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A difícil missão de Galípolo

Crédito: Brenno Carvalho

Marcos Strecker: "Lula vai arriscar sua popularidade? Esse é o grande problema de Galípolo" (Crédito: Brenno Carvalho)

Por Marcos Strecker

A indicação de Gabriel Galípolo para a presidir o Banco Central a partir de 2025 foi aprovada pelo Senado com grande facilidade, na última terça-feira (8). Na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), a decisão foi unânime. No plenário da Casa, uma maioria esmagadora de 66 votos a 5 sacramentou o nome do escolhido do presidente Lula. Galípolo agradou com um discurso milimetricamente calculado para não causar dúvidas sobre seu compromisso com o combate à inflação (principal mandato da instituição) demonstrando, ao mesmo tempo, sua fidelidade ao mandatário, ainda que sem mostrar subordinação.

Foi uma “prova de maturidade institucional”, celebrou o ministro da Fazenda. De fato, Fernando Haddad foi o grande vitorioso na atual transição do BC, pois convenceu Lula a indicar um aliado capaz de preservar o “tripé econômico” estabelecido nos anos 1990. Mas tanto Haddad como Galípolo continuarão com a difícil missão de convencer Lula a seguir uma das “pernas” desse tripé: a responsabilidade fiscal. Cada vez mais há dúvidas sobre o compromisso do petista com o controle das contas públicas. Ainda que formalmente o Arcabouço Fiscal, concebido por Haddad contra as vozes mais estridentes do PT e do próprio governo, tenha firmado o compromisso de evitar uma nova gastança com dinheiro público, há muitas dúvidas de que consiga esse objetivo – ou mesmo que sobreviva ao atual mandato do petista.

A agência de classificação de riscos Moody’s deu um voto de confiança expressivo ao aumentar no dia 1º a nota de crédito do País – a um passo de atingir o grau de investimento. Se por um lado isso afagou o ego daqueles que veem um mau humor injustificável com os números da economia (crescimento de quase 3% este ano, desemprego em baixa histórica etc.), por outro fez as vozes mais ponderadas lembrarem que há um grande desequilíbrio à frente: a dívida pública. Ela ainda é extremamente elevada, muito acima do nível de países em desenvolvimento como o Brasil. Esse dado implacável escapa aos malabarismos feitos para mostrar comedimento com os gastos, sem contar a maquiagem nas contas ou a contabilidade criativa: o programa Gás para Todos, é bom lembrar, foi turbinado dentro do próprio Palácio do Planalto para driblar o Arcabouço. Além disso, “esqueletos” legados pelo governo anterior (como precatórios bilionários) também escapam à regra fiscal, mas engordam o estoque da dívida.

Esses expedientes reforçam que a trajetória da dívida é o calcanhar de Aquiles da atual gestão. Dados do próprio Ministério da Fazenda apontam que a dívida bruta no governo Lula crescerá de 73,5% do PIB em 2022 (último ano do governo Bolsonaro) para 81,6% em 2026. É um aumento de 8,1 pontos percentuais. Enorme, ainda que não ultrapasse a brutal performance negativa do governo Dilma – quando a dívida pulou de 52% do PIB para 66% em três anos. Esses números preocupam especialistas isentos. Um deles é o próprio secretário de Política Econômica da ex-presidente, Márcio Holland. E geram alertas de instituições como o Banco Mundial, como ocorreu na última quarta-feira (9).

Um dos grandes desafios de Galípolo é exatamente lidar com as consequências desse passivo astronômico. Ele será obrigado a aumentar a Selic, que já está em 10,75% ao ano. Isso aumenta o serviço da dívida, ou seja, os juros bancados pelo contribuinte para refinanciar essa dinheirama (foram R$ 855 bilhões nos 12 meses encerrados em agosto passado). Para quebrar esse círculo vicioso e permitir a queda da Selic, com a estabilização da dívida, é preciso reduzir o rombo nas contas públicas e domar a inflação. Mas o atual governo conseguiu seus bons números macroeconômicos aumentando o buraco e expandindo os gastos, que pressionam o aumento dos preços. Respeitar o Arcabouço Fiscal, contendo despesas, significa desinflar as bandeiras eleitorais do presidente. Já se preparando para as eleições de 2026, Lula vai arriscar sua popularidade? Esse é o grande problema de Galípolo.