Belém, 2025: o que o mundo pode esperar da COP da floresta
Com sua tradição em diplomacia ambiental, o Brasil pode liderar no evento a costura de acordos complexos para as mudanças climáticas
PERSPECTIVA 2025 | O ANO DA COP 30
Por Ricardo Voltolini
Uma coisa é certa sobre a COP30 de Belém (PA): os mais de 50 mil visitantes previstos, em novembro de 2025, deixarão a cidade encantados com as cores, os ritmos e os sabores amazônicos. Certamente, desejando retornar no futuro. Resta saber, no entanto, o que resultará de concreto para o futuro hoje incerto da humanidade em relação ao enfrentamento das mudanças climáticas.
As expectativas sobre Belém aumentaram sobretudo porque a conferência de Baku, no Azerbaijão, foi decepcionante. Realizada em novembro, a reunião que prometia ser a COP do financiamento acabou parecendo mais a COP das promessas. Entendo quem comemore o “compromisso” dos países ricos de contribuir com US$ 300 bilhões por ano até 2035 para a adaptação climática dos países em desenvolvimento – esse montante representa, afinal, três vezes mais do que o combinado na COP 15, da Dinamarca, em 2009, que só começou a pingar de verdade em 2022.Na prática, não chega nem perto do volume anual de US$ 1,3 trilhão até 2035, considerado o mínimo necessário para manter o aumento a temperatura em 1,5⁰ C acima dos níveis pré-industriais, como prega o Acordo de Paris (2015).
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, torce para que a conferência brasileira seja a “COP da implantação” dos acordos internacionais destinados a conter o aquecimento do planeta. Seu anseio é que, em Belém, os países até agora desprovidos de senso de urgência definam o que ela chamou de “mapa do caminho” – uma tarefa tanto mais complexa porque o negacionista Donald Trump, de volta à presidência dos EUA, deve cumprir uma promessa de campanha, batendo em retirada do Acordo de Paris, como fez aliás em seu primeiro mandato.
Maior produtor de combustível fóssil do mundo, os EUA só perdem para a China em volume de emissões de GEES. Com Joe Biden, havia um compromisso de reduzir as emissões entre 33% e 50% até 2035. Com Trump, especialistas do consórcio Climate Action Tracker apostam num aumento de 0,04⁰C ao aquecimento de 2,7⁰ C projetado para 2100.
Não há uma ideia clara do peso que a sombra de Trump terá sobre a COP30. Até porque a União Europeia anda mais acanhada do que deveria. No bloco dos maiores emissores históricos de GEES, os países europeus têm enfrentado crises de toda ordem com efeitos claros em atrasos na transição energética e também na procrastinação das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC), isto é, nas suas metas de redução de emissões.
Sobre as NDCs, a COP da floresta pode se beneficiar de uma boa coincidência. Segundo o protocolo da ONU, os países precisam anunciar suas revisões a cada cinco anos. E a próxima será justamente em 2025. Hora de mostrar prontidão e ousadia, se não por convicção, para não passar vergonha.
Sabendo disso, e para assegurar protagonismo na COP realizada em seu território, o Brasil saiu à frente e divulgou recentemente uma NDC mais parruda. Na anterior, a meta era reduzir emissões em 53,1% até 2030 com base nos níveis de 2005. Agora, firmou um compromisso de redução entre 59% e 67%.
Um dos campeões em desmatamento no País, o estado do Pará parece empenhado em se antecipar aos críticos que cobrarão mais do que o discurso verde dos governantes
Para cumprir essas metas, e também a de ser carbono zero até 2050, o Brasil precisará ser competente na articulação de estratégias transversais e na execução das metas do seu Plano Clima, o que exigirá coesão entre os poderes e níveis federativos e o engajamento da sociedade civil e empresas. Quem for a Belém verá, além das plenárias diplomáticas, uma grande feira de convenções, repleta de estandes de governos (municipais e estaduais) e empresas querendo mostrar serviço na construção de respostas para a ameaça climática.
Mal resolvido em Baku, o assunto financiamento voltará à mesa de negociações da beira do rio Guamá. Sabe-se lá com que nível de envolvimento dos financiadores. Sabe-se lá com base em quais fontes de recursos.
Um dos mais festejados instrumentos financeiros, o mercado de carbono regulado, foi discutido na recente reunião do G20 no Brasil e será pauta recorrente na COP30. Em Baku, as conversas definiram algumas regras para um mercado global. Em Belém, espera-se um avanço nos debates sobre esta ferramenta que, para o Brasil, descortina um horizonte de oportunidades.
Não por outro motivo, o presidente Lula sancionou, no dia 12 de dezembro, uma lei (15.042) que institui o Sistema Brasileiro de Comercialização de Emissões e estabelece regras para o controle, compra e venda de cotas de emissão de empresas e governos. Agora é enfrentar o longo caminho para regulamentar e implementar a lei até 2030.
A responsabilidade de tirar boa nota como anfitrião tem levado o Brasil a fazer a lição de casa.
● Quinto maior emissor de GEES do mundo, graças ao mau uso do solo, o País terá números melhores para apresentar sobre controle de desmatamento na COP amazônica.
● De acordo com o Observatório do Clima, houve uma diminuição de 12% nas emissões em 2023, a maior queda em 15 anos. As emissões ligadas a desflorestamento caíram 24%.
Um dos campeões em desmatamento no País, o estado do Pará também parece empenhado em se antecipar aos críticos que certamente cobrarão mais do que o discurso verde dos governantes. Recentemente, aprovou um plano de carbono neutro, segundo o qual se compromete, entre outras ações, a assegurar a rastreabilidade do seu rebanho bovino, a pagar serviços ambientais para 20 mil famílias (2 mil até a COP30) e a restaurar 100 mil hectares (20 mil até o evento de Belém). Anseia-se também, como legado, uma Belém renovada. Para adequá-la ao super evento, o governo federal deve investir R$ 4,7 bilhões nas mais diferentes obras de infraestrutura, incluindo algumas muito básicas, como água e saneamento.
Compreensíveis as superlativas esperanças que cercam a COP30. Não apenas porque ela ocorre no quintal da maior floresta tropical do mundo. Não só porque o Brasil tem boas contribuições a dar no uso de energias renováveis, em agricultura sustentável e preservação de biodiversidade. Mas porque, graças à sua longa tradição da diplomacia ambiental, o País pode liderar a costura de acordos mais complexos para as mudanças climáticas. Que os tambores dos mundurukus iluminem as ideias dos líderes globais.