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Trumponomics desafia o governo Lula

Crédito: Kamil Krzaczynski

Com a volta de Trump à Casa Branca, Haddad aproveitou para sinalizar, mais uma vez, a necessidade de revisão de despesas (Crédito: Kamil Krzaczynski)

Por Marcos Strecker 

A avassaladora vitória de Donald Trump nos EUA provocou o segundo susto seguido no governo Lula em menos de duas semanas. Primeiro foram as eleições municipais, quando o fracasso dos candidatos petistas ou apoiados pelo governo havia provocado um choque de realidade para as vozes da base que se opõem a Haddad. O fiasco nas urnas tinha desinflado as críticas à política econômica do ministro, que, sem o fogo amigo, se sentiu mais forte para promover seu pacote de cortes logo depois de as urnas fecharem. Agora, com o surpreendente triunfo do republicano nos EUA, as incertezas aumentaram ainda mais e fizeram diminuir o espaço que o governo tem para “empurrar com a barriga” o ajuste nas contas públicas. Salvar o arcabouço fiscal ficou ainda mais premente.

Foi o que Haddad falou, ainda que com todo o cuidado político e paciência confuciana, em declarações logo após a confirmação do êxito de Trump. Com a volta do republicano à Casa Branca, o titular da Fazenda aproveitou para sinalizar, mais uma vez, a necessidade de revisão de despesas. A apreensão com a Trumponomics é grande no planeta e no Brasil. As reformas que o republicano promete implementar, com aumento generalizado de tarifas comerciais, pode fazer seu país regredir ao isolacionismo comercial que vigorava na década de 1930. A prometida redução dos impostos pode até dobrar o já espantoso déficit americano de 6% ao ano, segundo analistas. O mundo vai “desglobalizar” e os interesses nacionais vão prevalecer sobre os acordos multilaterais.

Ainda haverá muito recuo até a posse de Trump, que deve moderar sua ameaça de deportação em massa de imigrantes e rever os planos de taxar as importações chinesas em até 60% (para o México, as tarifas podem chegar a 75%). Mas os efeitos no Brasil já se fazem sentir, com o dólar ainda mais pressionado, encostando nos R$ 6. Com o desequilíbrio no Orçamento dos EUA, os juros americanos devem subir, enfraquecendo ainda mais o real. Os investimentos estrangeiros por aqui também podem diminuir, já que as companhias terão mais estímulo para aplicar seus recursos em solo americano.

Essa mudança de panorama acontece enquanto a economia brasileira ainda está em boa fase, com crescimento relevante (cerca de 3%) e desemprego em baixa histórica. Mas tudo indica que essa expansão não se sustentará se o desequilíbrio dos gastos continuar. A inflação está subindo e os juros, também, com o Copom tendo sido obrigado a aumentar na quarta-feira (6) a Selic de forma unânime em mais 0,50 ponto percentual, para 11,25%, alegando incertezas no cenário externo e risco inflacionário doméstico. Haddad está correto em sua cruzada pela responsabilidade fiscal. O horizonte internacional mais turbulento, a dois meses de uma transição profunda na maior economia do mundo, é mais um sinal de que não é possível adiar a lição de casa. O pacote de cortes, que Haddad e Simone Tebet gestaram com grande dificuldade, pode reabilitar o País para a volta do grau de investimento. Dependerá do Congresso em grande medida, mas a maior dificuldade de Haddad para implementá-lo, é bom lembrar, ainda será o próprio Palácio do Planalto.