Direcional constrói recordes, na carona do MCMV
Após captar quase R$ 430 milhões, construtora prevê crescimento diante das novas regras do programa Minha Casa, Minha Vida e da redução gradual da Selic, que deve impactar positivamente nos financiamentos da classe média
Por Angelo Verotti
São 42 anos de atuação na construção civil brasileira. Mas, com certeza, 2023 ficará marcado na história da Direcional Engenharia. A construtora especializada no segmento econômico — de baixa renda — celebrou resultados recordes em vendas e em lançamentos no segundo trimestre. O movimento foi coroado pelo follow-on realizado em julho, quando levantou R$ 429 milhões. Boa parte do dinheiro deverá ser utilizada como capital de giro nos negócios da companhia, que envolvem também a marca Riva, empresa voltada ao segmento de classe média. “Estamos bem otimistas com os resultados operacionais, lançamentos, vendas etc. Foi um semestre muito forte para nós”, afirmou à DINHEIRO Ricardo Ribeiro, CEO da Direcional.
O crescimento da operação fica evidente nos números. Entre abril e junho, por exemplo, a Direcional superou pela primeira vez na história a marca de R$ 1 bilhão em vendas brutas em um trimestre, alta de 15% sobre o período entre janeiro e março deste ano e de 13% em comparação ao segundo trimestre de 2022.
A companhia também comemorou os recordes de lançamentos, com VGV de R$ 1,5 bilhão, alta de 84% na comparação anual e de 138,3% em relação aos primeiros três meses de 2023, e de lucro líquido, de R$ 104 milhões, 365% superior à igual época do ano passado e de 78% em relação ao primeiro trimestre deste ano.
Os resultados, segundo o executivo, estão diretamente relacionados às novas regras do governo federal para o Minha Casa, Minha Vida (MCMV), além do desempenho “positivamente surpreendente” da Riva, apesar da maior restrição dos bancos na concessão de crédito, de extrema importância para o segmento.
Com a inflação “muito comportada” no momento, Ribeiro acredita na queda gradual da taxa Selic, iniciada em agosto (13,75% para 13,25% ao ano) e que deve impactar nos custos dos financiamentos.
As mudanças no MCMV que beneficiam a Direcional e outras construtoras do segmento incluem o incremento do teto dos imóveis enquadráveis no programa, ajuste na curva de subsídio e nas taxas de juros.
O preço máximo de venda dos imóveis que se enquadravam no programa (faixa 3), por exemplo, era de R$ 264 mil. Isso em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. Em Manaus e nas capitais do Nordeste, era de R$ 219 mil. E, em Belo Horizonte, de R$ 236 mil. “Hoje é de R$ 350 mil no Brasil inteiro”, afirmou.
“Estávamos preparados para um ano muito duro e estamos com uma performance melhor do que imaginávamos.”
Ricardo Ribeiro, CEO da Direcional
Como a Direcional tem operação mais diversificada do ponto de vista geográfico, com atuação em oito estados e no Distrito Federal, as perspectivas decorrentes dessa nova realidade de teto do programa só aumentam.
Sem contar outros benefícios vindos das novas regras, como a redução da taxa de juros para as faixas de renda mais baixas.
“Porque os produtos dependiam anteriormente de um crédito escasso e caro, o da poupança”, disse o CEO. “Agora, as pessoas conseguem financiar com recursos do Minha Casa, Minha Vida, o que quer dizer que as taxas de juros que hoje estão em média em 10,5 % ao ano serão de, no máximo, 8,16%, ou até menos.”
Performance Melhor
A empolgação com as novas regras e as perspectivas para o MCMV se estendem à Riva, categoria voltada à classe média. “Estávamos preparados para um ano muito duro e estamos tendo uma performance melhor do que imaginávamos”, disse o CEO.
O segmento computou R$ 380 milhões em Volume Geral de Vendas (VGV) no segundo trimestre, contra R$ 236 milhões na comparação anual.
No segmento em que a Riva atua, logo acima do teto do Minha Casa Minha Vida, de até R$ 600 mil, Ribeiro percebeu uma demanda muito resiliente, apesar do cenário mais desafiador do ponto de vista de custo do crédito e de disponibilidade, além de uma oferta muito baixa.
“O VGV chegou a R$ 614 milhões no semestre, alta de 50% em relação aos primeiros seis meses do ano passado, quando foram negociados R$ 407 milhões.”
A Riva também acabou beneficiada por decisão do Conselho Curador do FGTS, que em razão da demanda no MCMV autorizou um aumento no orçamento destinado ao programa superior a R$ 20 bilhões. E com o incremento nos tetos do MCMV um volume muito grande de imóveis da Riva passou a se enquadrar no programa federal.
Ribeiro acredita que, com o custo controlado, o preço de venda dos imóveis não precisará ser reajustado na mesma proporção apresentada no período da pandemia. “Com preços mais estáveis, é de se esperar também que a gente tenha um volume maior de famílias com condição de compra dos nossos imóveis”, disse.
Mercado
A companhia lançou 24 empreendimentos no primeiro semestre, 15 deles no segundo trimestre. Na visão do CEO, dois motivos justificam a disparidade: o primeiro trimestre, naturalmente, é sazonalmente mais fraco, por causa das férias e do Carnaval.
“E tentando tirar essa questão sazonal, a gente lançou no primeiro semestre um pouquinho mais de R$ 2 bilhões, que foi um crescimento de quase 50 % em relação ao primeiro semestre de 2022.”
Outro motivo, segundo ele, é que os lançamentos, em geral, se concentram a partir do segundo trimestre. “A perspectiva é de ter um segundo semestre bastante positivo, assim como foi no ano passado.”
Terrenos para a investida não devem faltar. A companhia dispõe de um landbank de R$ 35 bilhões pelo Brasil para receber empreendimentos da Direcional e da Riva.
“É um banco de terrenos que nos dá um conforto muito grande para, dependendo da demanda gerada pelas novas condições do programa Minha Casa, Minha Vida, ajustar o tamanho da nossa operação e dos nossos produtos.” Um diferencial competitivo estratégico.
Outro lado
A expectativa de crescimento demonstrada pelo CEO para o segundo semestre contrasta com uma preocupação revelada pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). Os lançamentos no segundo trimestre apresentaram redução de 15,8% na comparação anual — 64,3 mil contra 73,6 mil de 2022 —, movimento constatado também no acumulado do semestre, quando foram lançadas 119,9 mil unidades, 19,1% a menos frente ao mesmo intervalo. Para a entidade, os números acendem um alerta em relação à produção imobiliária.
Uma preocupação, porém, que pode ser apenas ajuste e positiva para reequilibrar o mercado. De acordo com o economista-chefe do Secovi São Paulo, Celso Petrucci, houve aumento discreto de 0,5% nas vendas de unidades residenciais entre abril e junho frente ao trimestre anterior.
Os números superaram os de lançamentos em mais de 10 mil unidades, demonstrando a aderência dos produtos disponíveis ao mercado comprador.
Com base nos dados de unidades lançadas e vendidas no acumulado dos últimos 12 meses, constatou-se que, desde o final de 2022, os lançamentos estão menores que as vendas. A diferença do acumulado supera 15 mil unidades. Assim, fica minimizada a redução de lançamentos.
Mas pode haver outro tipo de reflexo. A pesquisa mostra que é o menor patamar dos últimos dois anos, o que seria preocupante, de acordo com Petrucci. “A oferta está bastante reduzida em relação ao que o mercado tem de força para consumo”, disse.
No entanto, na visão dele, as medidas econômicas do governo federal aliadas à redução da Selic, com sinalização de novas quedas nos juros nos próximos meses, devem influenciar na confiança dos incorporadores para lançamentos de empreendimentos nos trimestres seguintes, o que pode mudar o quadro.