Uma reforma que não chega
Por Carlos José Marques
O longo e tortuoso caminho que ainda tem de ser trilhado pela reforma tributária antes de sua efetiva aplicação no País vai deixando sinais de que a demora pode ser ainda maior até a regulamentação almejada. Ano eleitoral, como o atual, tem dessas coisas. Todo mundo voltando as baterias para outras prioridades. O presidente da Câmara, Arthur Lira, para deixar marcas de seu mandato em fim de prazo, quer por sua vez resgatar um cronograma para o avanço dos trabalhos e reclamou do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o que vem classificando como “um vácuo” sem sentido após a aprovação do projeto na virada do ano. Lira quer o envio, o quanto antes de uma lei complementar para estabelecer as regras da reforma. Ele teme, segundo apontou numa reunião com empresários, um retrocesso que possa colocar tudo a perder. “Se demorarmos mais, a reforma pode entrar em um ciclo de dificuldades sem fim”, apontou. Haddad, por sua vez, havia decidido que não iria mesmo respeitar o prazo de 90 dias previsto na emenda constitucional da reforma que contemplava o envio das sugestões de mudanças na cobrança do Imposto de Renda. A data-limite venceu na última terça-feira, 19, e de fato a proposta não foi encaminhada. No Congresso, o atraso foi criticado. O clima não segue bom nesse aspecto. O fato é que o governo está de olho no que entende como outras prioridades do projeto. Para ele, interessa muito mais colocar logo em prática a tributação do consumo, cuja expectativa é a da costura de um arcabouço final até meados de junho. Todas essas pendências, decerto, precisam entrar em um calendário deste primeiro semestre para que não sejam definitivamente engolidas pelas eleições municipais, que galvanizam corações e mentes dos parlamentares e partidos. Qualquer adiamento para além desse período pode colocar em xeque a rota pretendida, empurrando tudo para um ano fiscal seguinte. Os efeitos desastrosos nesse sentido podem se estender inclusive para a imagem do País, que teve a sua classificação de risco frente a investidores internacionais melhorada nos últimos tempos justamente no rastro do projeto recém-aprovado. Também para os brasileiros em geral, que aguardam há décadas pelas mudanças, seguir com a atual carga se torna um fardo pesado demais a cada dia. O governo protela passos alegando a demora dos estudos e análises para evitar a feitura de “um projeto ruim”. A justificativa é frágil. Disposição para manter o calendário é parte importante dessa cruzada. Quanto antes passar o pente fino nas pendências, mais ágil será a implementação dessa que vem sendo a mais esperada das reformas. Haddad garante que a tributária sairá do papel ainda em 2024 e joga para o relator a responsabilidade de seu rápido andamento nas casas legislativas. Nesse jogo de empurra o Brasil já aguardou tempo demais e jogou fora bilhões de reais pela burocracia gerada no manicômio tributário em vigor. As autoridades envolvidas na questão deveriam estar conscientes de que cada atraso conta contra o desenvolvimento nacional e o crescimento econômico sadio e sustentável.