IA: tudo em todo lugar ao mesmo tempo

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Norberto Zaiet: "Os ganhos de produtividade obtidos com o avanço da IA não estão no preço dos ativos" (Crédito: Divulgação)

Por Norberto Zaiet

“Costumamos superestimar a mudança que ocorrerá nos próximos dois anos e subestimar a que ocorrerá nos próximos dez.” Atribuída a Bill Gates, a observação pode ser aplicada aos resultados apresentados pela Nvidia na semana passada. Os ‘early adopters’ da tecnologia são fãs da empresa há anos, pois ela está na vanguarda da fabricação de chips dedicados à excelência em processamento visual. Quem é do mundo dos games conhece bem o poder de seus processadores.

Na semana passada, a Nvidia deixou de ser, aos olhos de Wall Street, uma aposta de nicho focada em computação visual e tornou-se a líder na produção de processadores relacionados à inteligência artificial. Empresas cuja estratégia inclui o uso pesado de IA usam não apenas seus processadores, mas seus pacotes de software, data centers e outros serviços complementares.

A reação do mercado foi imediata. Uma ação que, aos olhos dos investidores tradicionais já tinha o valuation esticado, ficou ainda mais cara. Com isso, ela puxou, de carona, as outras fabricantes de processadores. Quem tinha ações da Nvidia no portfólio comemorou; quem não tinha, ficou sem entender por que não. Analistas de investimento qualificados, de instituições renomadas, falharam em perceber o tamanho e a importância do que estava acontecendo no mercado de processadores. Uma falha épica.

Na avaliação atual, a Nvidia negocia ao redor de 35 vezes suas vendas. Só para se ter uma ideia, a Apple negocia a sete vezes e a Microsoft, a 12. Estaria o mercado superestimando as mudanças dos próximos dois anos? Tendo a crer que sim: não me parece razoável imaginar que a Nvidia será a única capaz de fornecer pacotes completos de IA. Mesmo assim, sua tendência é de valorização, pois quem não tinha suas ações no portfólio agora vai querer ter.

Em contrapartida, estaria o mercado subestimando a mudança nos próximos dez anos? O setor da tecnologia comemorava a semana de bons resultados em Wall Street enquanto as ações mais mundanas estavam relegadas à enfadonha rotina de Fed, teto de dívida, inflação e afins. No longo prazo, porém, elas serão as maiores beneficiárias desse cenário.

Os ganhos de produtividade obtidos com o avanço da IA não estão no preço dos ativos. E o investimento necessário para alcançá-los ficou muito mais baixo. Há poucos anos, estratégias de IA demandavam um custo inviável para a maioria das empresas. Hoje essa realidade é bem diferente.

“O investidor não especializado vai se sentir, nos próximos meses, compelido a colocar dinheiro em projetos de IA. Muita gente vai ganhar dinheiro, mas é provável que uma quantidade bem maior perca”

O investidor não especializado vai se sentir, nos próximos meses, compelido a colocar dinheiro em projetos de IA. Nos próximos dois anos, tudo em todo lugar e ao mesmo tempo será IA. Muita gente vai ganhar dinheiro, mas é provável que uma quantidade bem maior perca. As bolhas passadas nos ensinaram que, no mundo das inovações, quem é o primeiro não necessariamente é aquele que ganha o jogo.

Vale a pena investigar empresas onde a aplicação de IA pode gerar ganhos de produtividade extraordinários. Quais serão seus impactos no varejo, na saúde, nas commodities, na área industrial? A chance de errar aqui é menor do que a de tentar acertar qual tecnologia vai ganhar o jogo. Os analistas especializados se surpreenderam com a Nvidia na semana passada. Os não especializados podem se machucar muito mais se fizerem a aposta errada. É importante ter foco nos dez anos — e muita cautela nos próximos dois.

Norberto Zaiet é economista, ex-CEO do Banco Pine e fundador da Picea Value Investors, em Nova York