O Brasil está cada vez mais difícil de explicar
Por Norberto Zaiet
Em reuniões concomitantes que terminaram no mesmo dia, o Federal Reserve baixou o juro básico americano em 50 pontos-base e o Banco Central do Brasil elevou o juro básico brasileiro em 25 pontos-base. Após vencer o dragão da inflação — sem oficialmente declarar vitória —, o Banco Central norte- americano se sentiu confortável o suficiente para anunciar que a política monetária parecia restritiva demais para o momento e necessitava de uma recalibragem. Alinhados com ele estão os bancos centrais do Canadá, da zona do Euro, do Reino Unido, da Dinamarca, Suécia, Suíça, Nova Zelândia e outros países desenvolvidos. Na América Latina, os bancos centrais do México, Chile, Peru e Colômbia também baixaram os juros recentemente.
No campo da subida de juros, ao lado do Brasil, estão a Rússia, que subiu 300 pontos-base, e o Japão, que subiu 20 pontos-base. O país de Vladimir Putin enfrenta sanções comerciais pela maioria dos países do mundo e é parte de um conflito há mais de dois anos; o Japão, que precisa sair do terreno de juros negativos — o que em si é uma aberração — causou tamanho estardalhaço no mercado que o seu banco central declarou não ter nenhuma pressa em continuar. Também no grupo da subida de juros está a Nigéria, mas aí me abstenho de comentar por completa falta de conhecimento do caso. Desejo sorte.
Já no Brasil, para ficar somente no campo da economia e deixando os outros campos que estão queimando de lado, as expectativas de inflação estão desancoradas e o fiscal está desarrumado. Do lado positivo, o País está crescendo além do esperado. A situação, no entanto, é tão difícil que até o positivo fica negativo: segundo o Banco Central, a economia cresce mais rápido do que os insumos necessários para que a economia cresça, pressionando a inflação.
Dado este estado de coisas, a autoridade monetária viu-se sem alternativa: subiu juros e sinalizou um ciclo de altas pela frente. Reanimou-se o velho sistema que exisitia durante os primeiros governos de Lula: se o fiscal é frouxo, a política monetária precisa ser apertada para tentar encontrar um equilíbrio.
O problema aqui é que quem paga quando o Banco Central sobe juros é o governo, que já está gastando mais do que pode. Subir os juros piora o fiscal, que piora a dívida, que piora as expectativas de inflação, que piora os juros, e assim por diante. A situação é tão absurda que, apesar do “carry trade” ter ficado 75 pontos-base mais atrativo em um único dia, o real se valorizou apenas 4% e, nos últimos dias, já perdeu a maior parte disso. Houve até banqueiro renomado que, na semana que antecedeu a reunião, pediu para que o Banco Central não subisse os juros. Em meus trinta anos de mercado não me lembro de ter visto algo semelhante.
Fica difícil explicar para o investidor estrangeiro a lógica vigente no Brasil. O governo não percebe que precisa cortar gastos? Que não dá para crescer a economia acima do potencial com estímulo fiscal? Que subir juros, nesse caso, é uma solução paliativa que não resolve o problema?
Tenho certeza de que a parte técnica percebe. Desconfio que a parte política tenha começado a perceber, pois não se ouviu reclamação pela subida dos juros — pelo menos não até agora. Como se diz, o primeiro passo para se resolver um problema é reconhecer que ele existe.
A sinalização e execução de uma política fiscal mais austera vai atrair o investidor estrangeiro: a combinação de um País solvente do ponto de vista fiscal com uma taxa de juros desproporcional ao risco é muito tentadora.
Pauta para 2025? Tomara.
Norberto Zaiet é economista, ex-CEO do Banco Pine e fundador da Picea Value Investors, em Nova York