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BYD King tem bons números de tração e consumo; mas será mesmo um sedã?

Crédito: Divulgação

King: no consumo urbano, seja no modo híbrido, seja no 100% elétrico, não há do que reclamar (Crédito: Divulgação)

Texto Flávio Silveira

RESUMO

● No segmento em que dinâmica e dirigibilidade estão entre as prioridades, o novo BYD King decepciona
● Para encarar Corolla e cia., aposta no consumo e no powertrain plugável
● Mas será que basta?

Pense em um sedã de mais de 4,70 metros de comprimento, bom de guiar e com potência na faixa de 200 cv e torque acima de 300 Nm para garantir ótimo desempenho, com 0-100 km/h em 7 segundos. Se pensou no BMW 320i (R$ 332.950) ou no VW Jetta GLI (R$ 250.990), são ótimas opções. Mas adicione à receita ser híbrido plug-in, para rodar sem ruído e com “emissão zero” na cidade e ainda gastar menos gasolina ao usar os dois motores. Pronto, as opções rareiam e os preços passam de R$ 400 mil, como no caso do BMW 330e (mas aí são 292 cv e 400 Nm). Agora imagine um sedã assim por menos de R$ 200 mil – valor de médios pacatos a combustão, como o Nissan Sentra, ou de um híbrido com desempenho modesto e não plugável, como o Toyota Corolla. Fosse este sedã derivado de um modelo consagrado japonês, seria imperdível, mas é um chinês da BYD – que, com o pretensioso nome King, estreou há pouco.

Mas quero deixar claro que o problema aqui não é ser um BYD ou vir da China – a marca, como outras do país, aprendeu a fazer bons automóveis. É que, na ânsia por trazer o máximo de modelos rápido – para evitar os anunciados aumentos do Imposto de Importação e ganhar volume de vendas antes de inaugurar a linha de produção em sua fábrica na Bahia (ex-Ford) –, a marca teve acertos, mas, aqui, errou a mão.

Trouxe um sedã que, exceto o sistema híbrido eficiente, não mostra qualidades nem maturidade para se destacar na categoria.
Isso só comprova que projetar e construir carros não é fácil.
Não basta pegar uma plataforma disponível e colocar diferentes carrocerias nela.
Então, mesmo com o Song Pro sendo Compra do Ano 2025 na categoria SUV Médio, o King, que chegou depois na redação, não teria chance, pois decepcionou: prometia abalar o segmento, como Dolphin, Song Plus e Yuan Pro fizeram nos seus. Só que não.

Afinal, exigências e prioridades de um consumidor típico de sedãs costumam ser diferentes: ele quer conforto de suspensões e dinâmica, pontos em que os SUVs não são referência – nem o King. Já volto a esse ponto, mas antes vamos a outros aspectos em que o “rei” tampouco se destaca – a começar pelo design sem sal. Isso pode até ser questão de gosto, assim como nem todos curtem a cabine pobre visualmente, típica dos BYD, com não muita coisa além das telas.

Mas o fato é que o acabamento é bem mais “plebeu” do que nos sedãs médios generalistas. Outros problemas na cabine são o seletor giratório do câmbio (que responde mal e causa confusão, por isso foi eliminado em outros carros da marca) e a escassez de comandos físicos – algumas funções que são controladas pela tela deveriam ser mais fáceis e diretas.

Além disso, faltam ADAS, que até modelos mais simples e baratos já trazem, e retrovisor fotocrômico, por exemplo. Por outro lado, o GPS nativo e conectado merece elogios, e há mimos como bancos elétricos.

Mas se tem algo que ainda “segura” os consumidores de sedãs frente à ditadura dos SUVs é a posição de guiar baixa (quem opta por SUVs costuma querer o oposto) e a dirigibilidade com melhor dinâmica e mais conforto ao rodar (pois costumam ter suspensões multilink). Enfim, o prazer ao volante – justamente o destaque de Jetta, Sentra e cia., mas onde o King pisa na bola. A começar pela posição de guiar ruim, mais alta e com apoio insuficiente para as pernas: o chinês não entrega a sensação de esportividade dos sedãs e ainda acaba cansando o motorista em trajetos longos.

Mas o pior é a dinâmica: o King parece mais um “SUV-Sedã”, um Song Pro no qual simplesmente colocaram uma carroceria de sedã, mas esqueceram de fazer os acertos finos. Só de olhar para ele, dá para notar que é mais alto que outros três volumes, não só na distância livre do solo (pelo menos não raspa em tudo como o Seal), mas também na altura da carroceria (pois ela fica sobre o “skate” da bateria). Junte a isso suspensões ruidosas, com eixo de torção na traseira e mal-calibradas, com molas pouco rígidas e amortecedores “duros”, uma carroceria pesada e uma direção leve demais e temos um sedã que entrega pouco prazer ao volante – o que é aceitável em SUVs, mas não nesta categoria.

Então, não adianta ter 235 cv do trabalho conjunto dos motores 1.5 quatro cilindros de 110 cv e 135 Nm e do elétrico de 197 cv e 325 Nm – ambos dianteiros, assim como a tração (na versão de entrada, com bateria menor, são 209 cv).
Na prática, além da dinâmica não estimular acelerar muito, o powertrain parece entregar menos do que indicam os números.
Isso ocorre principalmente na estrada, quando não há a divertida sensação de guiar de um EV, com respostas imediatas.
Falando nisso, apesar de o ambiente urbano ser o mais adequado para o King, as manobras não são fáceis, pois o creeping do câmbio não é nada sutil, dificultando as movimentações em baixa velocidade.

É o consumo, idiota!

Mas quem compra um híbrido, pensando no ambiente ou apenas no próprio bolso, está, acima de tudo, preocupado com o consumo, não é verdade? Então, para quem tem isso como prioridade, não liga tanto para a dinâmica ou para o prazer ao volante, busca um porta-malas maior (mas sem estepe) ou simplesmente prefere o design de um sedã, o King pode ser uma compra interessante: no consumo urbano, seja no modo híbrido, seja no 100% elétrico, não há do que reclamar.

Avaliamos o King GS, de R$ 187.800, com bateria de 18,3 kWh (a GL tem 8,3 kWh) e autonomia elétrica de 80 quilômetros segundo o PBEV – e como comprovamos no teste, quando fizemos média urbana de 5 km/kWh (como todo plug-in, gasta mais eletricidade que elétricos “puros”). Nos dias em que não pudemos carregar muito (ele só aceita carregador lento), usamos o modo híbrido e as médias ficaram entre 20 a 50 km/l (usando também alguma eletricidade). Com a bateria esgotada (no modo HEV, ele preserva 25% para não depender só do motor a combustão), as médias na cidade ficaram em 13,8 km/l – um bom número, mas longe de HEVs como Civic e Corolla, que fazem 20 km/l ou mais.

Já na estrada, a agilidade diminui bastante. No modo elétrico, dá pra rodar uns 50 quilômetros. No híbrido, ele logo gasta os primeiros 75% da bateria e ativa o motor a combustão, que passa a atuar em conjunto com o elétrico tanto carregando a bateria quanto movendo as rodas (o 1.5 pode atuar no modo HEV, quando você pisa mais que dois terços do curso do acelerador).

A condução na estrada é mais entediante, mas o consumo foi de bons 17 km/l na média de 100 quilômetros – ajudado pela bateria. Depois que ela esvazia, sobe bem, para a faixa de 12 km/h. Como todo plug-in, não é para isso. Mas, dependendo do perfil, apesar dos muitos pesares, pode ser uma boa opção.

(Divulgação)

BYD King GS

Motores: dianteiro a gasolina, quatro cilindros em linha 1.5, 16V + dianteiro, elétrico
Combustível: gasolina + eletricidade (híbrido plug-in completo com funionamento paralelo e em série)
Potência: 110 cv a 6.000 rpm + 197 cv = 235 cv
Torque: 135 Nm a 4.500 rpm + 325 Nm = n/d
Câmbio: automático CVT + caixa redutora com relação fixa
Direção: elétrica
Suspensões: McPherson (d) e eixo de torção (t)
Freios: discos ventilados (d) e discos (t)
Tração: dianteira
Dimensões: 4,780 m (c), 1,837 m (l), 1,495 m (a)
Entre-eixos: 2,718 m
Pneus: 215/55 R17
Porta-malas: 450 litros
Tanque: 48 litros
Peso: 1.449 kg
0-100 km/h: 7s3
Velocidade máxima: 185 km/h (limitada)
Consumo cidade: 16,8 e 13,8 km/l (Inmetro e MS, sem recarga)
Consumo estrada: 14,7 km/l e 12 km/l (Inmetro e MS, sem recarga)
Autonomia elétrica: 80 km
Bateria: LFP (Blade), 18,3 kWh, V2L
Recarga máxima: 6,6 kW AC
Nota do Inmetro: A*
Classificação na categoria: A* (Extra Grande)

Preço básico: R$ 175.800
Carro avaliado: R$ 187.800