Por que ESG não é uma moda que vai passar na próxima primavera?
Por Ricardo Voltolini
Já foi mais frequente, é verdade. Mas ainda há quem insista em cravar que sustentabilidade é uma moda corporativa com data de validade para a próxima primavera. Com o ESG, não tem sido diferente. Incentivados pela narrativa ideológica sobre a morte prematura do ESG, ou mesmo convencidos de que empresas têm uma natureza má e ardilosa, os incrédulos seguem apostando no apocalipse de um movimento para cujo fim parecem torcer por torcer.
Em resposta aos descrentes, costumo usar como contraponto dois cenários poderosos.
● Um é o da emergência climática. Apesar das reiteradas súplicas dos cientistas e do esforço da ONU por colocar em ação um acordo climático efetivo para a humanidade, os dados indicam que estamos na contramão. Nos últimos anos, aumentamos o volume de emissões de GEEs. Para piorar, os países mais emissores insistem em não cumprir as metas combinadas no Acordo de Paris. A conta não está fechando. E não vai fechar: conforme a Organização Meteorológica Mundial (OMM), ultrapassaremos a marca de 1,5º C em um dos próximos cinco anos.
● O outro cenário é geracional. Os millenials (24 a 39 anos) estão assumindo o poder. No topo da pirâmide econômica, representam hoje quase um terço da população global (1,8 bilhão de pessoas). Em 2030, segundo o Banco Mundial, terão nas mãos US$ 4 trilhões. No Brasil, formam 34% da força de trabalho. Serão 70% daqui a seis anos.
Interessados pela bandeira da proteção ambiental, os millenials querem trabalhar, dirigir e comprar de empresas mais sustentáveis, éticas, transparentes e respeitosas em relação às pessoas e ao planeta. Recente pesquisa da Cone Communications confirmou essa tendência: 73% deles estão dispostos a pagar mais por produtos e serviços sustentáveis. Seis em cada dez preferem apoiar marcas mais sustentáveis. Integrantes da geração Z (14 a 29 anos) também têm se mostrado mais conscientes. Preocupados com o impacto socioambiental de suas compras, 67% topam pagar mais quando reconhecem a origem responsável dos produtos.
Interessados pela bandeira da proteção ambiental, os millenials querem trabalhar e comprar de empresas mais respeitosas em relação às pessoas e ao planeta
Arrisco afirmar que o ativismo dessas duas turmas começa a influenciar a mudança de hábitos de compra de outros grupos etários. De acordo com recente pesquisa da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), mais de um terço dos consumidores brasileiros alegam deixar de comprar de empresas envolvidas, por exemplo, em episódios de desrespeito a empregados, colaboradores ou meio ambiente. Dos resultados, vale destacar que 50% dos brasileiros acham que selos e certificações socioambientais são importantes. Para a maioria, o consumo consciente está relacionado com desafios ambientais, como o uso sustentável de recursos da natureza (58%).
Os dados justificam otimismo. Cerca de 31% dos consumidores de itens de higiene e beleza valorizam embalagens recicláveis ou biodegradáveis, 55% dos compradores de eletroeletrônicos levam os equipamentos usados para cooperativas ou reciclagem e quase cinco entre dez usuários de marcas de limpeza preferem refil e embalagens recicláveis.
Segundo a pesquisa Green Divide, da Nielsen, 76% dos brasileiros (no mundo são 69%) consideram a sustentabilidade mais importante hoje do que há dois anos. Para quem, como eu, acompanha, há duas décadas, a jornada do consumo consciente no Brasil, esses números revelam uma evolução desejada. A combinação das duas tendências – expansão do consumo consciente (puxado pelas novas gerações) e escalada no aumento da temperatura média do planeta – possibilita uma conclusão: ainda vamos ouvir falar muito de sustentabilidade na próxima década.