Para Trump, a “tarifa ótima” não é zero

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Norberto Zaiet: "Em economês, quando uma nação é muito poderosa, a imposição de um determinado nível de tarifas de importação pode provocar um movimento favorável nos termos de troca" (Crédito: Divulgação)

Por Norberto Zaiet

Segundo Donald Trump, a palavra “tarifa” é a mais bonita do dicionário. Durante a campanha eleitoral, ele declarou que poderia resolver qualquer problema internacional com a aplicação de impostos de importação. Indicou, para começo de conversa, que imporia taxas de ao menos 20% em todo e qualquer produto importado e que, caso o produto fosse chinês, essa tarifa subiria para 100%. Depois de eleito, pelo jeito Trump pretende cumprir a promessa. Já indicou que se México e Canadá não controlarem o fluxo imigratório e de drogas nas suas fronteiras com os EUA, sofrerão a cobrança de uma tarifa de importação de 25% nos produtos destinados ao mercado americano. No último final de semana, ameaçou impor uma penalização de 100% sobre produtos importados dos países dos Brics, caso o bloco desestimulasse a utilização do dólar americano como moeda corrente nas suas operações de comércio internacional.

O argumento principal dos economistas contra as tarifas é que elas são geradoras de ineficiências. Sua imposição encoraja a produção doméstica do produto tarifado a um custo maior do que o internacional, o que provoca o aumento de preços e, efetivamente, reduz o consumo. A cereja do bolo é que o sobrepreço das taxas acaba saindo do bolso do consumidor e indo para o cofre do governo.

Há, porém, um contraponto a essa ideia. Quando um país muito grande, como é o caso dos EUA, impõe tarifas em suas importações, elas podem provocar a redução do preço internacional desses produtos e, ao mesmo tempo, aumentar o valor de tudo que o país exporta. Em economês, quando uma nação é muito poderosa, a imposição de um determinado nível de tarifas de importação pode provocar um movimento favorável nos termos de troca.

A maioria esmagadora dos produtos importados pelos EUA vem do México (15,7% do total, no acumulado de 2024), China (13,3%) e Canadá (12,8%). Não é nenhuma coincidência que Trump ameace impor taxas aí. Suponhamos que, pela imposição de taxas a automóveis importados do México, computadores vindo da China ou produtos de aço do Canadá (e a consequente subida inicial dos preços para o público americano), o consumo desses produtos seja reduzido nos EUA.

Quando um país como os EUA impõe tarifas em suas importações, elas podem provocar a redução do preço internacional desses produtos e, ao mesmo tempo, aumentar o valor de tudo o que o país exporta

O excedente produzido – e não consumido nos EUA – deverá ser desovado em outros mercados e, considerando que o mercado americano é proporcionalmente muito maior que qualquer outro, esse aumento da oferta global poderia causar uma queda dos preços desses mesmos produtos no mercado internacional. Ao final, de uma maneira ou de outra, se quiser vender no mercado americano, o exportador terá que baixar o preço. A consequência da imposição de tarifas, ao invés de recair no consumidor americano, poderia ser completamente absorvida pelo produtor no país de origem.

Esse argumento, apesar de pouco intuitivo, não é inovador: ele foi proposto por John Stuart Mill há quase 200 anos. A lógica é que a imposição de um determinado nível de tarifa (chamado de “tarifa ótima”) pode ser positiva para o país que a impõe, desde que ele seja suficientemente relevante no mercado internacional.

Trump está dizendo, com outras palavras, que a “tarifa ótima” para os EUA não é zero. Além de trazer benefícios econômicos, a imposição dessas taxas em níveis adequados poderia, de quebra, trazer outras vantagens. Entre elas o verdadeiro empenho do México e Canadá em controlar a imigração ilegal e as drogas na fronteira e uma mudança de comportamento da China em relação a Taiwan. Isso, claro, além de inibir qualquer iniciativa de substituição do dólar no comércio internacional.