A difícil agenda pós-eleitoral
Por Marcos Strecker
Passadas as eleições de domingo (27), o governo Lula deverá se debruçar sobre medidas urgentes para desanuviar o ambiente político em Brasília e, principalmente, dar racionalidade à pauta econômica. O que está em jogo é o pacote de cortes em preparação no Ministério da Fazenda e do Planejamento para conter o rombo nas contas públicas (cerca R$ 70 bilhões apenas este ano) e garantir o Arcabouço Fiscal.
Fernando Haddad sabe que várias medidas em discussão vão enfrentar batalhas difíceis no Congresso. Mas o principal problema do ministro fica do outro lado da Praça dos Três Poderes, no Palácio do Planalto. Ele precisa convencer Lula a cortar despesas, algo que o presidente resiste. Vários balões de ensaio devem morrer na praia. É o caso da contenção das despesas obrigatórias em Saúde e Educação ou o atrelamento do salário mínimo, que deve crescer acima da inflação, a benefícios sociais. Outros, capciosos, merecem naufragar. É o caso da tunga sobre o salário-desemprego de quem ganha acima de quatro salários mínimos (R$ 5.648).
Para fazer a agenda de cortes avançar, Haddad acenou com a contenção dos supersalários no serviço público. De fato, virou letra morta, na prática, a regra que limita a remuneração nos três Poderes ao valor recebido pelos ministros do STF (R$ 44.008,52). Garantir que esse teto volte a funcionar é uma proposta facilmente defensável e poderia gerar uma economia anual estimada em R$ 5 bilhões. Mas, além de irrisória, a ideia parece apenas uma cortina de fumaça para a necessária Reforma Administrativa, que poderia dar racionalidade às despesas com o funcionalismo. A demissão por mau desempenho dos servidores, por exemplo, já está na Constituição, mas nunca foi regulamentada. Mexer na máquina pública causa arrepios em boa parte do governo, que tem DNA sindicalista e corporativista.
Esse é outro campo minado para o ministro. O presidente da Câmara, Arthur Lira, sempre usou a bandeira da Reforma Administrativa como uma forma de disciplinar os gastos que crescem bem acima da arrecadação. Com isso, tira os parlamentares da mira e aponta as baterias para o Executivo. Isso porque, para abrir espaço no Orçamento, o governo desde o início está de olho nas emendas parlamentares, que ganharam proporções enormes e correm soltas, à revelia do Executivo. Haddad sabe que cortar essa prerrogativa conquistada pelo Legislativo é uma batalha perdida. Já uma verdadeira Reforma Administrativa poderia poupar despesas.
Vários setores apostam que, com as urnas fechadas, essa agenda pode caminhar. Um grupo de 21 entidades dos segmentos de varejo e serviços lançará nos próximos dias 14 propostas de emendas com o objetivo de sensibilizar a sociedade. Entre as sugestões, a introdução de sistemas de avaliação e a garantia de estabilidade apenas para cargos de Estado. Mas é muito pouco provável que essa pauta prospere. Nem a aprovação da Reforma Tributária pelo Senado, que é prometida até o início de dezembro, está garantida. Haddad sabe que o tempo é curto. A agenda legislativa já se volta para a eleição das novas mesas diretoras da Câmara e do Senado, que deve ocorrer em fevereiro. Depois disso, os olhos estarão voltados para as eleições de 2026. O ministro tentar convencer o presidente de que o Arcabouço Fiscal é a melhor garantia da reeleição. Falta Lula concordar.