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“O Brasil é um destino tremendo para nossas exportações”, diz Ignacio Fernández, da ProChile

O executivo que comanda a instituição governamental dedicada a promover produtos e serviços chilenos no exterior entende que o Acordo de Livre Comércio entre os dois países elevou o potencial de parcerias e que ainda há muitas áreas a explorar em ambos os lados

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Ignacio Fernández, da ProChile: "Precisamos incrementar nossa infraestrutura de transporte público e essa é uma área que pode fazer sentido para grandes grupos econômicos brasileiros" (Crédito: Divulgação)

Por Celso Masson

A assinatura do Acordo de Livre Comércio com o Brasil, em novembro de 2018, foi um marco para o Chile. Considerado um instrumento moderno por estar em consonância com as dinâmicas atuais da economia internacional e ambicioso por suas metas de integração regional, em particular no âmbito da aproximação entre o Mercosul e a Aliança do Pacífico, ele facilita investimentos entre ambos os países, tanto de bens quanto no setor de serviços. Do lado chileno, a instituição responsável por catalisar a expansão da carteira de exportações é a ProChile, agência governamental criada há 50 anos dentro do Ministério de Relações Exteriores. Segundo o presidente da entidade, Ignacio Fernández, ela também apoia a difusão de oportunidades para investir no Chile e o turismo no país. Em sua mais recente visita a São Paulo, onde liderou rodadas de negócios que envolveram até a divulgação do pisco, um destilado à base de uvas originário do Peru e também produzido no Chile, Fernández afirmou que, desde 2003, as exportações de cobre para o Brasil tiveram aumento de 896,2%, passando de US$ 392 milhões para US$ 3,9 bilhões. E o minério não foi único item da pauta de exportações a ter alta significativa. “O setor da aquicultura, representado pelo salmão e pela truta, registrou um aumento de 429%, evidenciando o dinamismo e a capacidade de inovação da indústria chilena”, afirmou. Segundo o diretor da ProChile, o objetivo agora é diversificar a lista de itens exportados e atrair investimentos brasileiros em áreas estratégicas como agronegócio, infraestrutura e mobilidade.

DINHEIRO — Quais os efeitos práticos do Acordo de Livre Comércio Brasil-Chile até agora?
Ignacio Fernández — Com a entrada em vigor do acordo, o Chile não só reforçou a sua posição em setores já estabelecidos como também assistiu a um florescimento na variedade da sua oferta exportável, incluindo uma gama mais ampla de produtos manufaturados e agroindustriais. Isso reflete uma estratégia bem-sucedida de adaptação a novas oportunidades e preferências de negócios geradas por mudanças nas tendências de consumo. O acordo tornou-se uma plataforma eficaz para consolidar a imagem do Chile como fornecedor versátil e confiável na região da América Latina.

“Nos interessa promover no Brasil o que eu chamo de soluções globais: empresas que fornecem bens e serviços para os setores em que o
Chile é exportador de classe mundial”

Que setores foram mais beneficiados diretamente?
Eu destacaria três segmentos que cresceram bastante de 2018 a 2022. As exportações de carnes de aves tiveram alta de 220%. Produtos como ripas e perfis de madeira cresceram 89,8%. Pneus e câmaras de ar, 31,7%. A diversificação tornou-se ainda mais evidente desde a criação do acordo. Agora estamos trazendo cerca de 50 empresas exportadoras chilenas e as reunimos com cerca de 70 importadores brasileiros. Criamos 300 reuniões de negócios. Do governo chileno vieram representantes da secretaria de relações econômicas internacionais, da secretaria de cultura, do turismo e do InvestChile que é o organismo encarregado de atrair investimentos estrangeiros. Além da diversidade de setores, trouxemos empresas de portes distintos, incluindo o que no Chile chamamos de Pymes (sigla em espanhol para pequenas e médias empresas), que são muito importantes para nós e estão preparadas para exportar. Também trouxemos uma empresa que produz pisco de categoria premium. Esse é um item que, embora esteja entrando só agora no Brasil, pode encontrar um mercado importante na coquetelaria.

O acordo tornou o Brasil um parceiro comercial privilegiado para o Chile?
Se você olhar os números, verá que o Brasil está em terceiro lugar entre os mercados que mais compram produtos do Chile, atrás apenas da China e dos Estados Unidos. O Brasil é um destino tremendo para nós no âmbito das exportações e tem um potencial muito grande também em termos de capacidade de investimento. Cito, por exemplo, o setor de mobilidade. Precisamos incrementar nossa infraestrutura de transporte público e essa é uma área que pode fazer sentido para grandes grupos econômicos brasileiros. Não sou especialista em mobilidade urbana, mas Santiago, por exemplo, tem um plano de transporte público que integra ônibus e metrô. Então existe uma possibilidade para o Brasil, que é produtor de ônibus, inclusive elétricos, que ajudariam a reduzir a poluição atmosférica em Santiago. Para empresas que são brasileiras, diante das vantagens oferecidas pelo Acordo de Livre Comércio, a nossa intenção é que elas não apenas exportem, mas que participem da infraestrutura do nosso transporte.

Que outros setores podem atrair investidores brasileiros?
Temos economias complementares. O Brasil é gigante. Eu consideraria o hidrogênio verde, que também é estratégico para o futuro da mobilidade limpa e algumas empresas brasileiras estão bem avançadas nesse setor. Assim como em toda a cadeia do agronegócio, onde a liderança brasileira é inquestionável. Podemos criar parcerias para transferência tecnológica em áreas nas quais o Chile tem interesse em se desenvolver. É sempre bom lembrar que criamos um marco institucional muito vigoroso, que nos dá a diretriz em termos de comércio e estabelece a devida equivalência, o que nos permite potencializar muito os produtos chilenos. O Brasil é o primeiro importador de diversos gêneros alimentícios do Chile. Além do salmão, há um grande consumo de frutas secas, como nozes, e também de frutas frescas. Queremos continuar a promover esse mercado e trabalhar juntos para introduzir tecnologias que o Brasil domina. Por fim, eu colocaria um nicho que nós ainda não desenvolvemos totalmente, que é o setor de serviços.

De que forma os serviços podem entrar na pauta comercial dos dois países?
Nos interessa promover no Brasil o que eu chamo de soluções globais. O que isso significa? O Chile tem certos setores de exportação de classe mundial: a mineração, o setor florestal, a agroindústria da piscicultura, a indústria do vinho etc. E há um grupo de empresas chilenas que fornecem bens e serviços para esses setores. Na viticultura, por exemplo, existem pequenas empresas chilenas que fornecem tudo o que tem a ver com a elaboração de vinhos, assim como no caso do salmão. Temos serviços especializados como treinamentos para lidar com grandes caminhões em pisos escorregadios devido à neve ou gelo. O mesmo vale para a cadeia de frio que utilizamos nas exportações para a China e outros países. Há muitas empresas chilenas que prestam serviços especializados para grandes indústrias globais e estamos tentando fazer com que esses fornecedores possam ir para outros países, exportar bens e serviços com muito valor agregado. O Chile tem excelente infraestrutura portuária ao longo do Pacífico.

Existe algum projeto de integração logística que facilite as exportações brasileiras para a Ásia?
Estive na fronteira norte do Chile com uma delegação do interior do Brasil que se mostrou muito interessada em exportar para os países asiáticos. Há de fato muitas questões de investimento que têm a ver com a expansão dos portos ou mesmo com a melhoria das rotas de infraestrutura para que possam acessar os portos chilenos e de lá navegar pelo Pacífico. Como não temos fronteiras com o Brasil, essas rotas precisam passar por outro país, mas na parte chilena há muito que fazer em termos de infraestrutura. Há uma intenção bastante grande de vários estados do Centro-Oeste e do Sudeste, as fronteiras agrárias mais fortes.

O mercado de vinhos finos no Brasil é liderado pelo Chile, mas o pisco ainda é uma bebida pouco conhecida por aqui.Por que decidiram investir na divulgação dele só agora?
Acreditamos que o pisco tem muito potencial para crescer na área da coquetelaria, por isso uma parte da nossa agenda no Brasil foi dedicada a workshops de drinques com essa bebida. O mercado brasileiro é muito grande, então uma bebida que seja consumida em larga escala por aqui pode fazer a produção chilena alcançar recordes. Como os recursos da ProChile são escassos, não temos condições de fazer campanhas como fazem as grandes vinícolas ou as marcas globais de destilados. Por isso nosso trabalho de introduzir o pisco chileno no Brasil envolve mais que apenas colocar o produto para ser degustado. Entendemos que é preciso contar a história, falar da região e, claro, mostrar que nós confiamos na qualidade do produto que estamos promovendo. Em última análise, o pisco vem do vinho, então tem toda uma história para ser contada para quem já gosta do vinho chileno.

“Estamos perto da marca de 450 mil turistas brasileiros, mas há uma enorme possibilidade de crescimento desse número em um país onde há mais de 200 milhões de habitantes”

Quem gosta de vinho chileno tende a gostar de pisco?
Faz sentido que num país onde o vinho chileno esteja muito bem posicionado, como é o caso do Brasil, o pisco também seja prestigiado. É um passo lógico. Mas isso não significa que a adesão será instantânea. O crescimento do consumo também será passo a passo. Há um trabalho a fazer do ponto de vista da educação do consumidor. Mostrar que uma bebida deriva da outra, por outro lado são diferentes. Eu diria que provavelmente no começo o que iremos fazer é trabalhar sobretudo com os bartenders. Explicar como é o produto, como identificar as qualidades. Já fizemos competições de drinques com pisco em outros países.

Como o turismo entra na conta das exportações chilenas para o Brasil?
O turismo também é outra questão muito importante. Tínhamos como prioridade a recuperação aos níveis anteriores à pandemia. Estamos trabalhando nisso e ficamos muito felizes porque especificamente o turismo do Brasil aumentou consideravelmente em relação ao ano anterior. Apenas de janeiro a setembro de 2023 já havíamos recebido mais turistas brasileiros do que ao longo de todo 2022. Estamos perto da marca de 450 mil turistas brasileiros, mas há uma enorme possibilidade de crescimento desse número em um país com mais de 200 milhões de habitantes.

Além da capital, Santiago, e das estações de esqui, os brasileiros têm buscado outros destinos no Chile?
O grande volume de turistas ainda é formado pelos que querem esquiar no inverno, já que o Brasil não oferece essa condição e o Chile está mais perto do que Estados Unidos e Europa. Mas há um terceiro vetor de crescimento que são dois extremos geográficos: a Patagônia, ao sul, e San Pedro de Atacama, ao norte. Agora muitos procuram também a Ilha de Páscoa. O Chile é um país que tem muitos atrativos para o visitante.