Revista

Sinais paradoxais na economia mundial

Crédito: Wisam Hashlamoun

Marcos Strecker: "Os investidores internacionais mais experientes são cautelosos e antecipam os ventos que mudam no horizonte. Não devem enxergar um céu de brigadeiro à frente" (Crédito: Wisam Hashlamoun)

Por Marcos Strecker

A escalada dos ataques no Oriente Médio assusta o mundo e antecipa uma possível ampliação do conflito para toda a região. Isso levaria a mais uma era de insegurança. O risco mais evidente é de disparada no preço do petróleo, como aconteceu em situações análogas do passado, levando várias nações à recessão. Mas a economia global, paradoxalmente, tem apresentado sinais positivos no último período. Depois que o Fed baixou os juros nos EUA, cristalizou-se a avaliação de que o país domou a maior inflação em décadas escapando de uma retração. Na União Europeia, os juros também começam a cair, o que pode impulsionar a produção e o consumo no bloco. A China, que é o motor do crescimento mundial, vinha de um período de desaceleração, mas vive um momento de euforia depois que o país anunciou um corte nas taxas de juros, medidas de alívio monetário, linhas de crédito para investidores e empresas comprarem ações de US$ 100 bilhões e um programa de gastos públicos. O resultado é que as ações chinesas subiram 8,5% em um único dia, registrando o melhor momento desde a crise global de 2008. O índice Hang Seng, da bolsa de Hong Kong, subiu 24% neste ano, acima da expansão de 20% do índice S&P 500, que acompanha as principais bolsas americanas, já em patamares elevados.

Mas isso não significa que o PIB chinês voltará a exibir a mesma performance das últimas décadas. “Devemos estar atentos aos perigos potenciais e estar preparados para dias difíceis”, alertou Xi Jinping nas comemorações de 75 anos de fundação da República Popular da China, na segunda-feira (30). Os especialistas apontam que o estímulo ainda é insuficiente e há grandes desequilíbrios a serem corrigidos no gigante asiático – como o alto endividamento das províncias e um mercado imobiliário em virtual colapso. Esse otimismo com as últimas medidas não atrairá de volta os fundos de investimento e as multinacionais que estão há algum tempo olhando com mais reserva seus negócios no país.

Outro indicador surpreendente é o preço relativamente baixo do petróleo, que ainda não reagiu significativamente às bombas que cruzam os céus do Oriente Médio. Os preços do barril (tipo Brent) permaneciam nos últimos dias na faixa de US$ 74, enquanto as piores projeções eram de que alcançariam US$ 100 (o pico em 12 meses foi de US$ 93, quando Israel invadiu a faixa de Gaza). E, em condições normais, a tendência é de baixa, já que a Arábia Saudita anunciou que deseja reverter nos próximos meses as restrições em sua produção, que visavam manter o valor do barril em patamares elevados. Até quando vai durar a bonança?

No Brasil, a Petrobras se depara justamente com o dilema de diminuir os preços dos combustíveis, já que ainda não repassou essa queda no mercado internacional de óleo para a gasolina e o diesel. Com o possível reaquecimento chinês, as commodities sobem, o que é um bom sinal para as exportações e as divisas. O agronegócio ainda está otimista, apesar da catástrofe climática. O governo surfa na queda histórica do desemprego e na projeção de um PIB próximo aos 3% este ano. A agência de classificação de risco Moody’s até elevou a nota de crédito do País na terça-feira (1º), o que fez o ministro Fernando Haddad até ousar no prognóstico da volta do grau de investimento, ainda que as contas públicas inspirem cada vez mais desconfiança. Os investidores internacionais mais experientes são cautelosos e antecipam os ventos que mudam no horizonte. Não devem enxergar um céu de brigadeiro à frente. Os políticos, especialmente em Brasília, deveriam mostrar a mesma cautela.