Ferrari 12Cilindri: o som da paixão e da tradição (ou quase isso…)
O nome Ferrari 12Cilindri já revela a própria essência: uma quantidade monumental de potência expressa na forma mais nobre e pura, o arquétipo absoluto do prazer de guiar
Texto Alessio Viola
Tradução e edição Flávio Silveira
É inexorável: sempre que tenho o privilégio de dirigir um carro da Ferrari, entre pensamentos e sensações, acabo me perguntando onde exatamente ficam escondidos os 21 gramas de sua alma. Pois as criaturas de Maranello podem ser carros, mas têm alma. E, nos 1.560 kg do 12Cilindri, distinguir uma massa tão infinitesimal é mais simples que o habitual: grande parte está contida na maravilha posicionada entre as rodas dianteiras.
O motor ilumina todo o carro e, a cada volta do eixo, testemunhamos a inabalável e perpétua imutabilidade da paixão mecânica: 12 cilindros em V em 65 graus, naturalmente aspirado, pura e orgulhosamente a combustão. E se você perguntar em Maranello, parece que ninguém jamais pensou em estragar tal pureza com eletrificação. Uma decisão arriscada tomada há três anos, quando começou a tomar forma o primeiro elétrico da marca – que deve nascer só em 2027.
Até ele chegar, vamos curtir a maravilha dessas 9.500 rpm, elegantes e sexy. E nesse Ferrari a melodia começa antes de ligar o motor, com suas linhas cultas e sinuosas, modernas e ao mesmo tempo ricas em história, modificando a linguagem estilística das berlinettas de Maranello. Não é uma mudança total, claro, e mais uma atualização radical das formas, feita com a maestria necessária para fazê-las permanecer ligadas à sua origem e manter ligações com a longa história que as precede. E, de fato, o 12Cilindri faz referências bem específicas, sobretudo ao Daytona, que encontra no seu “olhar”, e tem novidades ousadas como o vidro traseiro. Afinal, inovações de hoje são tradições de amanhã.
Tal afirmação, de certo modo, também se aplica ao interior, já que o novo Ferrari tem aquele layout de duplo cockpit inaugurado pelo Roma e retomado pelo Purosangue – um layout que, por sua vez, talvez possamos considerar uma nova tradição.
Na comparação com o modelo de quatro portas, é adicionada uma tela sensível ao toque bem no centro do console. Isso evita concentrar tudo na instrumentação (como acontece no Purosangue). Uma solução intrigante, principalmente do ponto de vista narrativo: coisas como “o motorista tem tudo claramente diante dos olhos” são bonitas de se dizer e em parte também verdadeiras, mas o fato é que você tem que escolher, por exemplo, entre o belo conta-giros e o Apple CarPlay. Mais do que uma escolha, é sempre uma renúncia, algo que você não vai querer fazer após gastar 400 mil euros (ou R$ 2,5 milhões) em um automóvel.
Apesar da nova tela, os controles permanecem inalterados:
● o sistema multimídia continua sendo controlado por touchpads no volante: os italianos trabalharam arduamente para aperfeiçoá-los, mas é melhor voltar aos botões físicos.
● Seriam menos intrigantes de ver, mas ao menos usá-los não seria uma aposta – com sabor amargo, já que na maioria das vezes você a perde
● No mais, se repete a fórmula eterna que já tinha sido usada no 812 e em todos que o precederam: dois bancos secos e um cockpit perfeito – tanto para interação do condutor como para o conforto de viagens mais longas.
Trata-se de uma alma dupla, que você reencontra assim que as rodas começam a girar e fica imediatamente claro que o 12Cilindri atualiza aquele modo de ser, em alguns aspectos eterno e imutável, que o resto do mundo meio que sonha e muito inveja. Vou explicar, e, para isso, preciso fazer uma digressão entre a antropologia e a paixão pelo automóvel.
À primeira vista, o 12Cilindri anda como os antepassados, e isso é um elogio. A emoção é sempre a mesma, atualizada ao longo das décadas. Sempre reencontramos aquela sensação inestimável de dominar o mundo, resultado do que nos cerca em termos reais e também nas sensações. A começar pelos objetos em movimento alternado que balançam ali na frente a 24,7 metros por segundo: essa é a velocidade dos pistões quando o V12 chega a 9.500 rpm – a agulha tão perto de 10 mil é um espetáculo maravilhoso que dura só um instante (se você não quiser lidar com o corte de giro). E aí, na marcha seguinte, aquele som crescente, louco e irrepetível recomeça furiosamente.
Mas a beleza do V12 não está só no seu lado radical. Ele consegue ser dócil quando você acaricia o acelerador e gira lentamente. Talvez não chegue nem a 2.000 rpm, mas sua grandeza está ali de qualquer maneira, pronta para entregar emoções mesmo em velocidades insignificantes. E é esta capacidade de unir opostos que o faz majestosamente único: é irado e aveludado, delicado e impetuoso. Ele é tudo. Tem tudo o que você poderia desejar em um motor – incluindo, obviamente, uma trilha sonora excepcional, construída com notas ora mais agudas, ora mais barítonas. O som da paixão.
Muita coisa passa pelo motor, mas parte da lama está no handling, fruto refinado em décadas de experiência. Infelizmente, dirigi o 12Cilindri principalmente no molhado, onde, em comparação como nos antecessores, fui menos exigido, mas, como no 812, a sensação é de que é preciso antes conquistar sua confiança e estima, bem diferente da segurança imediata que trazem os V8s com motor central.
Este Ferrari, dentro dos limites permitidos pelo trânsito e pela chuva, parece um pouco mais aberto à clemência – o que não significa submissão: ir rápido é fácil, mas ir muito rápido exige controle. Você não precisa ser um piloto para administrar uma traseira que joga para lá e para cá em nome das trajetórias e da diversão. Ao escapar, ela se alarga com previsibilidade, mas se você acelerar mais, pode acabar atravessado na pista. E é então, no contraesterço, quando há o perfeito equilíbrio entre volante e acelerador, com as rodas viradas para o lado oposto da curva, que você entende claramente o que já sabia muito bem: automóveis são uma paixão.
Ferrari 12Cilindri
Motor: dianteiro-central, 12 cilindros em V, 6.5, 48V
Combustível: gasolina
Potência: 830 cv a 9.250 rpm
Torque: 678 kgfm a 7.250 rpm
Câmbio: automatizado, dupla embreagem, oito marchas, traseiro
Direção: elétrica
Suspensões: braços sobrepostos (d/t), amortecedores ajustáveis
Freios: disco de carbocerâmica (d/t)
Tração: traseira
Dimensões: 4,73 m (c), 2,01 m (l), 1,29 m (a)
Entre-eixos: 2,70 m
Pneus: n/d
Porta-malas: n/d
Tanque: n/d
Peso: 1.560 kg (seco)
0-100 km/h: 2s9
0-200 km/h: 7s9
Velocidade máxima: 340 km/h
Consumo médio (Europa): 6,5 km/l*
Nota do Inmetro: E*
Classificação na categoria: E *(Esportivo) *estimados