Finanças

Bolsa em alta recorde e dólar em baixa. Até onde vai o otimismo?

Maior valor nominal da história do mercado acionário brasileiro, acima de 130 mil pontos, aquece as perspectivas para os investidores em 2024

Crédito: Renato S. Cerqueira/Futura Press/Folhapress

Ibovespa: alta recorde puxada por desempenho da economia brasileira e movimentos no cenário mundial (Crédito: Renato S. Cerqueira/Futura Press/Folhapress )

Por Jaqueline Mendes

Os dias que antecederam o Natal de 2023 serão lembrados como presentes por grande parte dos investidores da bolsa brasileira. Depois de superar a fronteira inédita de 130 mil pontos no dia 14, os pregões do índice Ibovespa, da B3, foram marcados por quatro altas consistentes e um raro clima generalizado de otimismo. Entre o dia do recorde histórico e a quarta-feira (20), houve apenas um fechamento no vermelho, com recuo de 0,79%, mas ainda assim próximo de 131 mil pontos.

O movimento fora da curva foi visto pelo mercado como realização de lucro. Isso fez com que, no acumulado de 2023, até a quarta-feira (20), o Ibovespa tivesse valorização de 20,3%, resultado surpreendente para um ano que começou cheio de incertezas na economia e na política. Ponto comemorado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. “O resultado [da bolsa] reflete um projeto maior de país, que fará a economia sair fortalecida em várias frentes”, disse o número 1 da economia, ao comentar o resultado recorde da bolsa.

Mesmo puxando a própria sardinha, há fatores não controlados pela política econômica brasileira que ajudaram tal resultado. O que levou a bolsa a uma alta nominal nunca antes vista na história deste País veio dos Estados Unidos. Por lá, o Federal Reserve (Fed), o Banco Central americano, decidiu não mexer nos juros da maior economia do planeta e indicar que pretende cortar 0,75 ponto percentual ao longo de 2024, o que indica que o bom momento da bolsa em países emergentes deve continuar, já que taxas mais baixas em economias avançadas estimulam esse tipo de entrada.

Na avaliação do economista Pedro Serra, chefe de pesquisas da Ativa Investimentos, a alta da bolsa tem muito mais motivos externos do que internos. A baixa de Selic ajudou, é verdade, mas como a economia americana apresentou certa manutenção de ritmo, não há motivos para o Fed seguir aumentando o juro. Com isso, países que remuneram melhor os investidores voltaram a seduzir dólares.

“Muita liquidez foi enxugada no Brasil quando os juros subiram lá fora. Agora, o capital retorna para ativos de maior risco, o que beneficia países como Brasil e México”, disse Serra. “E essa tendência tende a continuar. Acredito que esse fluxo vai permanecer saudável. Além disso, a bolsa brasileira está barata.”

R$ 4,9
é a nova projeção do Itaú para o dólar ao final de 2024; em novembro, a projeção era que a moeda ficaria em R$ 5,25

9%
é a projeção do Itaú para a Selic ao final de 2024, mas resultado está ligado à capacidade do governo de zerar o déficit

160 mil pontos
é a projeção do Santander para o Ibovespa em 2024, dando continuidade ao bom momento da bolsa

A avaliação de Serra está em linha com a análise da economista Larissa Frias, planejadora financeira do C6 Bank. Para ela, a combinação entre perspectivas positivas de crescimento no Brasil e queda da Selic tem ajudado a aquecer o mercado acionário. “O ritmo do Brasil ao longo deste ano, com o agro e o setor público como motores importantes do PIB, tem ajudado a puxar bastante as projeções”, disse Larissa.

Para ela, mesmo com a provável desaceleração da economia no último trimestre, o ano terá um crescimento muito forte e isso, por consequência, puxa a bolsa. “O mercado acionário antecipa movimentos futuros. E as projeções são positivas para o Brasil”, afirmou.

Wagner Moraes, CEO da A&S Partners, especialista em macroeconomia e mercado financeiro, o Ibovespa superar os 131 mil pontos também é mérito de um cenário econômico dinâmico e promissor. “Esse desempenho é fruto de uma interação complexa entre fatores domésticos e internacionais”, disse.

Para ele, a recuperação econômica do Brasil pós-pandemia, aliada às decisões acertadas do Copom em ajustar a taxa Selic para 11,75%, sinaliza um equilíbrio entre crescimento e controle inflacionário. Essa assertividade também foi indicada pelos bancões.

O Santander, por exemplo, prevê que o Ibovespa atinja 160 mil pontos em 2024, com a Selic encerrando o ano em 9,5%. No Itaú, o resultado na reta final de 2023 levou os economistas a projetarem uma Selic em 9% com o dólar em R$ 4,90, ante 9,5% da Selic e R$ 5,25 do dólar projetado em novembro.

Para Mario Mesquita, economista-chefe do Itaú, um fator decisivo para que as expectativas continuem altas é a real capacidade do governo de manter a meta de zerar o déficit. Por enquanto, o governo segue firme em tal objetivo, mas revisitará o tema em maio para avaliar sua real viabilidade ou não.

DE FORA PARA DENTRO

Quem também sentiu esse ambiente macroeconômico mais positivo dentro do Brasil foi a agência de classificação de risco S&P, que melhorou a nota de crédito para o Brasil, de BB- para BB, com perspectiva estável. A notícia, segundo o economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala, é muito positiva. “A inflação convergindo para 4,5%, o crescimento próximo de 3% este ano e a perspectiva para o próximo ano de 1,5%, contribuem para essa avaliação”, afirmou Gala. “A robustez externa, com reservas de US$ 350 bilhões e um superávit na balança comercial, posiciona o Brasil entre os dez melhores resultados mundiais nesse aspecto.”

Para ele, a alta na nota reflete também os resultados das empresas que promovem o Brasil na balança comercial. “Esse avanço está relacionado ao sucesso nas exportações, com destaque para o setor agropecuário, de petróleo e mineração, entre outros”, disse o economista.

A confluência de fatores vividas na reta final de 2023 até pode ser considerada um presentão de Papai Noel porque o Brasil tem feito o dever de casa, mas não podemos esquecer que o bom velhinho pode não vir em 2024.