ESG

Dislexia, TEA, TDAH, Tourette: neurodiversidade impulsiona resultados, diz estudo

Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo alerta para dificuldades de incluir esses profissionais no mercado, mesmo diante de números positivos

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Relatório da consultoria empresarial McKinsey demonstrou que equipes neurodivergentes superam as homogêneas em 36% em rentabilidade (Crédito: Divulgação )

Por Allan Ravagnani

A lei brasileira garante às pessoas no Transtorno do Espectro Autista (TEA) a participação no mercado de trabalho. No entanto, mesmo com o aumento das informações sobre o tema, esta inclusão ainda é um desafio. O Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo, celebrado em 2 de abril, foi criado pela ONU para difundir informações sobre o transtorno e reduzir a discriminação. Estudos já mostraram as diversas vantagens de se ter uma equipe profissional diversa.

No Brasil, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 85% dos profissionais com algum grau de autismo estão fora do mercado. Além do preconceito, há dificuldade dos gestores em identificar talentos, adaptar o ambiente e treinar equipes para acolher esses profissionais. As pessoas com TEA exibem condições caracterizadas por algum grau de dificuldade na interação social, padrões atípicos de atividades e comportamentos repetitivos, podendo apresentar um repertório restrito de interesses e atividades.

Apesar das dificuldades, o relatório ‘A diversidade vence: como a inclusão é importante’, produzido pela consultoria empresarial McKinsey, demonstrou que equipes neurodivergentes superam as homogêneas em 36% em termos de rentabilidade. “Integrar profissionais neurodivergentes é uma forma de trazer novas visões, inovações e alavancar o negócio”, afirmou o CEO da Otimiza Benefícios, Anderson Belem.

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“A inclusão dos neurodivergentes não deve ser vista como um favor ou ação social, mas como estratégia para aumentar os ganhos.”
Anderson Belem, CEO da Otimiza Benefícios

Diagnosticado com TDAH apenas aos 40 anos, Belem sentiu na pele o que é ser diferente. “Trilhei um caminho repleto de mal-entendidos e oportunidades perdidas até a fundação da minha empresa, que nasceu justamente dessa visão diferenciada das coisas e levou à reengenharia no modelo de benefício do vale-transporte, poupando milhões de recursos que eram desperdiçados anualmente”, afirmou.

Atualmente, cerca de 15% da população mundial é classificada como neurodivergente. São pessoas que, em situações específicas, respondem de forma diferente ao que seria o padrão esperado, o que pode provocar até mesmo dificuldades de adaptação. Dislexia, TEA, TDAH e síndrome de Tourette são alguns exemplos. “É preciso desmistificar a neurodivergência no mercado de trabalho e apresentar os benefícios da pluralidade e diversidade acima de tudo. A verdadeira superação está em aceitar as singularidades e entender que a inovação nasce da diversidade”, disse Belem.

Para Valmir Santos, CEO da Biomob, startup especializada em consultoria e soluções de acessibilidade, as empresas precisam priorizar a pluralidade, no entanto, a realidade ainda está muito longe de alcançar a inclusão de pessoas neurodivergentes. “Seja no ambiente corporativo ou escolar, é necessário desenvolver estruturas e ferramentas, além de contar com uma cultura de acolhimento social adequada para que isso ocorra”, afirmou.

Santos apontou ser comum no ambiente de trabalho que a equipe subestime a capacidade e aptidão de pessoas com deficiência, o que é traduzido pelo capacitismo. “O debate sobre o descumprimento da legislação que garante o direito e participação plena da pessoa com deficiência na sociedade ainda é pobre e isso se dá muito por conta do capacitismo, que acontece quando a deficiência é posta acima da pessoa. Ele é traduzido por situações como um olhar de pena, uma pergunta invasiva, ou uma tentativa de elogio e manifesta preconceito no dia a dia”, disse Santos.

GANHOS

Para o especialista em governança corporativa Roberto Gonzalez. os traços neurodivergentes se manifestam de diferentes maneiras, em diferentes graus e podem representar ganhos às organizações quando bem direcionados.

Uma das características dos profissionais com TEA é o hiperfoco, que faz com que sejam mais detalhistas e analíticos, habilidades que são de extremo valor para áreas como TI, por exemplo.

Além disso, são mais produtivos quando contam com rotina e um bom planejamento. “É preciso desmistificar uma série de estereótipos quando falamos de contratar uma pessoa autista. O alto escalão da empresa deve se envolver na questão para entender o perfil do profissional e atribuir funções que estejam relacionadas às suas habilidades pessoais e ao seu foco de interesse. Dentro desta visão, todos tendem a ganhar”, disse.

DADOS CONSERVADORES

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), existem cerca de 70 milhões de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) no mundo. As estimativas oficiais apontam que o transtorno está presente em 2 milhões de brasileiros. Esses números, no entanto, podem ser conservadores, pois muitos não recebem o diagnóstico correto na infância e atingem a vida adulta sem saber que tem TEA.

O relatório do CDC (Centers for Disease Control and Prevention) de 2023 sobre Autismo, retrata que uma em cada 36 crianças aos 8 anos de idade é diagnosticada com TEA nos EUA. Se a estatística for extrapolada para a população brasileira, o número pode chegar a quase 6 milhões de pessoas. No Censo de 2022 o tema foi incluído pela primeira vez, mas os resultados ainda não foram divulgados pelo IBGE.

PROTEÇÃO

A lei 2.764 de 27 de dezembro de 2012 (conhecida como Lei Berenice Piana) instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa TEA. Sua inserção no trabalho também é garantida pela lei de Cotas para Pessoas com Deficiência (8.213/91). A legislação determina as proporções para empregar pessoas com deficiência, que variam de acordo com a quantidade de funcionários (de 100 a 200 empregados, a reserva legal é de 2%; de 201 a 500, de 3%; de 501 a 1.000, de 4% e acima de 1.001, 5%).