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Saiba como a Dexco dobrou de tamanho e conheça a ousada estratégia do CEO

Crédito: Claudio Gatti

O CEO Antonio Joaquim de Oliveira entregará para o próximo presidente uma empresa duas vezes maior e mais diversificada (Crédito: Claudio Gatti)

Por Hugo Cilo

RESUMO

• Líder nos setores em que atua, a companhia surgiu da simbiose das marcas Duratex e Deca
• Marca dobra de tamanho em 12 anos, supera faturamento de R$ 7,4 bilhões e prepara uma rede de mais de 100 lojas físicas
• O retrofit no modelo de gestão está só no começo

O executivo Antonio Joaquim de Oliveira, CEO da Dexco, é um escritor nato, aficionado por criar e redigir histórias. Aos 64 anos, às vésperas de pendurar a caneta no comando do grupo que controla marcas como Duratex, Eucatex, Durafloor, Deca, Ceusa e Portinari, ele divide seu tempo entre a gestão de uma companhia com faturamento de R$ 7,4 bilhões no ano passado e a produção de sua maior obra literária, um romance que “provavelmente” vai se chamar Terra Vermelha, nome que remete às suas origens em Apucarana, interior do Paraná, e à criação em um lar de pais mineiros.

Mas, seja qual for a qualidade literária e o sucesso de vendas de seu livro, a história mais contada sobre Oliveira será sua trajetória na Dexco.
Funcionário da empresa desde 1986, ele assumiu a presidência em 2013 e decidiu reformar uma das mais tradicionais companhias do País, fundada em 1951.
A julgar pelos números, a obra deu certo. Sob seu comando, a Dexco (nome criado em 2021 a partir da união das marcas Duratex e Deca) dobrou de tamanho, diversificou as operações e se transformou de uma gigante da indústria em uma casa de marcas.

“Foi um imenso desafio criar sinergia em duas operações completamente distintas, a florestal e a de louças e metais sanitários, em uma empresa avessa a mudanças”, afirmou Oliveira, em entrevista à DINHEIRO. “O trabalho não se limitava às questões operacionais, mas sim à dificuldade em mudar a cultura da companhia”, disse.

(Divulgação)
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A loja-conceito da companhia terá investimento de R$ 37 milhões e será a principal unidade one-stop-shop exclusiva do grupo

Essa mudança de cultura gerou conflitos. Cerca de 85% dos mais de 100 cargos de liderança do grupo foram demitidos. Era o primeiro passo para que Oliveira pudesse colocar em prática as mudanças que considerava necessárias, antes mesmo de investir no fortalecimento das marcas e nas aquisições que viriam em seguida.

E não foram poucas as aquisições.

Sob a gestão do atual CEO, foram mais de R$ 10 bilhões em expansão da capacidade instalada, compra de marcas concorrentes e entrada em um novo segmento, o de revestimentos cerâmicos.
O maior de todos foi na LD Celulose, de celulose solúvel utilizada na indústria têxtil, que recebeu US$ 1,5 bilhão (cerca de R$ 8,2 bilhões) em parceria com a gigante austríaca Lenzing AG.
Esse foi o maior investimento em toda a história da companhia.
O plano é fortalecer ainda mais a operação da Dexco no setor florestal – área que inclui painéis de madeira e pisos, por exemplo –, que responde atualmente por mais de 60% da receita do grupo. Com investimento de R$ 230 milhões, a companhia fez, nos últimos anos, uma forte expansão da base florestal (florestas plantadas de eucalipto e pínus em terras próprias e arrendadas), principalmente na região Nordeste do País.
Parte dos recursos foi destinada à compra de participação majoritária na Caetex (60%), joint-venture para o plantio de florestas em Alagoas.

Na avaliação do BTG Pactual, a Dexco tem se beneficiado de um ambiente positivo para o setor de madeira. “A dinâmica do mercado melhorou recentemente, com a demanda por painéis aumentando em 20% no primeiro semestre de 2024”, afirmou o banco, em relatório assinado pelos economistas Leonardo Correa, Bruno Lima e Marcelo Arazi. “Como player integrado, a Dexco está bem posicionada para se beneficiar da melhoria do ambiente, ao mesmo tempo em que mantém uma base de custos estável.”

Apesar da força da Dexco no setor florestal e de madeira, é na divisão de revestimentos cerâmicos que a companhia executa o maior plano de aquisições. As marcas Ceusa e Portinari ganharam uma nova fábrica em Botucatu, no interior paulista, com investimentos de mais de R$ 700 milhões. A Dexco também desembolsou outros R$ 150 milhões para a aquisição da Castellato, líder no segmento de pisos e revestimentos de concreto arquitetônico, com sede em Atibaia (SP). “A estratégia de diversificação dos negócios tem como pilar o setor cerâmico, um mercado com imenso potencial de crescimento e no qual estamos muito bem consolidados com marcas reconhecidas pela excelência e qualidade”, disse Oliveira.

A tática da Dexco de diversificar as fontes de receita passa também pela compra de participação em empresas por meio do DX Ventures, fundo de venture capital da companhia. Isso permitiu que a empresa entrasse em nichos até então desconhecidos.

Desde 2021, R$ 240 milhões já foram investidos em participações minoritárias de empresas como:
Urbem (fabricante de madeira engenheirada, que recebeu R$ 30 milhões em troca de 22,7% do capital),
Noah (que atua no desenvolvimento de negócios imobiliários para construção de edifícios comerciais e teve R$ 15 milhões por 17,5% da companhia),
Brasil ao Cubo (R$ 90 milhões por 19,4% de equity, que tem também a Gerdau como sócia),
ABC da Construção (R$ 102,5 milhões por 10% da companhia),
e a Marcenaria Diferente, startup para marceneiros que recebeu R$ 2,6 milhões.
A Dexco também pagou R$ 400 mil para a aquisição integral da Viva Decora, plataforma que reúne conteúdo segmentado sobre decoração e design de interiores com foco em consumidores e profissionais do setor.

(Divulgação)
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(Rafael Renzo)

Com a expansão dos negócios florestais, que respondem por 60% da receita da companhia, a Dexco consolidou sua liderança no segmento de placas de madeira

A companhia, no entanto, não está só comprando marcas. Em busca de rentabilidade, também se desfez de algumas. Na quarta-feira (2), a empresa acertou a venda de sua divisão de torneiras e chuveiros elétricos para uma concorrente de Santa Catarina, a Zagonel. O acordo envolveu as marcas Corona e Thermosystem, duas instalações em Aracaju, no Sergipe (uma fábrica com capacidade para produzir 12 milhões de peças por ano e um centro de distribuição), e outro centro de distribuição em Tubarão, em Santa Catarina.

No final de agosto, a Dexco já havia sinalizado a intenção de sair desse mercado e recrutou uma assessoria financeira para ajudar na busca por compradores. Embora tenha vendido dois ativos, a empresa permanecerá no segmento com a marca Hydra, que opera no ramo de chuveiros, sistemas de descarga, purificadores e canos. A marca, no entanto, vai sair do mercado de torneiras e chuveiros elétricos. A companhia calcula que a transação resultará em baixa contábil de R$ 100 milhões no balanço do terceiro trimestre, referentes aos impairments da operação, sem efeito no caixa e classificados como não recorrentes.

A Dexco está no mercado de torneiras e chuveiros elétricos desde 2012, quando comprou a indústria Thermosystem, de eletrônicos, e se tornou vice-líder do segmento em 2015, quando adquiriu a Duchacorona, passando a integrar as marcas Hydra, que já era sua, com a Corona. Segundo a empresa, a decisão de sair desse mercado representa um esforço para priorizar os segmentos que apresentam maiores sinergias em seus canais de venda e posicionamento de mercado. “Apesar de ser um importante gerador de receita, o negócio de chuveiros gera zero Ebitda”, afirmam os analistas do BTG.

FOCO NO VAREJO

Entre todas as apostas da Dexco, a que mais tem empolgado o CEO é a guinada da companhia no varejo. Pela primeira vez na história, a companhia terá uma rede de franquias com mais de 100 lojas exclusivas de suas marcas, no modelo one-stop-shop, chamada de Abtah. As unidades terão o portfólio completo da empresa e funcionarão como uma espécie de showroom, sem estoques. Cada loja vai demandar investimento de R$ 400 mil a R$ 1 milhão dos franqueados. Os primeiros endereços já estão definidos nas cidades mineiras de Belo Horizonte e Juiz de Fora.

A Abtah, de acordo com o CEO, é uma oportunidade de oferecer aos clientes o melhor do portfólio premium da Dexco, com a melhor experiência, através do melhor modelo de negócios. “Com a Abtah, o consumidor pode conhecer o produto e receber orientações para fazer a melhor escolha, sem a necessidade de estoques, através de uma plataforma de prateleira infinita”, diz Oliveira. “Além da vantagem financeira, sem comprometimento de caixa e necessidade de gestão de estoque, o cliente conta com diferencial logístico e garantia de disponibilidade.”

A rede de franquias da companhia será construída em paralelo à outra estratégia no varejo: a Casa Dexco. A megaloja própria será inaugurada em fevereiro de 2025 em um espaço de 3,6 mil m² no Conjunto Nacional, o mais antigo complexo comercial da Avenida Paulista, em São Paulo, com investimento de R$ 37 milhões. “A proposta é nos aproximar ainda mais de nossas marcas e de nossos consumidores, sem concorrer com os atuais parceiros que já oferecem nossos produtos em lojas multimarcas”, afirma Oliveira.

Com investimentos bilionários nos últimos anos, transformação da cultura organizacional, diversificação das áreas de atuação e estreia no varejo, Oliveira deixará seu legado escrito na história da Dexco. A partir de abril de 2025, as próximas histórias vão estar no romance Terra Vermelha.

ENTREVISTA
Antonio Joaquim de Oliveira, CEO da Dexco

(Claudio Gatti)

“O foco é transformar uma empresa de mentalidade industrial em uma empresa de marcas”

Depois de quatro décadas na Dexco, você terá de deixar o cargo. Qual a sensação?
Sim, saio em abril do ano que vem, completando 39 anos de empresa. Pelo estatuto, todo presidente precisa passar o bastão aos 65 anos. Chegou a minha vez. A sensação é de missão muito cumprida. Foi uma trajetória incrível.

Como você resumiria sua trajetória?
Entrei em 1986, por acaso, sem sequer conhecer a então Duratex. Estava na carreira acadêmica, dava aulas de literatura, e o doutorado nos Estados Unidos era o meu plano de vida. Vi um anúncio de emprego, mandei o currículo e, em uma semana, mudei todos os meus planos.

Qual foi seu primeiro desafio na empresa?
Comecei na área florestal e, aos 30 anos, já dirigia operações. Aos 35, me tornei diretor da área. Nessa época, a Duratex era diferente, focada em madeira e painéis. Hoje, o setor responde por 60% do faturamento do grupo.

Como foi a integração entre as divisões de madeira e louças sanitárias?
Quando assumi, em 2013, madeira e Deca operavam como empresas separadas. Havia pouca sinergia entre as divisões. Isso era um problema, porque precisávamos nos ver como uma empresa única. Costumo dizer que a Duratex era uma empresa difícil. Éramos bege, sem cor, sem graça. Sóbria demais. Uma empresa pesada e com uma hierarquia rígida ao extremo. Parecia o Exército. Tinha DNA de banco antigo. Não era vibrante. Não era cool. A Duratex era como uma senhora do [bairro] Jardins. Não por acaso, o Itaú praticamente nasceu dentro da Duratex. Olavo Setúbal comandava a empresa quando decidiu criar o Itaú. Hoje a Dexco e o Itaú são empresas permanentes da Itaúsa.

E você decidiu mudar a cultura?
Exatamente. Havia pontos fortes, como o foco em qualidade e ética, mas também muitas barreiras, como a resistência à mudança e a ausência de meritocracia. Precisávamos transformar a empresa. Identifiquei as fragilidades da companhia, ajudei a acabar com a mentalidade industrial, longe do consumidor, para tornar a empresa mais amistosa e próxima ao cliente. Foi difícil convencer o pessoal naquela época, mas sempre insisti que o nosso passado não ia garantir nosso futuro. O foco é transformar uma empresa de mentalidade industrial em uma empresa de marcas. Uma grande casa de marcas. Tivemos de fazer um mea culpa e acabar com a soberba. Isso foi feito.

Imagino que tenha demitido muita gente…
Sim, mas foi necessário. Nesse processo de reinvenção da companhia, houve muita resistência. Então, cerca de 85% dos cerca de 100 postos de liderança do grupo tiveram de sair. Era uma cultura envelhecida, resistente à nova mentalidade. Nas reuniões de diretoria, ninguém falava na mesa, só o diretor. Foi preciso um choque de administração.

O que mudou desde então?
Três pilares guiaram essa transformação: cultura, diversificação e foco em marcas. Transformamos a cultura, mudamos a marca corporativa para Dexco em 2021, e ampliamos nossa atuação com a entrada em revestimentos cerâmicos e celulose solúvel.

Como a Dexco se diversificou?
Adquirimos a Ceusa em 2017 e a Portinari em 2019, focando no mercado de revestimentos cerâmicos premium. Também investimos em uma fábrica de celulose solúvel, nosso maior investimento, de cerca de US$ 1,5 bilhão.

Além disso, vocês entraram em novos negócios?
Sim, criamos um fundo de Venture Capital para investir em startups e negócios como a ABC da Construção, que está revolucionando o varejo de materiais de construção, e a Brasil Ao Cubo, que constrói prédios em tempo recorde.

E o projeto Casa Dexco?
A Casa Dexco será um grande showroom no Conjunto Nacional, com 3.600 m², onde o consumidor poderá viver uma experiência imersiva com todas as nossas marcas. Será inaugurada em fevereiro de 2024.

Quem assumirá seu lugar?
A sucessão será interna e deve ser definida até o fim de outubro. A empresa quer garantir continuidade, preservando a cultura que construímos.

Qual você considera seu maior legado?
Sem dúvida, a transformação cultural. Mais do que o crescimento, foi a mudança na mentalidade da empresa. Hoje, a Dexco está mais preparada para o futuro, com uma cultura mais aberta e inovadora.