Carta aos CEOs do Brasil
Por Jorge Sant’Anna
Há cerca de cinco anos nos deparamos com uma situação ao mesmo tempo terrível e invisível para a grande parte da sociedade. Jovens em serviços de acolhimento institucional-abrigos, ao completarem 18 anos, devem ser “desacolhidos”. Isto é, devem voltar às suas famílias disfuncionais ou buscar um lugar para viver.
A palavra elegante que usamos para classificar essa situação é “vulnerável” – Jovens em situação de vulnerabilidade social. Na realidade, o termo vulnerável não representa nem de perto o perigo e consequente estado de terror vivido por esses Jovens, na verdade crianças ainda, como eu mesmo era nessa idade. São milhares de Jovens que passam por isso anualmente em todo Brasil e principalmente no estado de São Paulo.
O lugar designado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente para receber esses Jovens chama-se “República Jovem”, mas o número de Repúblicas existentes não atende minimamente a necessidade. É muito triste ver milhares de Jovens caminharem para uma vida à margem da sociedade, muitas vezes em meio a tráfico de drogas, vício, escuridão, como se escorregassem por entre os dedos da sociedade.
Tudo se torna mais grave ainda porque, para além das poucas Repúblicas Jovens, não existe qualquer política pública, projeto ou iniciativa do governo, em todas as suas esferas, para lidar com uma causa tão importante e necessária.
Diante dessa descoberta, mergulhamos em um projeto que, para nós, era absolutamente desconhecido naquele momento. Decidimos criar uma República Jovem para receber, acolher, cuidar e desenvolver Jovens nessa situação. O entusiasmo em muito superava nossa inexperiência no assunto, e seguimos em frente, buscando doadores, que chamamos de Semeadores, contratando pessoal especializado, encontrando as casas em que os Jovens iriam morar, estabelecendo uma rede de voluntários, em todas as áreas, para que pudéssemos realmente acolher e cuidar de nossas Jovens. Sim, iniciamos com casas que abrigassem meninas.
Criamos o Celeiro Vó Tunica, um lugar onde acolhemos, cuidamos e capacitamos nossas Jovens para uma vida adulta, autônoma, independente e, consequentemente, digna.
Cinco anos se foram, dezenas de meninas já passaram pelas nossas três casas, e queremos ir para a quarta. Já produzimos frutos, tivemos Jovens que nos deixaram ao completar 21 anos, muito bem empregadas, cursando faculdade e aptas para uma vida adulta digna e plena.
Onde elas estariam agora se não fosse o Celeiro?
O dia a dia do Celeiro está longe do “glamour” das iniciativas que eu estava acostumado a assistir, a partir de minha posição de CEO entusiasta das causas sociais. Ele exige presença, finais de semana, carinho, afeto, compreensão, amor e uma dedicação quase que visceral.
Mais do que nunca consigo realizar, entender o significado da palavra “Transformação”. Transformamos essas Jovens com o apoio de tanta gente, muito esforço e disciplina. Mas, muito para além da transformação delas, o que nos impacta é a transformação pela qual passamos, em nossa maneira de ver e atuar no mundo. Saímos da audiência e fomos para o palco e, assim, emergimos após estes cinco anos completamente diferentes, lúcidos e com o coração repleto de propósito.
Se ao lerem esta Carta, este breve depoimento, conseguirem de alguma forma capturar a importância do Celeiro para nossas Jovens, para a nossa sociedade e, sobretudo, para nossas vidas, não deixem de seguir conosco e nos apoiar em nossa Jornada de crescimento e expansão.
Precisamos de pessoas como você.
Obrigado Celeiro Vó Tunica, por transformar a nossa vida.
Jorge Sant’Anna é diretor-presidente e cofundador da BMG Seguros e membro do Conselho de Administração da Associação Brasileira de Bancos