Spotify: em meio a polêmica sobre remuneração, plataforma enfrenta desafio da rentabilidade
Com um modelo de negócio que já causou muita controvérsia, streaming gerou quase R$ 1 bilhão em receita para artistas nacionais ano passado
Por Lara Sant’Anna
Como qualquer grande inovação, quando o Spotify foi lançado muita coisa mudou. Seja a forma e intensidade com que consumimos música, seja a forma como o mercado fonográfico se sustenta. Criada no ápice da pirataria, a plataforma permitiu o acesso massivo e legal à música e com o passar dos anos ajudou a desenvolver a indústria e a economia de streaming. Apenas em 2022, no Brasil, o Spotify diz ter gerado receita aos artistas nacionais de quase R$ 1 bilhão, valor mais de cinco vezes maior que em 2017. Além disso, enquanto as receitas da indústria musical brasileira como um todo cresceram 15% entre 2021 e 2022, segundo a Federação Internacional da Indústria Fonográfica (IFPI), as receitas geradas por artistas brasileiros na plataforma cresceram 27% no mesmo período.
27% foi o crescimento da receita gerada por artistas brasileiros no Spotify em 2022
Mas nem tudo são rosas. A relação da plataforma com os artistas desde a criação é conturbada. Na mesma medida que a empresa se mostrou uma salvação contra a pirataria, chegaram críticas sobre a forma adotada de repasse dos royalties de reprodução.
Em 2014, a cantora americana Taylor Swift (atualmente a segunda artista mais ouvida no serviço de streaming nascido na Suécia) chegou a retirar todo o seu catálogo por entender que não compensava, dado o modelo de remuneração.
Três anos depois, com o Spotify mais do que consolidado, ela voltou atrás na decisão. Mas o fato é que a relação de amor e ódio da indústria com a plataforma de reprodução nunca deixou de existir.
Para tentar dar um basta na questão, o Spotify lançou em 2021 um site para trazer mais transparência para as questões financeiras, o Lound and Clear. Segundo as informações disponibilizadas, o Spotify (que é de 2008) já pagou em 15 anos quase US$ 40 bilhões para a indústria — e a ajudou a se reerguer, alcançando em 2022 a cifra de US$ 26,2 bilhões, a maior receita desde o pico de 1999, segundo a IFPI.
De acordo com a head de Parcerias com artistas, gravadoras, selos e distribuidoras no Spotify Brasil, Carolina Alzuguir, a plataforma repassa 70% de cada dólar gerado pelo consumo de música para a indústria.
O repasse aos artistas é feito conforme acordos individuais deles com gravadoras e distribuidoras.
O ecossistema criado pelo Spotify também ajudou a pulverizar as receitas da indústria. No auge da era do CD, cerca de 25% das vendas nos Estados Unidos correspondiam aos 50 maiores artistas do mercado. Já em 2022, só 12% dos streamings no mercado americano foram para esses artistas.
No Brasil, os dados revelam que o número de artistas nacionais que geraram mais de R$ 50 mil em royalties no Spotify (a plataforma classifica os artistas em várias faixas de remuneração) mais que quadruplicou desde 2017. E mais do que um terço dos brasileiros que geraram acima de R$ 50 mil são independentes e distribuem sua própria música no Spotify.
Relacionamento
Existem 213 mil artistas que já lançaram ao menos dez músicas no Spotify e que possuem pelo menos 10 mil ouvintes mensais. Isso mostra a dimensão de todo esse universo.
Claro que os gigantes que possuem muita verba e estrutura de divulgação se destacam mais facilmente, mas para conseguir ser descoberto em meio ao mar de músicos a própria plataforma desenvolve algumas ações de relacionamento.
Como o programa Radar, que seleciona artistas que estão começando a se destacar em alguns mercados e recebem apoio de marketing e divulgação.
Além disso, o Spotify criou em 2018 um serviço que permite que os próprios artistas sugiram seus lançamentos para os editores de playlists do Spotify de todo o mundo, o que garante uma visibilidade maior e sem fronteiras para o som de cada um.
“Só o Brasil tem uma quantidade imensa de artistas. Fazer reunião com todos eles seria impossível.”
Carolina Alzuguir, head de Parcerias do Spotify
“Justamente por isso a gente disponibiliza ferramentas para dar autonomia para que eles possam subir essa informação diretamente no sistema e ela chegue diretamente para os tomadores de decisão dessas playlists.”
Na estratégia do Spotify, ainda há a diversificação das fontes de receitas para os artistas. Atualmente é possível realizar a venda de merchandising e, em alguns países, está sendo implementado a venda de ingressos para shows.
Agora, para que tudo isso se perpetue, o Spotify tem o desafio de ser rentável. No segundo trimestre de 2022, a companhia reportou receita de 3,17 bilhões de euros e aumento de 27% no número de usuários ativos, chegando a 551 milhões, mas também teve prejuízo líquido de 301 milhões de euros no período.