O enigma da sucessão em empresas familiares
Por César Souza
A maioria das empresas familiares não resiste ao desaparecimento dos seus fundadores. A sucessão continua sendo o maior “calcanhar de Aquiles” desse tipo de negócio. Infelizmente, os casos de sucesso são mais exceção do que a regra, em especial quando trata-se da passagem da segunda para a terceira geração. Contam-se nos dedos aquelas que conseguiram ser tocadas pela quarta geração da família.
Quando começam a pensar, muitas vezes tardiamente, sobre a mudança de bastão, inúmeros fundadores são atormentados pela dúvida atroz da escolha entre membros da família ou profissionais de mercado.
Um mergulho no histórico de vários casos deixa claro que não existe solução mágica nem resposta única para este dilema. Podem ser identificados casos de sucesso tanto em situações em que a liderança foi passada para membros da família quanto para profissionais de mercado, assim como também para executivos que já ocupavam cargos relevantes na própria empresa.
Da mesma forma, lamentavelmente existem histórias de fracasso nas três hipóteses: membros da família que não estavam preparados para assumir o comando e só conseguiam se impor pelo sobrenome; competentes profissionais contratados fora da empresa que não conseguiram se adaptar às idiossincrasias da dinâmica familiar; executivos da empresa guindados para a posição que acabam sendo atropelados por circunstâncias inesperadas, ou cujo manequim provou ser diferente da nova vestimenta que exigiam que fosse usada.
O que pode ser feito para mitigar os riscos de fracasso e aumentar as chances de êxito na sucessão? Uma breve análise dos acertos e erros mais comuns pode trazer alguma luz para que melhor decifremos este enigma:
• Sucessão e Estratégia precisam andar de mãos dadas. A decisão sobre o sucessor deve estar atrelada à estratégia da empresa para os próximos anos. O maior erro tem sido planejar a sucessão olhando pelo espelho retrovisor com base no que deu certo no passado. A escolha do melhor perfil precisa ser coerente com o próximo patamar, ou seja, com o futuro onde a empresa deseja chegar.
• Sucessão precisa cuidar tanto do sucessor quanto do sucedido. Muitas iniciativas negligenciam o papel que o sucedido deve desempenhar, sem um claro contrato de expectativas da óbvia interface que deverá existir entre ambos. Importante que o sucedido se prepare para participar ativamente, mas delegar a execução para o sucessor.
• Clareza sobre a diferença entre substituto e sucessor. A falta de transparência entre esses distintos papéis tem sido um erro recorrente, pois quem atua como substituto não, necessariamente, carimba seu passaporte como sucessor.
• Adoção do critério da “Meritocracia Saudável”, que vai muito além da entrega de resultados. Outros fatores devem compor a avaliação para a escolha do sucessor: a adesão aos valores e cultura da empresa; a identificação com o tipo do negócio; o encaixe entre o perfil da pessoa e o momento da empresa, pois tem profissionais ótimos em momento de decolagem, mas inadequados numa fase de estabilização ou de turnaround.
A sucessão não deve ser pensada como um momento, pois não é um fato isolado, mas um ´processo. Exige tempo de maturação e muita preparação prévia, que pode levar alguns anos para se concretizar com sucesso. O maior erro cometido pelos fundadores é que só iniciam o processo quando acontece uma situação indesejada e inesperada — acidente, doença, desaparecimento prematuro. Porque a grande maioria dos fundadores insista em apostar numa premissa de longevidade que raramente se comprova?
Quando se trata da sucessão em uma empresa familiar temos de considerar dois núcleos umbilicalmente ligados e que o sucesso de um não pode ser em detrimento do outro: o Negócio e a Família. Daí a importância de evitar precipitações em um assunto sensível e delicado cujo sucesso depende de uma sábia arquitetura negocial e emocional.
César Souza fundador e presidente do Grupo Empreenda