Economia

Orçamento é aprovado e quem perdeu foi você

Bilhões em emendas com cronograma determinado para repasse tiram poder de barganha do governo. E Lula terá de avaliar o peso disso para executar o que pretende no segundo ano de seu terceiro mandato

Crédito: Edu Andrade

Congresso Nacional: aumento em alguns pontos do Orçamento leva equipe econômica a fazer ginástica para compensar os danos (Crédito: Edu Andrade)

Por Paula Cristina

A aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) foi uma daquelas vitórias pírricas para o governo federal. Apesar de manter o déficit zero para 2024 como desejava o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, alguns pontos determinados pelo Legislativo têm potencial bastante nocivo para a governabilidade de Lula em 2024.

O principal deles diz respeito ao valor, emprego e prazos das emendas parlamentares. Serão R$ 48 bilhões (sendo R$ 37 bilhões obrigatórios) a serem escoados segundo a programação do Legislativo. Para o relator da LDO, Danilo Forte (União-CE), a implementação do calendário, feito à revelia do governo, é uma forma de o Legislativo dar “um passo que vai privilegiar o exercício da política, e banir o fisiologismo”. Mas não é exatamente assim que funcionará.

Ao obrigar o governo a pagar quando o parlamento decidir, mudam-se as mãos que negociarão prazos, prioridades, alianças e trocas de favores, e transfere-se o poder, mas não elimina o fisiologismo. Hoje, os nomes com maior poder de negociação das emendas são, respectivamente, o presidente da Câmara Arthur Lira, o relator da Lei Orçamentária (PLN 29/23), Luiz Carlos Motta (PL/SP) e o próprio Danilo Forte.

”As medidas que expandem a participação do Legislativo no Orçamento deverão ser vetadas.”
Randolf Rodrigues, líder do governo no Congresso

E há mais turbulência vinda do Legislativo. Aprovada a LDO, o segundo passo é aprovar a LOA. E ela conta com um dispositivo que aumenta em 433% o valor sugerido pelos ministérios da Fazenda e Planejamento para o fundo eleitoral de 2024, e chega a R$ 4,96 bilhões.

O volume também fica 150% acima dos R$ 2,8 bilhões usados para esse fim em 2020, quando aconteceram as últimas eleições municipais. Para turbinar este valor, a indicação de Motta é reduzir em 31,5% os recursos do Programa Minha Casa Minha Vida, passando dos R$ 13 bilhões para R$ 8,9 bilhões. Houve ainda redução de 27,7% nos recursos para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), passando dos R$ 61,3 bilhões sugeridos pelo governo para R$ 44,3 bilhões.

Com tudo isso em curso, pessoas próximas ao presidente Lula dizem que se formou uma força-tarefa no Palácio do Planalto para estudar os riscos de vetar alguns pontos do Orçamento, já que a derrubada do veto no Congresso seria vista como uma derrota expressiva após o bom resultado com a aprovação da Reforma Tributária.

O líder do governo no Senado, Randolf Rodrigues (sem partido), é um dos que apostam no veto. “As medidas que expandem a participação do Legislativo no Orçamento [como o cronograma das emendas] deverão ser vetadas”, disse ele à DINHEIRO.

Danilo Forte, relator da LDO, afirma que programação das emendas irá aumentar a transparência nos gastos parlamentes (Crédito: Pedro Ladeira)

Segundo Rodrigues, é inconstitucional o Legislativo acumular a função de programar investimentos, uma função do Executivo. Levar a questão para o Supremo Tribunal Federal também está em jogo, já que as orientações para barrar o Orçamento Secreto e dar mais transparência para as emendas parlamentares vieram da Corte.

Mesmo com as mudanças, permaneceram dois pontos que o governo batalhou para que fossem mantidos. O primeiro diz respeito à meta de zerar o déficit, uma empreitada de Haddad e que passou por reprovações e questionamentos pela própria base petista no Legislativo.

Depois da discussão, o ministro conseguiu o que queria, e o relator ainda colocou um fôlego de até R$ 28 bilhões de déficit. Isso significa que mesmo com esse valor no vermelho, será considerada cumprida a meta — um dispositivo bastante conveniente diante dos gastos do atual governo.

Ficou determinado também que a meta será revisitada em março de 2024. Esse adendo foi um pedido da base governista que não concordava com o déficit zero estipulada por Haddad. Agora o ministro tem que correr para provar, já no primeiro trimestre, que tal objetivo é altamente factível — e que isso não significará falta de recurso para obras públicas em ano eleitoral.

Também foi boa para o governo a decisão de limitar a R$ 23 bilhões o bloqueio de despesas no Orçamento, emenda feita por Randolfe Rodrigues. Para a Fazenda, o contingenciamento de despesas em 2024 precisaria respeitar duas regras.
• Uma que limita o bloqueio a 25% dos gastos discricionários (um bloqueio de R$ 53 bilhões).
• E outra que limita a alta de gastos real (acima da inflação) a um piso de 0,6% e um teto de 2,5%.

Essas duas regras combinadas impediriam um bloqueio maior do que R$ 23 bilhões, sob risco de o crescimento da despesa no ano ficar abaixo de 0,6%.

A LOA trabalha com a projeção de gastos de R$ 5,54 trilhões, sendo R$ 2 trilhões para despesas primárias e o restante para pagamento de dívidas públicas e amortizações. Uma vitória com preço alto, mas ainda assim uma vitória.