PayPal: o gigante quer acordar?
Por Norberto Zaiet
Algumas companhias têm uma posição tão dominante em seus mercados que a gente passa a tratá-las como parte do cotidiano, perdendo um pouco a perspectiva de quão grande se tornaram. A PayPal Holdings (NASDAQ: PYPL) é uma dessas empresas: uma gigante, parte integral do nosso dia a dia e, apesar disso, completamente ignorada por um mercado sempre em busca de crescimento.
A companhia nasceu de uma fusão entre a PayPal original, fundada por Peter Thiel, e uma outra empresa que operava no mesmo segmento chamada X.com, que havia sido criada em 1999 por um certo empreendedor sul-africano que gosta muito dessa letra. Elon Musk queria criar um banco digital completo, uma mistura do que conhecemos hoje como on-line banking, mas com certos requintes do que viria a ser o embasamento para as criptomoedas. Segundo Walter Isaacson, que o biografou, “Musk considerava que as transações monetárias eram simplesmente uma linha em uma base de dados, e ele queria inventar uma maneira pela qual todas as transações fossem registradas de maneira segura e em tempo real”.
Não chegou lá — ainda, afinal o Twitter não passou a se chamar X por mera coincidência —, mas o conceito de registrar transações de pagamento eletrônico floresceu. Logo depois do seu IPO, em 2002, a empresa foi comprada pelo eBay. Anos mais tarde foi segregada, voltando a negociar em bolsa como uma companhia independente.
O fato é que hoje, cerca de 25% de todo o e-commerce mundial passa pela sua plataforma. Sua penetração no comércio eletrônico norte-americano é de 80%, bem maior que as fatias de 36% do Apple Pay e 32% do Google Pay. Essa posição de dominância não se aplica apenas ao mercado americano: o PayPal tem penetração de 80% ou mais no Brasil, Alemanha, México, Itália, Espanha, França, Áustria, Canadá, Inglaterra e Austrália. Mesmo no offline sua posição é relevante: entre 40% e 50% de penetração na maioria desses países.
Cerca de 25% de todo o e-commerce mundial passa pela plataforma. Sua penetração no comércio eletrônico norte-americano é bem maior que as fatias de Apple Pay e Google Pay
Mais de 30 milhões de estabelecimentos comerciais, pequenos e grandes, fazem parte da sua rede, além de mais de 400 milhões de consumidores. A Venmo, que está no seu ecossistema, possui mais de 90 milhões de usuários. Não resta dúvida da sua posição de liderança no hemisfério ocidental.
A pandemia foi um grande motor de crescimento. O valor total de pagamentos processados por meio da plataforma chegou a crescer mais de 40% no comparativo ano a ano, durante 2020 e 2021. A competição surgiu mais forte, atacando o mercado de maneira efetiva e, com o retorno a normalidade, a companhia estagnou. Seu valuation hoje reflete o de uma empresa que se perdeu na sua própria grandeza — apesar de geradora de caixa e de ainda manter posição de dominância, negocia a um múltiplo de 12 vezes o lucro projetado.
Investir em PayPal nesses preços significa acreditar que a nova gestão será bem-sucedida em reduzir as fricções na utilização de plataforma, tanto para os comerciantes quanto para o consumidor, e produzir crescimento rentável.
Além disso, ela tem um banco de dados extremamente valioso. O PayPal sabe quem comprou o que, de quem, quando, e com qual frequência. Atualmente essa base está ali, sem uso, mas com um potencial enorme de geração de valor, especialmente no contexto dessa onda de IA pela qual estamos passando. Arriscaria a dizer que uma empresa com esse banco de dados e essa rede interligada é uma oportunidade extremamente barata para uma big tech que esteja atenta. Vale a pena acompanhar.
Norberto Zaiet é economista, ex-CEO do Banco Pine e fundador da Picea Value Investors, em Nova York