Economia

O Brasil que Lula vê

Presidente quer montar uma agenda com propósitos de País até 2050, redobrar atenção à economia verde e garantir que os próximos governos sigam as mesmas diretrizes. Será?

Crédito: Ricardo Stuckert

Para evitar que o Congresso não avance com os temas, governo Lula estuda meios de colocar agenda com normas administrativas (Crédito: Ricardo Stuckert )

Por Paula Cristina

É muito comum encontrar nos discursos de Lula falas sobre o que ele espera do Brasil. Planos sobre redistribuição de renda, competitividade da indústria, transição energética e liderança na economia verde são alguns dos temas mais recorrentes quando o petista resolve prospectar o futuro do Brasil. Entre os desejos e a realidade, no entanto, tem a imponderável realidade. E ela pode ser bastante frustrante. Em 2003, quando assumiu sua primeira gestão, Lula previa que, duas décadas depois, o Brasil já teria deixado de ser meramente um exportador de commodity, que estaria entre as cinco maiores economias do mundo e o Mercosul teria estrutura similar à União Europeia (tudo isso pode ser encontrado no discurso do presidente na abertura das 58ª e 59ª assembleias da ONU). Agora, mais experiente, o presidente Lula pretende fazer de seu prospecto de País uma agenda — e regulamentar seus termos por meio de leis.

Trata-se de uma agenda para orientar políticas públicas prioritárias para o Brasil até 2050, versando sobre temas como a tão esperada transição energética, redução do desmatamento e compensação ambiental, além de melhoras nos índice de desenvolvimento humano e de alfabetização. A ideia é desenvolver um texto que funcione como um Plano Plurianual (PPA), mecanismo previsto pela Constituição para quatro anos — e transforma-lo em norte por cinco décadas. “Há o Brasil que vemos, e o Brasil que queremos. É por ele que eu trabalho”, afirmou a ministra do Planejamento, Simone Tebet, à DINHEIRO. Segundo a Pasta, temas como clima, infraestrutura, macroeconomia e transição energética também estão na mesa e fazem parte da discussão.

Plano do governo é aproveitar a COP 30, que acontecerá no Brasil, para lançar as diretrizes para os próximos 25 anos. Temas como transição energética, infraestrutura e distribuição de renda vão estar na pauta

Para avançar com este assunto nos moldes da PPA, o governo teria que colocar o tema no Legislativo, e esse é ponto de inflexão entre os ideais de Lula para o Brasil e a realidade de um presidencialismo de coalizão — e chefes do Legislativo com poderes de primeiro ministro.

Antevendo a potencial defenestração de sua agenda pelo Congresso (exatamente como aconteceu, em 2008, com o Estudo da Dimensão Territorial para o Planejamento) assessores do presidente confirmaram à DINHEIRO que o plano é regulamentar a agenda por meio de medidas normativas, evitando entrar em conflito com o Parlamento.

A ideia é trazer soluções no bojo da política pública, em uma ação multiministerial com diretrizes para nortear as futuras gestões da República. Para jogar mais holofote no assunto, o presidente pretende anunciar a nova agenda em um evento internacional. O mais cotado seria aproveitar a 30ª edição da Conferência do Clima (COP), que acontecerá no Brasil em novembro do ano que vem. A assinatura de governadores e prefeitos também serviria para fortalecer a agenda.

Ministra do Planejamento, Simone Tebet diz que diretrizes serão montadas em um esforço conjunto de todos ministérios (Crédito:Washington Costa)

LEGISLATIVO

Procurado pela reportagem, o presidente da Câmara, Arthur Lira, não se manifestou sobre o assunto, mas deputados aliados ao chefe da Casa disseram ser difícil que o parlamento aprove o que ele chamou de “pauta ideológica travestida de política pública”.

Em condição de anonimato, um deputado afirmou que o Parlamento já tem discutido pautas de longo prazo, e que Lula quer apenas monopolizar estes temas em ano de eleições municipais. Nas base governista o tom é outro.

Airton Faleiro, do Pará, afirmou que o Congresso não se isentará das discussões e sabe da importância de agendas de longo prazo para balizar o crescimento do Brasil. “Sempre somos acionados para resolver pepinos que já estão em curso. Quando somos convidados a fazer parte de um projeto de antecipação, tratamos como se não fosse relevante”, afirmou.

Simone Tebet, que foi senadora, afirma que o espaço de diálogo no Parlamento continua aberto e o governo tem interesse em discutir agora assuntos que vão fazer diferença na vida da população nas próximas décadas. A discussão, no entanto, reside em entender se o projeto de país que Lula vê, e o que o Congresso vê tem mais similaridades ou diferenças — e a história recente já nos dá indício da resposta.