Dell quer democratizar Inteligência Artificial
Beneficiada pelo boom da inteligência artificial e pela demanda por hardware, a gigante de tecnologia tem superado as previsões dos analistas. Para o presidente de vendas globais, John Byrne, a IA representa momento de intersecção no qual humanos e máquinas vão se unir para gerar resultados nunca vistos
Por Victória Ribeiro
Beneficiada pelo boom da inteligência artificial e pela estabilização da demanda por hardware e produtos de servidor, a Dell Technologies elevou sua previsão de lucro e receita anual. Com base na expectativa de impulso na demanda por seus servidores PowerEdge e designs de IA generativa com a Nvidia, a empresa prevê receita entre US$ 89,5 bilhões e US$ 91,5 bilhões. Durante visita à operação brasileira, John Byrne, presidente de Vendas, Global Theaters and Dell Tech, afirmou sentir um estusiasmo único proporcionado pela IA. De acordo com ele, a tecnologia vai superar a revolução de 1969, quando foi estabelecida a primeira conexão via internet. “É um momento de intersecção, em que humanos e máquinas vão se unir para gerar resultados nunca vistos antes”, disse à DINHEIRO.
Em meio ao início de uma nova era com a IA generativa (GenAI), que prevê transformar a maneira como os mais diversos setores operam, inovam e concorrem, a vinda ao Brasil, de acordo com Byrne, foi motivada não só pela importância estratégica do País, considerado o nono maior PIB do mundo e com volume significativo de logos da Dell assumindo as necessidades tecnológicas.
Segundo ele, a visita levou em conta “aprendizados em via de mão-dupla”, com uma agenda focada em clientes que assumem a liderança de setores como o de petróleo, serviços financeiros, saúde e, claro, tech.
“Enquanto eu pergunto aos brasileiros sobre a forma como eles estão usando a tecnologia, eles questionam: O que você tem visto ao redor do mundo? O que podemos esperar e como podemos nos preparar para o movimento gerado pela IA? Que soluções podemos usar para alavancar determinado processo? O que a Dell está fazendo como empresa para além do roteiro?”, disse Byrne.
Segundo ele, as demandas relacionadas à tecnologia foram impulsionadas após o advento do ChatGPT, chatbot desenvolvido pelo laboratório de pesquisa OpenAI e que hoje tem um média de 100 milhões de usuários por semana, sem necessidade de publicidade.
Como resposta a um mundo onde a IA generativa dissolve, cada vez mais, as barreiras entre o real e o virtual, o cargo de diretor de IA, recém-criado na Dell e ocupado pelo executivo Jeff Boudreau em setembro é, segundo Byrne, uma das estratégias para que a empresa se mantenha bem posicionada e com portfólio cada vez mais robusto através da IA.
Por meio de uma parceria com a Meta, conglomerado de Mark Zuckerberg que controla Facebook e Instagram, a Dell tem reforçado sua crença no open source, modelo de produção descentralizado que permite a qualquer pessoa modificar e compartilhar códigos de tecnologia.
O foco é a democratização da IA — algo que, de acordo com Byrne, deve se expandir cada vez mais durante a trajetória da Dell. A colaboração entre as duas empresas une a solução Dell Validated Design for Generative AI, que oferece modelos pré-treinados que extraem inteligência dos dados sem precisar criar os modelos do zero, com o Llama 2 da Meta, modelo de linguagem semelhante ao ChatGPT, mas desenvolvido através de código aberto como diferencial.
“Decidimos ser abertos porque queremos que seja bom para a indústria e também para o mundo”, afirmou Byrne.
“Decidimos ser abertos porque queremos que isso seja bom para a indústria e também para o mundo.”
John Byrne, presidente de vendas, Global Theaters and Dell Tech
A Dell também ampliou seu portfólio de workstations com a torre Precision 7875, estação de trabalho que traz o maior número de núcleos (96) em um modelo Dell Precision de chip único. A intenção é ajudar os clientes a desenvolver, executar e ajustar modelos complexos de IA generativa. “A IA vai ser vista em cada uma de nossas ofertas, desde nossos servidores de ponta, dados não estruturados em nosso armazenamento, até os PC’s”, disse Byrne.
Em meio a essa toada de ritmo intenso, a Dell anunciou previsão de receita entre US$ 22,5 bilhões e US$ 23,5 bilhões no terceiro trimestre, superior às estimativas de analistas (em US$ 21,67 bilhões, segundo dados da Refinitiv).
Apesar do otimismo, há desafios inerentes a um movimento recente e com mudanças constantes. Segundo Byrne, do ponto de vista tecnológico, o prazo de entrega estendido, alinhado a uma demanda definida por ele como “sem precedentes”, é uma das dificuldades. A segurança é outro ponto de atenção.
“Com a criatividade dos ataques cibernéticos, os clientes querem saber sobre a segurança do ciberespaço”, disse. “Eles nos questionam sobre a forma que a Dell protege seus funcionários, seu portfólio e seus dados de missão crítica.”
Na Dell Brasil desde o ano da sua inauguração, em 1999, Diego Puerta assumiu a presidência da companhia em novembro de 2020. “Começamos as operações do zero para nos tornarmos líderes de mercado como somos hoje”, afirmou.
Com base em uma bagagem profissional que inclui todas as transformações corporativas e tecnológicas vivenciadas pela operação nacional da Dell, Puerta acredita que o Brasil é um país que possui tato para a tecnologia.
Exemplos disso, segundo ele, são o uso intensivo de mídias sociais e a liderança na adoção de inovações como o internet banking e o e-commerce.
Com a IA generativa não será diferente. “A GenAI está amadurecendo globalmente, mas a curiosidade já está por aqui”, disse Puerta, que afirma que, na última década, o investimento brasileiro em tecnologia representou a metade do valor investido por alguns dos mercados mais maduros do setor.
Para acompanhar esse movimento, a estratégia local está alinhada com a global. “A Dell é, de maneira geral, uma empresa de ouvidos grandes”, afirmou o executivo. Segundo ele, o foco atual está na escuta e no investimento em capacitação como forma de garantir consultorias específicas para cada tipo de cliente. “Tenho passado muito tempo conversando com clientes sobre o potencial da IA”, afirmou. “Existe uma oportunidade de crescer e duplicar o impacto”.
APOSTA NO BRASIL
Enquanto algumas empresas optaram por deixar de atuar no Brasil depois da crise econômica decorrente da Covid-19, a Dell escolheu dobrar a aposta no País. Em 2020, quando lançou o notebook XPS 13, a empresa anunciou que começaria a fabricá-los aqui, na primeira linha de produção criada para o modelo fora da China.
A decisão gerou resultados positivos. Ao driblar a disparada do dólar frente ao real e reduzir os prazos de entrega, a fabricação local gerou uma economia de cerca de 25%. Hoje, segundo Puerta, 90% das vendas da Dell Brasil são provenientes da fabricação em Hortolândia (SP). “Talvez não consigamos ser tão eficientes para usar o Brasil como hub de exportação, mas a fábrica é fundamental para sermos competitivos no País.”
Segundo Puerta, tudo que há de novo em termos de tecnologia já é produzido na cidade do interior paulista, o que significa grande vantagem na era da IA generativa. Porém, ainda falta ganhar escala.
“É por isso que continuamos investindo em nossa operação, para continuarmos expandindo. Quanto mais crescemos, mais podemos oferecer produtos provenientes de produção local”, disse Puerta.
Questionado sobre a condução da economia no atual governo, o executivo afirmou ter vivenciado diferentes tipos de crises e volatilidade cambial. As adaptações, segundo ele, foram necessárias, mas as influências de curto prazo não impactaram a operação.
Quando o assunto é regulamentação da IA, Byrne e Puerta estão alinhados. Apesar do potencial da tecnologia, os executivos enxergam a discussão como necessária para ampliar segurança e mitigar riscos.
Segundo Byrne, a Dell tem se articulado através de parcerias estreitas e do diálogo com autoridades. O tema, que caminha de formas diferentes em cada tipo de país, começou a ser discutido na Câmara dos Deputados em abril de 2020, antes mesmo da União Europeia, mas segue sem desfecho.
“Estamos atrasados não apenas no impulso da IA na tecnologia de maneira geral, mas também na regulamentação”, disse Puerta. “Queremos continuar a acelerar a tecnologia, mas isso não pode ser feito no vácuo.”