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O Prêmio Nobel de Economia de 2024

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Vitoria Saddi: "A visão institucional mostra que o impacto do ambiente sobre o desenvolvimento econômico ocorre via um impacto duradouro nas instituições" (Crédito: Divulgação)

Por Vitoria Saddi

O prêmio Nobel de economia deste ano foi para os estudiosos das instituições e como estas afetam o crescimento econômico. Além de Daron Acemoglu e Simon Johnson, James Robinson (que foi meu professor no PhD) foram os ganhadores. Ao meu ver, o prêmio é para todos que se dedicaram a esta nova visão institucional. Abaixo trato das principais teorias que mostram como a geografia, instituições e políticas influenciam o desenvolvimento econômico.

Em 1993 Douglas North ganhou o Nobel por suas contribuições sobre instituições e como ela afeta o crescimento econômico. A ideia central da teoria de North é que as instituições (regras, normas, e restrições sociais) desempenham um papel crucial no desenvolvimento econômico ao influenciar o comportamento dos agentes econômicos. No entanto, a principal crítica à teoria de North era explicar por que existem países pobres onde uma elite sobrevive no poder há séculos e produz instituições subótimas.

A hipótese da geografia (ou da dotação inicial) associada aos nomes de Sachs e Warner (1995, 1997) diz que o ambiente diretamente influencia a qualidade da terra, do trabalho e da produção de tecnologia. Assim, por exemplo, comparado ao clima temperado, os ambientes tropicais tendem a ter baixa produção de grãos, doenças sem cura (ou mortais). Da mesma forma, circunstâncias geográficas particulares – se um país não tem fronteira com o oceano e, portanto, não é aberto ao comércio – irão permanentemente restringir a habilidade do país de acessar um grande mercado econômico, inibir sua capacidade de explorar produções de escala e portanto diminuir sua eficiência. De acordo com a hipótese da geografia, o ambiente molda o desenvolvimento econômico diretamente ao influenciar os insumos na função de produção.

Além do trio que ganhou o Nobel, a visão institucional está ligada a Engerman e Sokloff (1994 e 2000) e sustenta que o principal impacto do meio ambiente sobre o desenvolvimento econômico passa pelo impacto duradouro nas instituições. Neste sentido, em ambientes onde a produção agrícola ocorre em latifúndios (ou grandes propriedades) as instituições legais e políticas irão emergir para proteger os donos da terra em detrimento dos demais trabalhadores, podendo até justificar a escravidão. Mesmo quando a agricultura perde sua relevância, as instituições continuam a impedir a competição e o desenvolvimento econômico. Assim, as instituições de muitos países foram moldadas durante a colonização e neste sentido é mais do que justificável examinar as colônias. Os europeus perceberam que havia países (conforme sua geografia) com mais doenças do que outros. Em colônias com clima tropical havia muitos ‘germes’ (como uma proxy para mortalidade e doenças) os europeus criaram as colônias de exploração. Em colônias com temperaturas amenas e poucos ‘germes’ os poderosos criaram colônias de povoamento. A visão institucional mostra que o impacto do ambiente sobre o desenvolvimento econômico ocorre via um impacto duradouro nas instituições. Nesta abordagem a tecnologia é endógena às instituições e eventualmente induz à adoção de melhores técnicas de produção.

O terceiro e último grupo de trabalhos estão ligados aos nomes de Easterly e Levine (2002) e Nugent e Robinson (2001) e enfatiza o papel das políticas e sua influência no desenvolvimento econômico. Nesta visão, o caráter histórico das instituições tem importância secundária. A visão política sustenta que as políticas econômicas e instituições reflete o conhecimento atual e as forças políticas.

Apesar do Nobel, a principal crítica na literatura acerca desta abordagem é o argumento que as dotações iniciais são devido à sorte. Assim, por exemplo, usando o argumento dos autores, o Brasil é pobre e desigual hoje porque foi colônia de exploração. Na minha tese de PhD mostrei que a criação da lei da Terra de 1850 foi fator determinante para atrair imigrantes para São Paulo para trabalhar na lavoura do café. Num segundo momento, estes imigrantes se tornaram pequenos produtores de café. Neste sentido, refuto a idéia difundida nos livros tradicionais de história que o café era produzido em latifundios por escravos e depois por imigrantes mal pagos. Em 100 anos (1830-1930) de estudo houve redução do tamanho da propriedade de terra onde o café era produzido, maior predomínio de produtores estrangeiros (imigrantes) e direitos de propriedade bem definidos. Segundo as conclusões da minha tese, a lei da Terra de 1850 foi um fator preponderante para atrair imigrantes. Os direitos de propriedade eram tão bem definidos que estes imigrantes tiveram preponderância na produção do café até 1930.

*Vitoria Saddi é estrategista da SM Futures. Dirigiu a mesa de derivativos do JP Morgan e foi economista-chefe do Roubini Global Economics, Citibank, Salomon Brothers e Queluz Asset, em Londres, Nova York e São Paulo. Também foi professora na California State University, na University of Southern California e no Insper. É PhD em economia pela University of Southern California.