Diversidade no centro da arena ESG

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Ricardo Voltolini: "Centenas de estudos em todo mundo apontam uma clara correlação entre ambientes diversos/inclusivos e empresas mais saudáveis, mais criativas e inovadoras e, portanto, mais lucrativas" (Crédito: Divulgação)

Por Ricardo Voltolini

Ao pedir que Deus o livrasse de uma mulher CEO, em resposta a um seguidor de Instagram, um jovem executivo do setor de educação corporativa não imaginou que estivesse abrindo a porta do seu inferno astral. Em sua visão machista, salvo raras exceções, as mulheres se masculinizam quando se tornam CEOs, deixando de lado filhos, marido e lar. Ser CEO, segundo sua perspectiva sexista, representa desperdício de energia feminina.

O executivo experimentou na pele, só que às avessas, os efeitos rápidos da popularidade que o tem ajudado a vender cursos nas redes sociais. Sua declaração caiu como uma bomba. Em questão de horas, mobilizou a revolta de milhares de mulheres, inclusive célebres CEOs, tornando-se por iniciativa própria o judas da semana.

Como era de se esperar, não aguentou o tranco. No último dia 21, deixou o posto de CEO da empresa que fundou (agora ocupado por uma mulher), logo depois de ser convidado a sair do conselho de uma empresa de lingerie.

Ele não é exatamente uma exceção. O que o distingue dos muitos similares com quem já cruzei nos últimos anos é o discurso “sincericida”, sem filtros, alimentado talvez por um certo gosto pela polêmica. Arrisco afirmar que a pauta da diversidade, equidade e inclusão, em alta com a ascensão do ESG, só não avança mais nas empresas porque pessoas como ele insistem em confrontá-la com visões moralistas, crenças limitantes, e, mais recentemente, posições ideológicas.

Explico melhor. Centenas de estudos em todo mundo apontam uma clara correlação entre ambientes diversos/inclusivos e empresas mais saudáveis, mais criativas e inovadoras e, portanto, mais lucrativas.

Segundo o Instituto Identidades do Brasil (2019), um acréscimo de 10% na diversidade de gênero aumenta em até 5% a produtividade. Pesquisa da McKinsey (2020) mostra que entre empresas com maior diversidade de gênero, 55% entregaram melhores resultados operacionais, contra 29% no caso das empresas não diversas. Outro estudo da Grant Thornton, Women in Business, indica que, na contramão, o número de mulheres em cargos de CEO caiu globalmente de 28% (2023) para 19% (2024).

Menos mulheres CEOs significa que elas são menos capazes para ocupar os cargos mais altos de empresas? Óbvio que não. Significa que elas ainda são vítimas dos vieses inconscientes de um mundo corporativo muito masculino, machista e misógino, mas também branco, de olhos claros, hetero e magro. Vieses inconscientes nada mais são do que pré-julgamentos de ideias, pessoas e grupos baseados em estereótipos formados ao longo de uma vida e escondidos no fundo de nossa mente.

Apenas eles explicam porque, ainda hoje, apesar do reconhecimento da diversidade como valor de negócio, muitos gestores seguem empregando pessoas que pensam ou agem como eles – o próprio executivo em questão (tomado pelo viés de afinidade) admitiu, em posts anteriores, não contratar “esquerdistas” e optar pelos que trabalham “80 horas por semana”.

Apenas os vieses inconscientes explicam também porque, a despeito da pressão dos milennialls por empresas mais diversas, gestores ainda preferem recrutar indivíduos identificados com o mesmo padrão físico e estético (viés de aparência). E, no outro extremo, deixam de selecionar pessoas negras, com deficiência ou mulheres jovens por acharem que não têm formação compatível com os desafios corporativos (viés de estereótipo), que exigem muito esforço de adaptação (viés de confirmação) ou que querem engravidar e ter filhos (viés de maternidade).

Uma boa notícia sobre os vieses inconscientes é que podem e devem ser enfrentados e superados. Afinal, somos seres em evolução. O executivo malhado na semana passada reconheceu os erros. Mas quanto dessa mea culpa ocorreu apenas por causa da repercussão pública negativa? Tenho participado de conversas privadas nas quais alguns líderes destilam, sem censura, opiniões duras contra o que chamam de “mimimi” dos movimentos feministas, antirracistas, anticapacitistas e LGBTQIA+. Recentemente, grandes empresas globais anunciaram um “freio de arrumação” nos programas de D,E&I. Receio que um assunto de grande interesse público esteja começando a chamuscar no meio de um fogo cruzado ideológico.