Economia

Mercosul x União Europeia: o caldo azedou

Mercosul e União Europeia se distanciam e Brasil precisará procurar outras formas (e parceiros) mas novos arranjos comerciais

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Acordo comercial entre os dois blocos econômicos tem forte oposição do presidente francês, Emmanuel Macron (Crédito: Divulgação)

Por Paula Cristina

Havia grandes expectativas pela passagem do presidente Lula pela Alemanha. Às vésperas de o Brasil deixar o comando do Mercosul, o governo petista esperava fechar o ciclo firmando um acordo entre os países do cone sul das Américas com a União Europeia, um flerte que já dura mais de 20 anos e parecia estar mais próximo que nunca. Mas há um abismo entre parecer e ser.

Com a liderança da França na oposição ao acordo, os questionamentos sobre como trabalha o agronegócio brasileiros, além das exigências de compensação com agricultura sustentável tornaram o negócio inviável — pelo menos por enquanto. Interlocutores do presidente Lula disseram que o presidente ficou bastante frustrado com o andamento das negociações.

Para seguir em frente, agora, o governo pensa em estratégias. Uma delas é tentar fortalecer a aliança dos países emergentes por meio do Brics e pensar em acordos com a União Europeia através do bloco. Também há a perspectiva de seguir as negociações país por país que formam a União Europeia, mas Lula terá de fazer isso fora da cadeira de presidente do Mercosul.

O mandato de Lula à frente do bloco terminou quinta-feira (7), e seu sucessor será Santiago Peña, presidente do Paraguai. E ele já deixou claro que o acordo com o velho continente não estará entre suas prioridades. “Disse ao Lula para concluir as negociações porque, se ele não as concluir, não prosseguirei com elas nos próximos seis meses”, afirmou Peña em entrevista à TV pública paraguaia em 15 de setembro.

Ainda há a posse de Javier Milei na Argentina no caminho (domingo, 10), além da aberta pressão uruguaia sobre Lula. O ministro das Relações Exteriores do Uruguai, Omar Paganini, foi um dos primeiros a falar sobre novas formas de viabilizar acordos comerciais. A sugestão dele é avançar o diálogo com a China, ou abrir caminho para um acordo bilateral na Ásia em que os membros do Mercosul possam participar.

“Passaram cinco anos desde a última reunião [do Conselho do Mercosul e União Europeia]. Cinco anos em que o mundo se tornou mais complexo e mais desafiador. Se não é possível seguir por aí, temos de abrir o diálogo com a China”, disse Paganini.

Emmanuel Macron, presidente da França (Crédito:Ludovic Marin/Pool Via Reuters)

“Os termos do tratado são contraditórios. Esse acordo, no fundo, não leva em conta a biodiversidade do clima.”
Emmanuel Macron, presidente da França

ALTERNATIVAS

E essa pode ser a deixa de que Lula precisa para buscar novas alternativas de acordos. O Itamaraty já estuda, além de uma nova forma de aproximação com a China, uma maneira de fortalecer o bloco dos emergentes em busca de um acordo mais amplo e que o peso não resida apenas no agronegócio.

De fato é a condução do agro brasileiro um dos maiores entraves no andamento do acordo com os europeus. Liderados pelo presidente da França, Emmanuel Macron, eles colocaram em xeque o que chamaram de “práticas destrutivas ao meio ambiente para ter mais produtividade”.

A crítica forte aconteceu depois de o presidente Lula ter participado da COP28 e tentado vender um Brasil mais sustentável. Segundo Macron, os termos atuais do tratado são “completamente contraditórios com o que ele [Lula] está fazendo no Brasil e com o que nós estamos fazendo […] Esse acordo, no fundo, não leva em conta a biodiversidade do clima.”

O argumento de Macron ganhou força com parte dos líderes da União Europeia depois de uma decisão questionável do presidente Lula. Em outubro o Brasil aceitou ser um membro observador na Organização dos Países Produtores de Petróleo (Opep), entidade que reúne os maiores produtores de petróleo do mundo. Desde então, Macron tem sinalizado que tal ação mostra o comprometimento do Brasil com a energia fóssil.

Na defesa pelo acordo segue firme o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz. Em Berlim o presidente brasileiro externou sua frustração, mas disse ainda ter esperanças. “Depois de 23 anos, se a gente [os dois lados] não concluir o acordo é porque penso que nós estamos sendo irrazoáveis”, disse Lula.

Ao final de sua entrevista, o petista foi além. “Eu não vou desistir até falar com todos os presidentes da União Europeia e ouvir um ‘não’ de todos”. Uma postura que pode desgastar a imagem do Brasil, em especial se o verniz da sustentabilidade agrícola que queremos vender ao mundo começar a descascar.