S&P500 e Tech: até o benchmark ficou mais arriscado
Por Norberto Zaiet
O índice S&P 500, que reúne as 500 empresas líderes nas bolsas norte-americanas, é um dos principais benchmarks utilizados na indústria para medir a performance dos gestores de capital especializados em renda variável americana.
O objetivo de quem administra dinheiro de maneira ativa é superar esse indicador: o gestor que bate o S&P 500 de maneira consistente ao longo do tempo atrai capital, pois consegue, por meio de uma atuação ativa no mercado, gerar mais retorno para o investidor.
Como não existe almoço grátis, para bater o benchmark o gestor assume, em teoria, mais risco. A gestão ativa de portfólios envolve um nível de concentração maior do que o do mercado em geral. Um gestor especializado em value investing, por exemplo, administra um portfólio concentrado em poucos nomes: casos que foram selecionados em um processo metódico, analisados profundamente e acompanhados com lupa 24 horas por dia, sete dias por semana. Já a gestão passiva, por exemplo, de um ETF que acompanha o S&P 500, mantém o portfólio espalhado nas 500 empresas que compõem o índice, na exata proporção que cada uma possui na sua composição. Em tese, o investidor passivo em um ETF seguindo o S&P 500 corre menos risco, uma vez que sua carteira está diversificada, aplicada nas 500 maiores e melhores empresas do mercado. No meio do caminho entre o value investor e o gestor passivo há uma serie de estratégias que, com maior ou menor grau, envolvem concentração em determinados setores da economia ou nomes específicos — quando comparados com o benchmark.
Ao final de 2018, o setor de tecnologia representava cerca de 17% do S&P 500. O setor de serviços de comunicação (“communication services”), que abriga nomes como Google, Meta e Netflix, outros 10%. O setor de tecnologia, portanto, era responsável por cerca de 27% do mercado. Depois da pandemia, ao final de 2021, esses dois setores combinados chegaram a 36% do índice. Hoje são 41%.
Se olharmos para empresas específicas, a coisa fica ainda mais séria. Em 2018, Apple representava cerca de 3% do índice, assim como Microsoft, Amazon e Google (contando as duas classes de ações). Meta representava cerca de 1,5%, e Nvidia era coisa de quem entendia de tecnologia e gostava de jogar videogame. Hoje, Apple representa cerca de 7% do índice total, assim como Microsoft e Nvidia. Google tem pouco mais de 4%, Amazon possui aproximadamente 3% e Meta alcança por volta de 2%. É isso mesmo: apenas seis companhias compõem aproximadamente 30% do S&P 500.
Sem questionar o mérito das empresas e da gestão, que, de fato, entregou — e continua entregando — resultados extraordinários, o nível de concentração em poucos nomes não deixa de ser extravagante. Mesmo gestores acostumados a administrar recursos de maneira mais arrojada sentem um certo desconforto. O nível de concentração chega a ser tão grave que, em semanas recentes, observamos dias em que o índice caia simplesmente porque caíam o preço das ações dessas poucas empresas, mesmo quando as outras 494 estavam em alta.
Seguir o S&P 500, hoje em dia, é tão arriscado quanto colocar o dinheiro na mão de um gestor que administra capital ativamente. Grande parte dos gestores com quem converso não possuem níveis de concentração em setores ou empresas da maneira que o índice sugere, pois fazer isso vai contra o manual da boa gestão de riscos. O que era sinal de diversificação se transformou, em poucos anos, no contrário disso.
Como consequência, boa parte dos gestores ativos vem tendo dificuldade de superar o índice. Afinal, com o S&P 500 nesse nível de concentração, quem precisa de gestão ativa?
Norberto Zaiet é economista, ex-CEO do Banco Pine e fundador da Picea Value Investors, em Nova York