Perspectiva 2025

O “espírito animal” segue voando em direção a 2025

A eleição de Donald Trump animou consumidores e investidores, e sua agenda justifica o otimismo. Mas será que as ações continuarão a subir? Há riscos, e não são poucos

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Norberto Zaiet: "Entre seus pontos polêmicos e ainda incertos, [Trump] pretende implementar tarifas alfandegárias contra os maiores parceiros comerciais americanos" (Crédito: Divulgação)

PERSPECTIVA 2025 | FINANÇAS INTERNACIONAIS

Por Norberto Zaiet

Por mais exata que possa parecer, a economia é essencialmente uma ciência humana e, como tal, influenciada completamente por quem a conduz. Ou seja: cada um de nós. Somos os agentes do mercado e, no campo das finanças internacionais em 2025, tudo indica que estaremos com o “espírito animal” afiado. Keynes dizia que, quando o “espírito animal” toma fôlego, consumidores e investidores ficam mais propensos a tomar riscos e gastar, afetando positivamente a atividade econômica.

A eleição de Donald Trump acordou, definitivamente, esse tal espírito animal. Sua agenda justifica o otimismo. Desregulamentação, cortes de impostos, exploração de petróleo, busca de produtividade em todos os setores governamentais e fim das guerras, entre outros, são música para os ouvidos depois de quatro anos de um governo completamente antagônico a todos esses quesitos.

No campo da desregulamentação, Trump quer tirar a mão do Estado da economia. No seu primeiro mandato, a cada nova regulamentação ele pretendia eliminar duas existentes. Sua promessa agora são dez eliminações a cada nova regulação. Fala-se da reestruturação ou completa eliminação do FDIC (o FGC americano) como órgão independente, na redução drástica do tamanho e influência do EPA (“Environmental Protection Agency”, o Ibama americano), na eliminação dos incentivos fiscais destinados a incentivar a adoção de carros elétricos, na redução de restrições à indústria extrativa de petróleo, na diminuição de restrições e entraves ao desenvolvimento de mercados de criptoativos e no incentivo explícito a investimentos na economia americana. Recentemente, o presidente eleito anunciou que investimentos acima de US$ 1 bilhão terão tratamento VIP na concessão de autorizações.

Trump pretende renovar os cortes de impostos realizados em seu primeiro mandato, fadados a expirar em 2025. Prometeu reduzi-los ainda mais. Nomeou Elon Musk e Vivek Ramaswami como líderes de algo inédito da história recente: um Departamento de Eficiência Governamental (DOGE, no acrônimo em inglês), cuja missão é, até a comemoração dos 250 anos da independência americana, em 4 de julho de 2026, entregar cortes de gastos e reduzir a máquina do governo federal por meio da administração de custos, como em qualquer organização privada. Num arroubo de otimismo, sinal dos tempos em que vivemos e característico de sua personalidade, Musk estimou que pode reduzir cerca de US$ 2 trilhões do orçamento federal com a iniciativa.

Do ponto de vista da política externa, além de prometer acabar com as guerras da Ucrânia e do Oriente Médio, Trump planeja drenar as fontes de financiamento para organizações e países financiadores de terrorismo, como fez em seu primeiro mandato. Sinalizou, durante a campanha, que quer construir nos EUA um “domo de ferro”, similar ao que existe hoje em Israel. Entre seus pontos polêmicos e ainda incertos, pretende implementar tarifas alfandegárias contra os maiores parceiros comerciais americanos.

Na sua maioria, as sinalizações são de céu azul no voo e mar tranquilo na travessia para o tomador de riscos. Entretanto, depois de dois anos de valorizações contínuas acima dos 20%, será que os índices de ações americanos têm fôlego para continuar a subir? Tudo o que sobe também desce – e de elevador. No curto prazo, porém, não parece haver nenhum gatilho que possa desinflar o espírito animal que começa a voar.

Riscos há, e não são poucos. O principal segue crescendo, que é a dívida pública norte-americana. Todo o gasto fiscal dos últimos anos foi financiado com dívida e redução de impostos. “Domo de ferro” e afins apenas aumentam essa conta. E é bom lembrar que os chineses e os japoneses não estão mais comprando os títulos do tesouro americano.

Durante a campanha, em setembro último, o agora vice-presidente eleito, JD Vance, foi explícito em uma entrevista ao jornalista Tucker Carlson: “Eu realmente me preocupo: será que o mercado de títulos do tesouro, os investidores internacionais, os que estão ficando ricos por conta da globalização, os que ficaram ricos por conta da exportação da nossa base industrial para a China, vão tentar derrubar a presidência de Trump elevando bruscamente a taxa de juros desses títulos?”.

Colocar a culpa no mercado é típico da classe política em qualquer lugar do mundo. Vance sabe que o risco está no déficit, e não no mercado, que apenas reage a ele. De certa maneira, é reconfortante saber que tanto ele como Trump estão conscientes desse risco – e que isso pode derrubar o legado de um governo, por mais bem-intencionado que seja.

Enquanto o déficit tem financiamento, o espírito animal está solto e, como dizia o austríaco Rilke, “os espíritos querem somente que exista o voo”. Happy 2025!