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As urnas ajudaram o Arcabouço Fiscal

Crédito: Ricardo Stuckert

Marcos Strecker: "Se Lula se render às propostas razoáveis de Haddad e Tebet, pode pavimentar o caminho da reeleição" (Crédito: Ricardo Stuckert)

Por Marcos Strecker

Há eletricidade no ar com o pacote de cortes a ser anunciado oficialmente pelo governo. O Ministério da Fazenda precisará tomar ações concretas para evitar que o Arcabouço Fiscal colapse a partir de 2026. Nas últimas semanas, as equipes de Fernando Haddad e de Simone Tebet (Planejamento) adiantavam que as medidas seriam anunciadas logo após as eleições para não tumultuar o pleito nem criar atritos no Congresso, que precisará referendar tudo. Encerrada a contagem dos votos, chegou a hora da verdade. O ministro se reuniu pelo menos duas vezes com o mandatário desde a última segunda-feira (28) com o objetivo de alinhar as propostas que já circulam nos bastidores. Mas a agonia continua. O simples fato de Haddad negar o lançamento iminente, para não melindrar Lula, fez a bolsa cair e o dólar disparar (maior patamar desde 2021).

Está se fechando a janela de oportunidade para esse anúncio. E ele é crucial não apenas para garantir a sobrevida do Arcabouço Fiscal. É determinante para o destino do terceiro mandato do petista. Ele acabará mais parecido com Lula 1, quando o presidente surpreendeu a todos com uma política de disciplina fiscal e garantiu a independência do Banco Central? Ou vai se assemelhar à gestão Dilma Rousseff, quando a inflação foi tratada com desídia e o rombo nas contas públicas explodiu? É essa a discussão que, no fundo, está pegando fogo nos corredores em Brasília e nas reuniões de balanço eleitoral do PT. O resultado decepcionante nas urnas fez a legenda do presidente apontar o dedo para o governo. Já os governistas acham que o partido precisa se atualizar.

Até hoje, Lula acenou para os dois times. Aparentemente, o núcleo que reúne o titular da Fazenda, Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Padilha (Relações Institucionais) está ganhando a parada. Esse time deve ganhar um aliado de peso com a volta de Zé Dirceu, que acabou de ter suas penas na Lava Jato anuladas e deverá realinhar o Planalto com o Centrão, afastando-o da ala mais esquerdista ligada a Gleisi Hoffmann. Representaria um reposicionamento importante, já que Lula até agora escanteou o centro político que teve papel decisivo na sua vitória em 2022. A “frente ampla” nunca governou de fato, ficou resumida aos papéis acessórios de Simone Tebet (MDB) e do vice Geraldo Alckmin (PSB). O resultado das eleições municipais, com o triunfo de vozes moderadas e fracasso das candidaturas mais radicais (à direita e à esquerda) mostrou que Lula não pode depender da corrente que lidera o PT atualmente. Não é a presidência da partido que está em disputa acirrada agora. É o destino do governo.

Se Lula se render às propostas razoáveis de Haddad e Tebet, pode pavimentar o caminho da reeleição. Mais importante, evitará que a economia saia dos trilhos. Vale lembrar: os juros reais estão pressionados para o alto (os do mercado, não a Selic, que também está em alta), o real se mantém como uma das moedas mais depreciadas do mundo nos últimos anos e o FMI estima que a dívida do País vai atingir 87,6% do PIB neste ano, saltando para 97,6% em 2029 (era de 52% do PIB no governo Dilma). Não há agência de risco que devolva o cobiçado grau de investimento com números assim. É isso que os ministros estão falando para o presidente longe dos holofotes.