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Um quadro disfuncional

É proposital este país inflar sem fim o mal cuidado dinheiro que vai para a educação

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Edson Rossi: "Cidades que recebem verbas para cada matriculado nos programas de educação de jovens e adultos estariam inflando os números para receber verbas federais." (Crédito: Divulgação)

Por Edson Rossi

Temos data marcada para mais um episódio da série Não-Cansamos-de-Passar-Vergonha-em-Escala-Global. Será daqui a um mês. Dia 5 de dezembro, terça-feira, Paris. Será a apresentação dos primeiros resultados do Pisa 2022. O Programme for International Student Assessment (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) é patrocinado pela OCDE e existe desde 2000. Reúne alunos de 15 anos, de escolas públicas e privadas. Da edição atual, participaram adolescentes de 80 países. Há três pilares avaliados: Ciências, Leitura e Matemática, que este ano recebeu um foco maior — segundo a OCDE, houve “ênfase no raciocínio matemático para destacar sua importância na abordagem de desafios complexos da vida real”. Os resultados serão apresentados em dois volumes e medirão também “sistemas educacionais resilientes”. Até os mais otimistas dos brasileiros sabem que de onde menos se espera é que nada vem. Não haverá boa notícia.

Historicamente o Brasil vai mal no Pisa. Muito mal. Na edição anterior (2018), dados oficiais do Ministério da Educação mostram que 50% de nossos estudantes de 15 anos não possuíam nível básico em Leitura. Em Ciências, o percentual piorou: 55%. Em Matemática o vexame cresceu: 68% não atingiram o patamar mínimo. Dá sete a cada dez. Na versão de 2018, dos 79 países participantes o Brasil ficou sempre lá atrás, uma espécie de turma do fundão versão globalizada. Fomos mal em Leitura (na faixa entre as posições 55ª e 59ª), mal em Ciências (64ª a 67ª), mal em Matemática (69ª a 72ª). A gente não apanhou só de europeus e asiáticos. Apanhou até dos vizinhos. “Comparado com os países da América do Sul, o Brasil é o pior em Matemática, empatado estatisticamente com a Argentina. Em Ciências, também fica em último lugar, com Argentina e Peru. E em Leitura, é o segundo pior, só à frente de Argentina e Peru”, afirmou em 2019 o MEC em relatório (link: https://l1nk.dev/6yo22). Não podia ser pior. Bem, podia. E foi: em 2018, nossos indicadores estavam estagnados havia uma década. E nada leva a crer que o cenário a ser mostrado no Pisa 2022 será outro.

A origem desses males indecentes nem está em orçamento para a educação. Bem, está, mas não na falta de dinheiro. Está na gestão do dinheiro. É historicamente sabido que o Brasil promove uma distribuição de renda e formação invertida quando se trata de dinheiro público para o ensino. Distorção que se acentuou com a Constituição de 1988. O governo federal, que tem de fato o comando das estratégias — ou pelo menos deveria ter, via Ministério da Educação — acaba sendo responsável pela manutenção do Ensino Superior público. E nas melhores instituições (incluindo algumas mantidas por governos estaduais, em especial o paulista), o ingresso dos alunos do Ensino Médio público ainda não é proporcional. O Censo Escolar 2022 diz que dos 7,9 milhões de estudantes dessa faixa, 88% estão em escolas públicas. Traduzindo: enquanto as instituições públicas de ponta no Ensino Superior não tiverem 88% de estudantes oriundos de ensino público há uma transferência de renda e de formação que tira do mais pobre. Mais: quando alunos que ralaram nas públicas chegam ao Ensino Superior público eles normalmente não vão para carreiras Stem (Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática), ou Administração e Medicina, áreas que tradicionalmente remuneram melhor.

Mas esse nem seria o ponto mais indecente. A indecência se constrói ainda maior quando, segundo dados da ONG Todos pela Educação, quatro a cada dez jovens brasileiros negros não concluem o Ensino Médio. Entre os brancos, o índice é de 25%. E piora quando há roubo. Desvio de dinheiro. O mais recente indício foi noticiado pela Folha de S.Paulo há 15 dias. Cidades que recebem verbas para cada matriculado nos programas de educação de jovens e adultos estariam inflando os números para receber verbas federais. Pilantragem. A reportagem mostrou municípios em que 23% da população está matriculada, quando a média nacional é 1,6%. Há outras em que havia 30 matriculados há três anos. Hoje há 2,1 mil. Se fosse caso único, beleza. Mas não é. Durante o mandato do lúmpen-ex-presidente JB, kits de robótica foram vendidos a preços superfaturados para escolas em que nem água encanada havia, nem sequer internet. Empresas aparentemente ligadas a políticos, aquele tipo de ser que o presidente Lula diz preferir a técnicos. A PF está com esse imbróglio. Ainda no primeiro ano JB um edital de R$ 3 bilhões para a compra de 1,3 milhão de PCs e notebooks foi abatido pela CGU. Ufa! Havia escola com 250 alunos que receberia 30 mil computadores. Cada estudante teria direito a 120 deles. Doideira, né? Por tudo isso Lula pode dar um golpe magistral se abrir a Caixa Preta de FNDE/Fundeb. Blockchain ajudará muito. Registrando quem libera (e para onde vão) os gordos Pix da educação brasileira. Porque pra performar no Pisa é que não vão.

*Edson Rossi é redator-chefe da DINHEIRO