Dinheiro Rural

Enchentes no RS: entenda os prejuízos do agro e os caminhos para a recuperação

Perdas causadas pelas chuvas afetam produção do estado e podem prejudicar safras futuras; investimentos na reconstrução e respeito ao clima são fundamentais para nova fase

Crédito:  Marco Ankosqui

Áreas de arroz no Rio Grande do Sul deixaram de ser colhidas (Crédito: Marco Ankosqui)

Por Allan Ravagnani

As enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul ao longo do mês de maio deste ano causaram prejuízos severos ao setor agrícola local. Foram mais de 206 mil propriedades rurais afetadas, resultando em danos significativos na produção e na infraestrutura das propriedades. De acordo com um relatório divulgado pela Secretaria de Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi) e pela Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR) do estado, cerca de 35 mil famílias ficaram sem acesso à água potável. Esta foi considerada a maior calamidade climática da história do estado. O secretário do Desenvolvimento Rural, Ronaldo Santini, afirmou que a tragédia que atingiu as cidades afetou proporcionalmente a agricultura, que é o maior setor produtivo.

Durante o período de chuvas intensas:
9.158 localidades foram atingidas no Rio Grande do Sul,
situação que deixou 78 dos 497 municípios gaúchos em estado de calamidade pública (a maior parte no Vale do Taquari e na Região Metropolitana de Porto Alegre),
enquanto 340 cidades entraram em estado de emergência.

As perdas na produção de grãos se concentram nas áreas que não puderam ser colhidas ou que tiveram baixo rendimento após as enchentes. Entre as culturas afetadas estão soja, milho e feijão. As culturas de inverno, que foram recentemente semeadas, também sofreram perdas e precisarão ser replantadas. Ao todo, 48.674 produtores de grãos foram prejudicados, principalmente os que cultivam milho e soja.

“O evento meteorológico teve um impacto enorme no setor agrícola gaúcho. Medidas emergenciais foram adotadas para minimizar os efeitos nas áreas rurais, como a flexibilização de normativas. Outros projetos devem ser desenvolvidos em conjunto com setores e entidades para auxiliar na reconstrução da produção agrícola, vital para a economia do estado e do País”, afirmou Giovani Feltes, titular da Seapi.

Enchente foi a maior calamidade da história do Rio Grande do Sul (Crédito:Nelson Almeida / AFP)

Além disso, 19.190 famílias rurais sofreram perdas significativas em estruturas das propriedades, incluindo casas, galpões, armazéns, silos, estufas e aviários.

Dados preliminares indicam que aproximadamente 200 agroindústrias familiares também foram afetadas.

Claudinei Baldissera, diretor técnico da Emater/RS-Ascar, afirmou que as ações de recuperação com essas famílias serão focadas no desenvolvimento social, econômico, ambiental e cultural, visando uma abordagem justa, sustentável e viável.

Quase 20 mil famílias de produtores rurais tiveram perdas significativas por causa das chuvas (Crédito:Marco Ankosqui)

SOJA

A soja foi a cultura mais afetada pelas enchentes. Antes do evento climático, a estimativa de produção era de 22,24 milhões de toneladas. No entanto, com a perda de 2,71 milhões de toneladas, a nova estimativa é de 19,53 milhões de toneladas, conforme dados da Emater/RS-Ascar.

Essa redução drástica na produtividade impacta diretamente a economia gaúcha e também brasileira. Rica Mello, economista e CEO do grupo BCBF, afirmou que “a cultura de soja foi muito prejudicada, porque a época de colheita coincidiu com as enchentes, afetando boa parte da produção”. Este cenário evidencia a vulnerabilidade da agricultura frente aos eventos climáticos extremos.

(Divulgação)

MILHO E FEIJÃO

A produção de milho também sofreu perdas significativas, com 27% da área total plantada sendo impactada. Estima-se que 250 mil toneladas de milho foram perdidas. Para o feijão, embora a área afetada seja menor, as perdas não deixam de ser significativas, comprometendo a estabilidade alimentar da região.

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TRIGO

A semeadura do trigo, que começou entre o final de maio e o início de junho, também foi prejudicada. A previsão inicial era de uma produção robusta, mas as enchentes atrasaram o plantio e reduziram a área cultivada. “A produção de trigo enfrenta desafios significativos. As previsões indicam uma queda de aproximadamente 4,3% na produção”, comenta Rafaela Debiasi, especialista em agronegócio.

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ARROZ

O arroz, que já estava em fase de colheita, sofreu com inundações que afetaram 78% da área total cultivada. As perdas estimadas são de aproximadamente 350 mil toneladas. O impacto é profundo, considerando que o Rio Grande do Sul é um dos maiores produtores de arroz do País.

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FRUTA E HORTALIÇA

A horticultura e a fruticultura nas regiões do Vale do Taquari, da Serra e da Região Metropolitana de Porto Alegre também foram duramente afetadas. O abastecimento de hortaliças foi severamente comprometido, especialmente de folhosas e leguminosas.

Rafaela Debiasi destacou que “o abastecimento de hortaliças nos centros urbanos foi fortemente afetado. As culturas de folhosas e leguminosas sofreram maior impacto na região Metropolitana, na Serra e nos vales do Taquari e do Caí”.

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PECUÁRIA

A produção pecuária sofreu com a morte de 1,2 milhão de aves, além das perdas substanciais de bovinos de corte e de leite, suínos, peixes e abelhas. O impacto nas pastagens, tanto em campo nativo quanto em áreas de cultivo de plantas forrageiras, comprometeu a produção de leite e carne.

Paulo M. Oliveira Jr., economista e mestre em finanças, apontou que “os danos ao solo e às infraestruturas agrícolas podem aumentar os custos de produção e impactar a produtividade”. Ressaltando a necessidade de ações de mitigação e recuperação a longo prazo.

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SOLO

A recuperação das áreas afetadas e a mitigação dos impactos futuros são preocupações centrais para os agricultores e autoridades. As catástrofes climáticas têm aumentado a frequência e a intensidade de eventos extremos, exigindo uma abordagem integrada e resiliente.

Rica Mello ressaltou que “o solo absorveu muita água com as enchentes, e é necessário aguardar que se recupere antes de produzir novas safras”. Isso implica em um período de transição onde os agricultores poderão optar por outras culturas menos exigentes em termos de condições do solo. “Ainda há uma preocupação meteorológica com as indicações de transição de El Niño para La Niña, o que pode trazer novas condições climáticas adversas. A situação do solo, já saturado, continua representando risco para futuras inundações e dificuldades no plantio”, completou.

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INFRAESTRTURA

As enchentes causaram danos extensos à infraestrutura agrícola, incluindo galpões, armazéns, silos e estufas. A logística também foi severamente impactada, com estradas vicinais danificadas dificultando o escoamento da produção. A recuperação dessas infraestruturas é essencial para restabelecer a capacidade produtiva do estado. Investir em tecnologia e infraestrutura resiliente agora é vital para enfrentar os desafios climáticos.

A adoção de práticas de gestão de riscos climáticos, monitoramento contínuo do clima e diversificação de culturas são estratégias recomendadas. Rafaela Debiasi sugere que “a recuperação completa do solo para o cultivo de trigo pode demorar, aumentando a vulnerabilidade da safra”. Essa observação destaca a necessidade de planejar a longo prazo para garantir a sustentabilidade da produção agrícola.

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MERCADOS

Os prejuízos nas safras refletem também nos mercados financeiros futuros, com previsões de alta nos preços de commodities agrícolas. A volatilidade pode afetar contratos futuros, exigindo atenção dos investidores. Ferramentas de hedge nos mercados futuros podem ajudar a proteger as receitas dos produtores contra flutuações de preços.

O economista Paulo M. Oliveira Jr. destaca a importância de “investir em seguros agrícolas para minimizar perdas financeiras”. Esta é uma medida crucial para garantir a segurança econômica dos agricultores diante de eventos climáticos adversos.

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AJUDA

Além dos impactos econômicos e agrícolas, as enchentes causaram profundo sofrimento humano. A recuperação das comunidades afetadas exige um esforço conjunto, envolvendo apoio governamental, assistência humanitária e solidariedade.

O suporte constante é necessário para que as famílias afetadas possam reconstruir suas vidas e suas comunidades. Claudinei Baldissera, diretor técnico da Emater/RS-Ascar, afirmou que “as ações de recuperação que deverão ser executadas com essas famílias serão orientadas para o desenvolvimento social, econômico, ambiental e cultural”.

Este enfoque abrangente é fundamental para promover uma recuperação justa e sustentável. A tragédia no Rio Grande do Sul é um lembrete da vulnerabilidade da agricultura às mudanças climáticas, da importância em se monitorar os riscos e de adotar medidas resilientes para garantir a segurança alimentar e a sustentabilidade econômica do setor.

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