“A IA está revolucionando a forma como as empresas fazem negócios”, diz Dennis Herszkowicz, da Totvs
Executivo à frente da maior empresa brasileira de tecnologia afirma que o potencial de crescimento no Brasil é imenso e que as empresas e os consumidores precisam aprender a tirar proveito da tecnologia para aumentar a produtividade
Por Hugo Cilo
Dennis Herszkowicz assumiu a presidência da Totvs em novembro de 2018 com a missão de liderar a estratégia de crescimento da companhia, abrangendo operações, resultados e gestão de pessoas. Deu certo. Sob sua gestão, o valor de mercado da empresa aumentou em mais de quatro vezes nos últimos cinco anos, saltando dos R$ 4,5 bilhões, em 2018, para R$ 19,23 bilhões, em 2023. Outro grande destaque financeiro da trajetória do executivo à frente da companhia são os 20 trimestres consecutivos de crescimento na casa dos dois dígitos, marca alcançada ao fim do primeiro trimestre de 2024.
Sob o comando de Herszkowicz, a Totvs consolidou uma abordagem baseada em três dimensões de negócios: Gestão, Techfin e Business Performance. Formado em Marketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), o executivo acumula mais de 20 anos de experiência no setor de tecnologia. Antes de chegar à Totvs, ganhou destaque por sua atuação na Linx, onde foi sócio e diretor estatutário por 15 anos, ocupando diversas vice-presidências e integrando o Conselho de Administração entre 2011 e 2014.
Em sua trajetória na Linx, desempenhou o cargo de VP Executivo de Novos Mercados, liderando a unidade focada em fintechs. Sua posição mais marcante foi como CFO e diretor de Relações com Investidores, entre 2012 e 2017, período em que foi responsável pelo IPO da empresa em 2013, pelo follow-on em 2016 e por conduzir 20 aquisições estratégicas. A carreira de Dennis começou como trainee na Credicard, e ele também foi empreendedor na década de 1990, fundando sua própria empresa. Além disso, foi diretor-geral do DeRemate.com no Brasil e fundador e CEO da Gibraltar.com, acumulando passagens relevantes pela Unilever e pela Credicard. Confira, a seguir, sua entrevista exclusiva à DINHEIRO.
DINHEIRO — A Totvs se tornou nos últimos anos uma das empresas mais relevantes do setor de tecnologia no Brasil. Como a companhia tem se adaptado às rápidas mudanças tecnológicas e qual o impacto dessas transformações no dia a dia da empresa?
DENNIS HERSZKOWICZ — O impacto tem sido enorme. Hoje, temos acesso quase instantâneo ao que está acontecendo no mundo. É raro algo passar despercebido. Participar ativamente do mercado global nos ajuda a identificar tendências e também reforça nossa presença perante clientes e parceiros. É importante que eles vejam que estamos presentes e engajados com o futuro do setor de tecnologia e com as tendências.
Falando em tendências, como você avalia a onda de inteligência Artificial (IA)? Alguns críticos dizem que está sendo superdimensionada.
A IA não é uma bolha. É verdade que a Inteligência Artificial já existia há muitas décadas, mas estamos em um ponto de ruptura tecnológica. Muitas pessoas acham que o desenvolvimento dessas tecnologias segue uma linha reta, mas isso não é verdade. É um processo irregular, com avanços e adaptações ao longo do tempo. Por isso, alguns dizem que a IA é superdimensionada. Mas não acredito que seja. Para mim, a IA está revolucionando a forma como as empresas fazem negócios e como as pessoas produzem.
“No caso de tecnologias B2B, a adoção é mais lenta. Empresas enfrentam custos altos e riscos significativos ao implementar algo novo. Esse cuidado demanda tempo e planejamento”
Há riscos envolvidos nisso?
A IA é uma área transversal e, principalmente, dedicada a acelerar os projetos dentre nossos clientes, mas jamais o objetivo será centralizar qualquer decisão. A IA generativa, para que seja escalável, lida com desafios culturais e de governança que precisam ser vistos e revistos com muita dedicação. Neste momento, é importante separar a espuma da realidade no que diz respeito
ao tema.
Por que algumas empresas demoram mais para adotar essas inovações?
Principalmente no caso de tecnologias B2B, a adoção é mais lenta. Empresas enfrentam custos altos e riscos significativos ao implementar algo novo. Por exemplo, enquanto uma pessoa física pode começar a usar o ChatGPT rapidamente, uma empresa precisa considerar questões de infraestrutura, segurança e ética. Esse cuidado demanda tempo e planejamento. Por isso, é natural que a adoção seja mais lenta e cuidadosa em comparação ao o uso de consumidores.
Qual o impacto de longo prazo?
Eu realmente acredito que a IA vai transformar profundamente a forma como fazemos negócios. Não vejo isso acontecendo de forma imediata, da noite para o dia, mas em menos de uma década teremos mudanças muito significativas. Isso porque tecnologias tão amplas como IA são adotadas primeiro em áreas menos críticas, para mitigar riscos, e depois se expandem para funções centrais. Nosso foco está em transformar o tema, e principalmente a IA generativa em uma realidade imediata para nossos clientes. Como qualquer tecnologia, a IA também tem curvas de adoção que estão se acelerando muito rapidamente. Quando a gente observa tecnologias e seus desenvolvimentos em uma perspectiva histórica, a gente entende que cada vez mais rápido elas ganham escala. O rádio levou décadas para atingir um determinado número de lares enquanto a IA rapidamente já inunda nossos smartphones. No caso da IA vemos que agora ela começa a escalar.
Os profissionais hoje em dia estão prontos para adotar e executar essas tecnologias?
Cada vez mais, a IA precisa fazer parte do dia a dia das nossas lideranças. É muito importante compreender a necessidade de treinamentos dos times de acordo com os processos e demandas que existem na companhia. A IA precisa fazer parte do seu dia a dia. Se não fizer, ela perde sua razão de ser. Diminui a capacidade de treinar o time e de colocá-lo para olhar o que são os processos que existem dentro da companhia – e como transformo esse processo em algo mais eficiente e automatizado.
Desde que você assumiu, a Totvs quadruplicou sua receita. Qual foi o segredo desse crescimento?
Foi uma combinação de fatores. O mercado de tecnologia já era positivo, e a pandemia acelerou a transformação digital. Contudo, o que realmente impulsionou nosso crescimento foi uma mudança estratégica. Expandimos para novos mercados, como Business Performance e Techfin [tecnologia para serviços financeiros]. Isso aumentou nosso mercado endereçável em sete vezes. Brinco que saímos de um aquário pequeno para nadar em um enorme.
“Houve um período de valuations inflacionados, o que impactou as negociações. Porém, nos últimos três anos, vimos uma correção saudável. Isso tornou o mercado mais racional”
Quais novos mercados foram os mais relevantes para essa expansão?
Entramos em Business Performance, com soluções de marketing digital, CRM, e-commerce, entre outras. Também nos tornamos um player relevante em Techfin, oferecendo crédito e gestão de caixa. Além disso, ampliamos nosso portfólio no mercado de gestão, que historicamente é nosso ponto forte.
A decisão de entrar em Techfin foi baseada em tendências de mercado?
Sim, houve dois grandes fatores. O Banco Central adotou uma postura pró-competição, criando regulações mais leves para novos entrantes. Paralelamente, avanços tecnológicos, como Big Data e computação em nuvem, facilitaram nossa entrada nesse mercado. Foi uma convergência perfeita.
A Totvs realizou diversas aquisições para viabilizar essa expansão. Qual foi o impacto disso?
Fizemos M&As estratégicos para ganhar velocidade. Compramos a Supplier em 2019 para Techfin e a RD Station em 2021 para Business Performance, entre outros negócios. No total, investimos cerca de R$ 3 bilhões em aquisições nos últimos anos.
Esse processo de aquisição continua sendo parte do plano da Totvs?
Com certeza. Fusões e aquisições são parte do nosso DNA. Continuamos avaliando oportunidades, especialmente em áreas estratégicas como gestão e Business Performance.
Hoje, qual a representatividade desses novos mercados no negócio da Totvs?
Eles representam cerca de 15% da nossa receita. O potencial de crescimento é enorme, mas não temos metas rígidas. O que o mercado demandar e onde executarmos melhor, cresceremos.
A Totvs também tem planos de expansão geográfica?
Não. Nosso foco é no Brasil. Operamos na América Latina há muitos anos, seguindo nossos clientes. Mas não temos planos de entrar em novos países no momento. Nosso potencial de crescimento no Brasil ainda é muito grande e, por isso, queremos nos concentrar no mercado que já conhecemos muito bem.
Como você lida com a concorrência no segmento de pequenas e médias empresas, especialmente de grandes players internacionais?
É importante entender o que cada empresa define como pequena e média. Para nós, estamos falando de empresas com receita anual entre R$ 5 milhões e R$ 500 milhões. Já para players como Oracle, por exemplo, médio pode significar algo muito maior, o que reduz a concorrência direta nesse segmento.
Qual é o maior entrave para a adoção de tecnologia nas pequenas empresas?
Muitos pequenos negócios ainda enfrentam uma gestão pouco profissional, em parte por conta da informalidade fiscal histórica no Brasil. Isso dificulta a adoção de tecnologia, que exige organização e planejamento. Além disso, o ambiente de negócios no Brasil é extremamente complexo, o que não ajuda.
O mercado de M&As enfrentou desafios nos últimos anos. Isso afetou a Totvs?
Houve um período de valuations inflacionados, o que impactou as negociações. Porém, nos últimos três anos, vimos uma correção saudável, alinhada à queda na bolsa. Isso tornou o mercado mais sensato e racional.
Por fim, quais setores da economia estão mais promissores para a Totvs?
Agronegócio, logística e manufatura estão andando muito bem. Já o varejo sofreu mais nos últimos anos, mas começa a se recuperar. Independentemente do setor, estamos bem posicionados para atender qualquer segmento com nosso portfólio robusto.