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Alta de juros no Japão

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Vitoria Saddi: "Caso o BoJ continue subindo juros em 2025 sem uma comunicação clara, o carry trade poderá desmoronar de forma abrupta, levando a uma valorização inesperada do iene e a turbulências nos mercados globais" (Crédito: Divulgação)

Por Vitoria Saddi

O recente aumento das taxas de juros no Japão e a expectativa de manutenção dos juros pelo Federal Reserve (Fed) têm gerado discussões sobre os impactos no mercado financeiro global, especialmente no que diz respeito ao carry trade. Enquanto o Banco Central do Japão (BoJ) sinaliza um aperto monetário gradual, o Fed permanece cauteloso, adiando cortes nas taxas. Como essas decisões afetam os investidores e a dinâmica do mercado?

Em janeiro de 2025, o BoJ aumentou sua taxa em 0,25%, elevando-a para 0,5%, o maior nível desde 2008. Essa mudança marca uma inflexão importante na política monetária japonesa, que por décadas operou com juros próximos de zero para combater a deflação. Historicamente, o Japão enfrentou pressões deflacionárias, e o estímulo monetário agressivo – incluindo quantitative easing – manteve os juros próximos a zero para impulsionar a economia. No entanto, a recente inflação acima de 2% ao ano levou o BoJ a agir para conter a alta de preços.

Curiosamente, o principal motor dessa inflação japonesa não é o aumento sustentado da demanda, mas sim o efeito do passthrough cambial – ou seja, o impacto da desvalorização do iene sobre os preços domésticos. Com o carry trade em alta nos últimos anos, o iene sofreu forte pressão de depreciação, o que encareceu as importações e elevou a inflação. O carry trade é uma estratégia em que investidores tomam empréstimos em moedas de juros baixos (como o iene) e alocam esses recursos em ativos de juros mais altos (como títulos do Brasil e dos EUA). Esse diferencial de taxas permite que os investidores capturem um lucro significativo.

No entanto, a alta dos juros no Japão reduz a atratividade do carry trade, pois o custo de financiamento aumenta. Se antes era extremamente barato tomar dinheiro emprestado em ienes e investir em mercados de juros elevados, agora essa operação se tornou menos lucrativa. Apesar disso, o carry não foi totalmente desestimulado, pois os juros nos EUA e no Brasil continuam elevados. O efeito prático é uma redução no volume das operações, mas ainda não uma reversão completa.

Enquanto o Japão caminha para um aperto monetário gradual, o Federal Reserve optou por manter suas taxas de juros elevadas, sem cortes esperados a curtíssimo prazo. Isso significa que, mesmo com a alta dos juros no Japão, o diferencial de taxas entre o dólar e o iene ainda é considerável. Como resultado, os fluxos de carry trade não desaparecerão de imediato, mas os investidores precisarão reavaliar os riscos, especialmente se o BoJ continuar elevando suas taxas ao longo do ano.

Em grande parte, a decisão do BoJ foi completamente antecipada e o par iene-dolar (USDJPY) ficou basicamente estável, em torno de 156 ienes por dólar. Os eventos de julho/agosto de 2024 servem como um alerta: quando o BoJ sinalizou um aperto monetário mais agressivo, o iene se valorizou rapidamente, saindo de 161 para 147 ienes por dólar. Isso gerou uma minicrise no mercado de carry trade, com forte liquidação de posições e quedas nas bolsas americanas (e brasileiras), em função da desmontagem das posições ativas em dólar financiadas com passivo em iene. Caso o BoJ continue subindo juros em 2025 sem uma comunicação clara, o carry trade poderá desmoronar de forma abrupta, levando a uma valorização inesperada do iene e a turbulências nos mercados globais.

Desde 2012, o Japão adotou políticas de estímulo monetário agressivas, que resultaram em uma desvalorização de mais de 100% do iene ao longo da última década. Isso ajudou a afastar o fantasma da deflação, mas também incentivou um ciclo de carry trade massivo.

Agora, a grande questão para 2025 é: o Japão realmente superou a deflação ou os aumentos dos juros levarão a uma desaceleração indesejada?

Se o BoJ conseguir equilibrar os aumentos sem sufocar o crescimento, o Japão pode estar iniciando um novo ciclo econômico mais estável. No entanto, se a inflação recuar muito rapidamente e o risco de deflação reaparecer, o BoJ poderá voltar atrás e interromper sua alta de juros, reabrindo o caminho para um novo ciclo de carry trade.

Para os investidores globais, isso significa que 2025 será um ano de transição, onde o carry trade pode perder força, mas ainda não desaparecerá completamente. A chave será observar atentamente os próximos passos do Banco do Japão e do Federal Reserve, pois qualquer mudança inesperada pode redefinir a dinâmica dos mercados internacionais.