Criatividade

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Luís Guedes: "Nunca é demais lembrar: a IA é uma ferramenta, não uma tábua de salvação (Crédito: Divulgação)

Por Luís Guedes

Venderam-nos uma ideia sobre inovação que muitas vezes não se parece muito com a prática. Pareceu por um momento que se falava sobre iPhones, Cirque de Soleil e eureca! – projetos, talentos únicos e ideias revolucionárias. Mas, na verdade, queriam dizer sobre sensibilidade para capturar demandas sutis, pessoas tenazes que jogam junto e uso intensivo e responsável da tecnologia que aumenta nossas capacidades e nossa criatividade.

Nem sempre foi assim, leitora atenta, leitor comprometido, mas na contemporaneidade a inovação é um imperativo. Fazer mais com menos e alcançar novas possibilidades é o modo corrente de pensar, agir e ver o mundo. Ocorre que o exercício dessa disciplina frequentemente se depara com um problema, que para ser sincero é um tantinho cruel: a maioria dos projetos de inovação nas grandes corporações é tão inspiradora quanto uma planilha. A necessidade de ter processos e a tendência de gerenciar por meio de dados faz com que nos enquadremos, medindo até o inquantificável, uma receita para transformarmos inovadores sensíveis em auditores competentes.

Entra em cena a IA. Essa inteligência não corpórea, que não para de nos acelerar e demonstrar a cada dia onde pode chegar (e nós não), promete ressuscitar a alegria de jogar. A IA pode peneirar montanhas de dados, otimizar processos, facilitar interações por múltiplos canais e identificar padrões que nem imaginamos, tudo em velocidade que nem parecia possível. Mas nunca é demais lembrar: a IA é uma ferramenta, não uma tábua de salvação. É um bisturi, não o Oráculo de Delfos. O desafio imediato de líderes, professores e pais é adquirir competências técnicas e humanas para aproveitar o potencial da tecnologia, garantindo ao longo do processo que os limites éticos sejam compreendidos e respeitados.

O primeiro passo dessa jornada deve ser cultivar a curiosidade intelectual – parece simples, mas minha experiência sugere que, assim como saber ouvir com atenção, fazer boas perguntas requer muita prática. Em empresas, escolas, igrejas e barracões onde a inovação é lugar-comum, as perguntas são valorizadas mais do que as respostas e os resultados ruins são vistos como um degrau, não um tropeço. Precisamos criar espaços onde o absurdo é explorado e o impossível é relativizado.

O desafio que se impõe é combinar a velocidade e a escala da IA com a nuance delicada e a empatia única da criatividade humana. Encontrar o ponto ideal entre insights e intuição é um dos temas que a liderança deve se debruçar

Uma vez cultivado esse terreno, a IA é chamada para jogar junto, acelerando o teste de hipóteses, escalando nossas melhores ideias e livrando tempo precioso dos colegas humanos para fazer o que só humanos fazem: combinar emoções e razão em busca de transcender os limites que valem a pena serem ultrapassados.

O desafio que se impõe é combinar a velocidade e a escala (da IA) com a nuance delicada e a empatia única da criatividade humana. Encontrar o ponto ideal entre insights baseados em dados e intuição visceral é um dos temas mais interessantes sobre os quais a liderança deve se debruçar.

O futuro sorri para aqueles que sabem aproveitar o poder crescente da IA, enquanto preservam e celebram a alma da engenhosidade humana. É uma tarefa extraordinariamente complexa, incerta, que demanda novas competências e que não pode ser deixada para amanhã. CrIAtive-se!

Luís Guedes é professor da FIA Business School