Artigo

Defesa do meio ambiente requer ações concretas

O tempo se esgota para o Brasil fazer bonito na COP30. Além de combater os crimes ambientais, o País precisa mostrar que pode liderar a economia verde

Crédito: Divulgação

Marcos Strecker: "O governo federal, que parecia pródigo no tema, vai precisar mostrar mais eficiência e ações concretas, além da exposição de boas intenções ou da pura propaganda" (Crédito: Divulgação)

Por Marcos Strecker

O presidente Lula acertou, desde antes da posse, em priorizar a questão ambiental para seu terceiro mandato. Em novembro de 2022, quando ainda montava sua equipe, compareceu à Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2022 (COP 27), na cidade de Sharm El Sheikh, no Egito. Foi uma sinalização doméstica importante para deixar patente a reversão na política negacionista do governo Bolsonaro, além de um aceno fundamental para a comunidade internacional.

Para o mundo, o Brasil é vital na agenda contra o aquecimento global. A preservação da Amazônia mobiliza outras nações há anos, inclusive com o desembolso de recursos expressivos para ações de combate ao desmatamento. Não é o suficiente, mas demonstra a percepção da posição crucial que o País ocupa. O mandatário soube tirar proveito disso, marcando sua disposição de liderar as pautas ambientais. A reaproximação com Marina Silva, que voltou a ser ministra e é uma autoridade inconteste nos fóruns do exterior, também ajudou a cristalizar a ideia de que o Brasil “estava de volta” (o lema do novo governo). Só que não.

A dura realidade se impôs. As iniciativas para coibir a maré de crimes nas florestas e os dramas que penalizam os povos originários se mostraram, no mínimo, insuficientes. Em janeiro, um ano após o anúncio da operação do governo federal para conter as mortes no território Yanomami, a situação continuava grave, com aumento no número de mortes, de casos de malária e desnutrição. Mais grave foi a reação oficial. Em seguida a essa revelação alarmante, as autoridades deixaram de publicar os dados oficiais. Ainda que os focos de incêndio tenham diminuído na Amazônia, aumentaram no Cerrado, que ultrapassou o “pulmão verde do mundo” nesse ranking vexatório.

Tudo isso culminou no desastre atual. O mês de agosto registrou o pior número de queimadas em 14 anos. As mais de 68 mil ocorrências representaram uma alta de 144% em relação ao mesmo período do ano passado e a quinta maior incidência da série histórica, iniciada em 1998. A fumaça chegou a cobrir 60% do território nacional. Além da alta no fogo, há uma seca histórica com a pior estiagem em 44 anos, confirmada pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden).

As imagens da Amônia em chamas, que valeram uma manchete bombástica no jornal francês “Libération” (“A Amazônia é esfolada viva”), são eloquentes. Minam o “soft power” construído ao longo de décadas pela diplomacia brasileira e aniquilam o discurso oficial. A ambição de o Brasil se tornar uma “potência ambiental” parece ficar no passado, assim com a ideia do “País do futuro”. O governo federal, que parecia pródigo no tema, vai precisar mostrar mais eficiência e ações concretas, além da exposição de boas intenções ou da pura propaganda. Infelizmente parece ser o caso do anúncio da criação da autoridade climática no último dia 19, que ocorreu com o mandatário em meio a uma comitiva superpovoada de ministros em Manaus.

Ao invés de tratar a tragédia como mero resultado de ilícitos ou reação do agrobolsonarismo, será necessário provar que estão sendo revertidos os crimes ambientais, a grilagem, o garimpo ilegal e a disseminação de facções em boa parte do território nacional. O patrimônio ambiental é um ativo do País que continua a ser desperdiçado. Os planos econômicos para o desenvolvimento sustentável ainda são mais acadêmicos do que projetos concretos para impulsionar a economia verde. Ao invés de liderar a transição energética, o Brasil parece impulsionado pela ilusão de virar uma nova Arábia Saudita abastecida com o pré-Sal da margem equatorial – se essa riqueza vier mesmo a se tornar realidade. Enquanto isso, a crise hídrica bate à porta, com a conta de luz subindo e o risco de apagões.

Nos últimos dias, a Europa também está experimentando na pele os efeitos da mudança no clima: inundações históricas estão deixando um rastro de destruição. O Sudeste asiático (cheias) e os EUA (aquecimento e fogo) também estão vivenciando a nova realidade dos eventos climáticos extremos. Seria o momento de o Brasil exercitar sua liderança. Já começou a contagem regressiva para a COP30, que ocorrerá em novembro do próximo ano, no Pará. No atual ritmo, ao invés de brilhar nesse palco global, o País pode se colocar novamente a reboque de uma mundo em transformação.

*Marcos Strecker é jornalista, diretor do Núcleo de Negócios da Editora Três (ISTOÉ DINHEIRO, DINHEIRO RURAL e MOTOR SHOW)