A Reforma virando quimera

Crédito: Sergio Lima / AFP

Carlos José Marques: "No puxa e repuxa dos lobbies reside o maior problema. Pacheco tem transformado, quando não distorcido, o efeito principal, e meta, da simplificação" (Crédito: Sergio Lima / AFP)

Por Carlos José Marques

Onde foi parar a Reforma Tributária? Ninguém sabe, ninguém viu. Agora, o presidente do senado, Rodrigo Pacheco, que um dia já prometeu colocar esse projeto como missão número um, faz corpo mole, tergiversa, adia e coloca de lado. Tudo por perrengue político, mágoa do chefe de Estado, castigo para rebater frustrações pretéritas. Desacelera o projeto, empurra a regulamentação até um tempo lá na frente, distante, quem sabe após as eleições municipais, e brinca com o cronograma a seu favor. É assim que a banda da política toca, nada em sintonia com os anseios e interesses da população, desafinada dos acordes urgentes que a vida econômica emite para poder retomar a sinfonia do crescimento. O titular parlamentar nem mais disfarça seu intuito. Fala em inconsistências a serem recosturadas, cozinha em banho-maria e joga de lado. Para livrar a cara, diz que as demandas de ajustes vêm de fora e precisam ser ouvidas. Até quando?

No puxa e repuxa dos lobbies reside o maior problema. Pacheco tem transformado, quando não distorcido, o efeito principal, e meta, da simplificação. As bancadas setoriais, decerto, não param de azucrinar, e o ponto final do esboço de reforma muda a todo instante, com remendos e aditivos. O mar de exceções já espetadas na minuta repaginou, para pior, vários capítulos. Desfigurou a essência. E o que é mais grave: a urgência defendida lá atrás ficou para as calendas. Não está nem no rol de prioridades da agenda congressual neste segundo semestre do ano. Claro, o que importa no momento são as eleições, e o assunto tributos em nada combina com a tentativa de sedução de eleitores, a corriqueira corrida dos votos nas urnas a favor de preferidos do establishment partidário. Ao retomar os trabalhos, o Senado, em especial, escalou assuntos como reoneração da folha, negociação de dívidas de estados e quetais na ordem do dia. Reforma? Para agora, esquece. E tudo ainda volta à Câmara, em mais rodadas ante eventuais modificações. É um jogo de gato e rato infindável. Triste para o Brasil, perdido nessa arapuca de interesses comezinhos que não cessam.

O calendário das próximas semanas dos senhores parlamentares conta muito mais com horas dedicadas a campanhas em seus redutos do que qualquer outra coisa. Serão poucas sessões plenárias presenciais. Vão se concentrar mesmo nas corridas municipais que valem a vitória nas urnas. O Brasil vive dessa catimba a cada dois anos. O tempo joga contra especialmente a retomada do desenvolvimento, e o País vai no modo de exibição de PIBs magros e carga fiscal insuportável, aumentando cada vez mais o custo da máquina pública, do aparato de incentivos, benefícios e subsídios – além da burocracia em um verdadeiro manicômio tributário. Não há como evoluir carregando esse peso. Como pré-condição para a virada de mesa está justamente a tramitação célere da reforma que há décadas o brasileiro espera sair. É desproporcional a falta de atenção do Congresso com as angústias da população nesse sentido.

É preciso atacar distorções, privilégios, desproporcionalidades no campo fiscal. Que a sensatez volte a vigorar naquela Casa.