Economia

Entenda o paradoxo do Minha Casa, Minha Vida e o que deve ser feito

Crédito: Ricardo Stuckert

Para tentar lidar com a situação, o governo tem estudado alternativas para tirar a pressão dos gastos, sem diminuir o ritmo de fomento econômico (Crédito: Ricardo Stuckert)

Por Paula Cristina

RESUMO

• 600 mil contratos assinados, construtoras felizes, aumento dos empregos e incentivo à economia.
• Tudo ótimo, não fosse um detalhe: quanto maior o programa se torna, mais frágil ele fica

O termo paradoxo, usado quando uma afirmação se sustenta em um contrassenso lógico, é perfeito para explicar o dilema que o governo Lula enfrenta com o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida. O Brasil tem hoje um déficit de moradia de 6,2 milhões de unidades habitacionais. O governo, com bases populistas, tem interesse em garantir condições para que os cidadãos adquiram suas residências. A iniciativa privada clamava há anos por fomento à categoria, e tem se esbaldado com o programa. Tudo perfeito? Sim, não fosse o paradoxo.

O forte ritmo de contratação com subsídio, que bateu recorde em 2024:
 pressiona as contas do governo,
deixa as construtoras temendo um calote,
e atrasam os planos dos brasileiros interessados na casa própria.

E esse é o paradoxo.

Quanto mais forte e estruturado é o Minha Casa, Minha Vida, mais frágil e insustentável ele fica.

Para tentar lidar com a situação, o governo tem estudado alternativas para tirar a pressão dos gastos, sem diminuir o ritmo de fomento econômico. Uma das saídas seria frear o avanço dos financiamentos de imóveis usados já que, no entendimento da cúpula econômica de Lula, imóveis novos geram mais empregos. O programa habitacional deve fechar o ano com quase 600 mil financiamentos, um recorde. Esse saldo inclui contratações de imóveis novos e também usados.

A pressão destes números, no entanto, acontece no orçamento do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), que viabiliza as contratações do programa social. Em abril o governo já começou a apertar o cinto. Mas não bastou. Será preciso mais. A medida em avaliação é elevar o valor da entrada exigida nos financiamentos do Minha Casa, Minha Vida para a Faixa 3 do programa (famílias com renda de R$ 4,4 mil até R$ 8 mil) que queiram comprar imóvel usado. As famílias com renda menor que R$ 4 mil, não serão impactadas.

(Ricardo Stuckert)

“Estamos constantemente em conversas com a Casa Civil para ajustarmos [o programa] sem prejudicar as faixas já beneficiadas.”
Jader Filho, ministro das Cidades

À DINHEIRO, o ministro das Cidades, Jáder Filho, afirmou que o programa passa por avaliações de tempos em tempos e não se trata de um corte, mas de uma adaptação. Ainda que ele reconheça que há pontos de dificuldade para o financiamento. “Estamos, constantemente, em conversas com a Casa Civil para ajustarmos de uma forma que não penalize nenhuma das faixas”, afirmou o ministro, que prevê uma solução para as próximas semanas.

Ele não confirmou, entretanto, que os imóveis usados sofrerão o maior golpe.
No início do ano, as famílias da Faixa 3 precisavam dar de entrada pelo menos 20% do imóvel.
O valor máximo da casa ou apartamento para esse perfil é de R$ 350 mil.
Em abril, o governo já enfrentava um aperto no orçamento do FGTS.
Por isso, aumentou o valor da entrada para famílias da Faixa 3 nas regiões Sul e Sudeste para 25% a 30% dependendo da renda familiar.
Agora, o governo quer ampliar essa exigência para a entrada e que ela passe a valer para todo o País. Ainda não há a decisão final de qual será o novo patamar.

E, aqui, outro dilema. Os imóveis usados tendem a ser mais baratos – o que beneficia a população mais carente. Só que imóveis novos acabam gerando mais emprego.

“Este assunto é delicado e precisa ser decidido com equilíbrio. Não pode ser uma troca simples, ou uma substituição arbitrária.” De acordo com o último balanço do Ministério das Cidades, os imóveis usados representaram 30% dos 600 mil contratos do Minha Casa em 2024. Em 2021, essa fatia era de 6,25%.

“A meta do presidente Lula, de proporcionar 2 milhões de unidades habitacionais, neste ritmo, precisará ser aumentada”, afirmou Jarder Filho.

Em 2023, foram 860 mil novos contratos e, segundo o ministro, reflete uma demanda fortemente represada pela crise, falta de incentivo e alto juros dos últimos anos.
E ainda que as coisas tenham piorado na crise (já que o déficit de moradias cresceu 4,2% entre 2019 e 2022, segundo Fundação João Pinheiro) o problema habitacional no Brasil atravessa gerações.
 E carrega, mais um paradoxo: 12 milhões de casas vazias (segundo o Censo 2021) e 6 milhões de famílias sem casas.