nem tão breve assim, já que a história da companhia remonta a 1911, ano em que foi fundada — à época, a IBM (International Business Machines Corporation) ainda era a CTR (Computing Tabulating Recording Company). O nome foi alterado em 1924. Suas transformações em 113 anos vão muito além do nome. Durante mais de um século, a IBM armazena grandes feitos e tem papel importante em relevantes transformações do mundo.

Em 1956, o IBM 704 foi programado para jogar damas e aprender com sua experiência, sendo a primeira demonstração de Inteligência Artificial (IA).
Em 1969, os computadores e software da IBM levaram os primeiros homens à lua.
Já em 1997, o supercomputador IBM Deep Blue derrotou o melhor jogador de xadrez da época, Garry Kasparov.
Mas também há percalços nessa viagem, como na reta final do século passado, quando o hardware deixou de ser um bom negócio e a divisão de computadores foi vendida para a Lenovo.
E num passado recente, em 2015, a Big Blue ganhou tons mais escuros com queda no valor de mercado e lucro estagnado.

Enquanto isso, suas maiores rivais cresceram. E a empresa marcada por grandes transformações precisou se transformar para chegar até aqui. Em outubro de 2021, a IBM anunciou a IBM Consulting como nova marca de seu negócio global de serviços profissionais. No mês seguinte, fez um spinoff que deu origem à Kyndryl. Estava definitivamente entrando em uma nova era, agora focada em nuvem híbrida e IA para alavancar o portfólio centrado em tecnologia e consultoria. É assim que a companhia, avaliada em US$ 191,4 bilhões, caminha para um destino ainda mais longevo.

Em 2023, a receita líquida de US$ 61,9 bilhões representou avanço de 2,2% sobre 2022. O lucro líquido chegou a US$ 7,5 bilhões, cerca de 4,6 vezes o lucro do ano anterior. Para continuar em ritmo de crescimento, a veterana tem operações em 175 países, entre eles Brasil, que possui papel importante nesse novo momento.

A IBM Brasil foi a primeira unidade da empresa fora dos Estados Unidos, inaugurada em 1917. Como não poderia ser diferente, a marca da IBM está estampada em grandes feitos no País.
O primeiro computador e o primeiro sistema de grande porte do Brasil, para a Volkswagen, chegaram aqui em 1959.
Em 1965, ajudou a Universidade de São Paulo (USP) em seu primeiro vestibular unificado e na inauguração do Centro de Super Computação na Universidade de Campinas (Unicamp).
Quase 60 anos depois, o objetivo é continuar como protagonista e, dessa vez, sendo parceira dos setores público e privado na transformação digital, guiada por múltiplas nuvens, arquiteturas híbridas e processos orquestrados por IA.

Objetivo agora é atuar como parceira de empresas públicas e privadas para uma transformação digital estruturante, por meio de tecnologia e de consultoria.”
Marcelo Braga presidente da IBM Brasil

Quem lidera a reinvenção da IBM Brasil é Marcelo Braga, profissional que sabe como se reinventar. Quando chegou à IBM em 1998, Braga, que até então tinha perfil técnico voltado para o desenvolvimento de sistemas, precisou se transformar para trabalhar na área de vendas de soluções de dados. “Relutei a aceitar o convite por três meses. Foi minha mãe quem me encorajou, lembrando o tamanho da IBM no mercado”, disse o executivo à DINHEIRO.

Lá se foram 26 anos desde que ele seguiu o conselho de sua mãe. Durante o período, Braga atuou em diferentes funções na empresa, que demandaram conhecimentos em gestão e marketing. Foi vice-presidente das áreas de software, IBM Cloud e vendas. Comanda a operação desde janeiro de 2022. “O profissional de tecnologia precisa entender mais de negócios”, ressaltou.

(Divulgação)

A IBM Brasil esta à frente de mais de 400 projetos em nuvem e Inteligência Artificial para empresas. Foco é transição digital segura e moderna

MATURIDADE

Transformar, reinventar. É inevitável não mencionar os mesmos termos. Na era da transformação digital, que se acelerou com a pandemia de Covid-19 nos últimos anos, a gigante de tecnologia se propõe a ajudar empresas em uma transição mais segura e moderna. No Brasil, a IBM está à frente de mais de 400 projetos em nuvem e Inteligência Artificial para empresas de diversos setores, como financeiro, varejo, industrial e telecomunicações.

Se em 1956 a empresa fez sua primeira demonstração de IA por meio de um jogo de dama, hoje ela atua com a IA tradicional e também com a IA generativa com sua plataforma watsonx, versão lançada em 2023, e já com diversas atualizações de código aberto, produto e ecossistema para impulsionar o uso em negócios em escala.

O mercado é promissor. Segundo pesquisa divulgada pela IBM em março deste ano, 67% das empresas da América Latina aceleraram a implementação de IA nos últimos dois anos. “O mercado brasileiro sai de uma fase de experimento para entrar em um nível de maturidade com o uso de IA, que tem predicados sofisticados”, afirmou Braga.

A adoção de IA é fortemente observada no mercado financeiro nacional, setor que tem se destacado globalmente ao exportar a expertise desenvolvida para as organizações bancárias. É a IBM Watson [supercomputador que usa técnicas de machine e deep learning] que está nos bastidores da Bia, a assistente virtual com Inteligência Artificial do Bradesco, por exemplo. O projeto que começou como uma experiência interna hoje está disponível para os 38 milhões de correntistas do banco, que podem realizar serviços com a ajuda da assistente. Com isso, em 2016, o Bradesco se tornou a primeira empresa no País a treinar o sistema Watson em português. Uma transformação para as duas companhias.

Além disso, a parceria se estende para a IA generativa de watsonx, sendo um dos primeiros clientes da IBM a utilizar a tecnologia no Brasil. Outro projeto é a plataforma E-agro, um marketplace que abrange diferentes segmentos do agronegócio, desenvolvida pelo Inovabra — ambiente de inovação do Bradesco — e a IBM.

Empresa possui mais de 40 data centers pelo mundo e aumenta demanda em nuvem (Crédito:Divulgação)

Ainda no mercado financeiro, a IA generativa da IBM também é utilizada pelo Banco do Brasil com o objetivo de aumentar a eficiência no atendimento ao cliente. Segundo informações da companhia, são 19 milhões de usuários de chatbot pelo WhatsApp mensalmente baseado na watsonx, além de cerca de um milhão de conversas diárias com clientes de forma ininterrupta.

Os exemplos do Bradesco e Banco do Brasil são parte de um ecossistema em desenvolvimento. Isso porque, de acordo com um estudo divulgado pela IBM em junho, 86% das organizações bancárias ao redor do mundo — incluindo Brasil — estão desenvolvendo ou se preparando para entrar em operação com casos de uso de IA generativa.

Há mais setores nacionais envolvidos na jornada digital orientada pela IBM para potencializar os negócios e reduzir custos operacionais. Como é o caso do segmento de beleza. A Natura, um dos maiores players do setor da América Latina, adotou a IBM Turbonomic, plataforma de automação com uso de IA para o gerenciamento de recursos de TI. A tecnologia foi implementada pela ScaleUP Consultoria, parceira da IBM, que atuou diretamente com a empresa nesta transformação do negócio. Em 2023, poucos meses após a adoção da solução, a ferramenta registrou mais de 4,5 mil ações automatizadas e evitou mais de 900 incidentes em TI. O resultado foi uma economia financeira, com ROI [retorno do investimento] superior a 100% nos primeiros meses de utilização.

Além de nuvem e IA, IBM intensifica o desenvolvimento da computação quântica. No Brasil, Bradesco e Itaú já utilizam os recursos (Crédito:Divulgação)

Dentre tantas eras, um dia o céu azul da IBM já foi one stop shop — modelo de negócios que oferece tudo em um único local —, quando atendia os clientes de ponta a ponta, de data centers a gestão. Com sua capacidade de se reinventar com as novas tecnologias de cada geração, um dos principais avanços está ancorado na nuvem, em que a empresa utiliza diferentes plataformas, como a IBM Cloud e a gestão de armazenamento.

Para Álvaro Luiz Massad Martins, professor de tecnologia da informação da FGV EAESP, o atual modelo de negócios da empresa mostra sua velocidade de adaptação. “A IBM acompanha de perto cada inovação e se transforma de forma sustentável. E estamos falando disso na indústria de tecnologia, que muda constantemente”, avaliou. Para fortalecer sua posição no mercado de nuvem híbrida e open source (código aberto), a multinacional comprou a empresa de software Red Hat, em 2019, por US$ 34 bilhões, em uma das maiores aquisições de sua trajetória e da história da indústria tecnológica.

COMPUTAÇÃO QUÂNTICA

Mais uma era? Sim, ao mesmo tempo em que a IBM se desenvolve em IA e cloud, a companhia ingressa em um processo que pode ser classificado como quântico. Em 2016, disponibilizou o primeiro computador quântico na nuvem, o que tem ajudado especialmente na área financeira do Brasil. Enquanto o Bradesco inicia a jornada pós-criptografia quântica com a IBM, o Itaú se une à Quantum Network, plataforma da IBM, para fidelizar clientes e sugerir investimentos.

Para Marcelo Braga, o somatório dos avanços mais recentes resulta na era da utilidade quântica e de supercomputação centrada nela. Se a computação quântica representa o futuro, a IBM não tem outra alternativa, precisa ser rápida. Para o presidente, os ciclos das novas eras serão mais dinâmicos e disruptivos. Em cada uma deles a IBM vai se reinventar para estar presente na transformação do Brasil e do mundo.

Nos bastidores

Natura

(Divulgação)

Gigante do setor de beleza utiliza o IBM Turbonomic para automatizar seus processos internos e avança em redução de custos

Bradesco

(Divulgação)

Segundo maior banco em número de clientes do Brasil, a instituição utiliza IBM Watson e watsonx no atendimento ao cliente

Banco do Brasil

(Divulgação)

A IA generativa da IBM é usada para aumentar eficiência do atendimento ao cliente em diversos canais, incluindo o WhatsApp

ENTREVISTA
Marcelo Braga, presidente da IBM Brasil
“O futuro da tecnologia é rápido e desafiador”

(Silvia Zamboni)

Qual o ritmo da adoção de Inteligência Artificial nos negócios?
Se no passado a Inteligência Artificial era usada na construção de bots, como uma experiência, hoje ela caminha para um nível de maturidade nas empresas e se coloca como uma aliada para resolver os problemas de ponta a ponta de qualquer negócio. Ela é adotada para gerir um ambiente como um todo, reduzir o custo de consumo de nuvem, ter mais produtividade, disponibilidade e também ser mais segura. Resumindo, a IA deixa de ser protagonista para ser participante de cada processo, o que torna tudo mais ágil e dinâmico, auxiliando especialmente nas tomadas de decisão. Acredito que esse comportamento deve ser ainda mais potencializado a curto e médio prazo.

Os recursos de IA e nuvem híbrida estão mais acessíveis?
Ambas as tecnologias podem ser consideradas mais democráticas, visto que antes eram infraestruturas caras que só as grandes corporações e projetos maiores tinham condições de adquirir. Hoje, mais empresas podem pagar para ter acesso. A escala é outra, em vez de poucos conglomerados, a gente abre um mercado para qualquer empresa, startup e universidade. A consultoria permite estar próximo do cliente, do ecossistema como um todo, então leva às últimas versões para perto dos clientes.

E a implementação da computação quântica?
A gente já fala dessa era por aqui. É o próximo passo. A IBM tem uma longa história de avanço da realidade da computação quântica e liderou décadas de pesquisa nessa tecnologia. No Brasil, instituições financeiras já iniciaram suas jornadas de pós-criptografia quântica. O Bradesco é um caso de uso. A era quântica está bem aqui e deve ser o somatório de tudo o que já vivemos e estamos vivendo, como nuvem e IA.

Como a IBM contribui para o avanço do mercado de tecnologia no País?
Nós contribuímos através de dois principais canais. O primeiro é o desenvolvimento de tecnologias para produtos em nossos laboratórios no Rio de Janeiro e em São Paulo. O IBM Research traz proximidade com a academia e o desenvolvimento de novos talentos, algo muito importante para o País. O outro está justamente na jornada digital de empresas que se destacam nos setores econômicos, de finanças, varejo, educação, entre outros. Somos os parceiros do futuro. Dessa vez, contribuímos para que o mercado avance em tecnologia, especialmente em IA, valorizando não só os resultados, mas também os princípios de governabilidade e transparência.

O futuro é…
Muito rápido. As transformações são mais disruptivas que as anteriores e isso tende a aumentar. Se há algum tempo a gente percebia claramente eras de tecnologia, agora elas são mais dinâmicas. E trata-se de um futuro desafiador, que exige uma mudança importante nos negócios, então há a necessidade das linhas empresariais serem mais profundas em tecnologia, porque ela estará presente em diferentes níveis. Outro desafio está sob a ótica de segurança cibernética. Um mundo interconectado, com recursos de open banking e open finance, requer aprimoramento de tecnologias e sobretudo da cultura empresarial para entender a importância de uma transformação digital segura.